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Intermediárias e seus responsáveis foram acusados pela não comunicação de operações suspeitas
Corretoras condenadas por violação às normas de prevenção e combate à lavagem de dinheiro
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) julgou, em 24/5/2016, os seguintes acusados no Processo Administrativo Sancionador CVM nº 12/2013: Ágora Corretora de Títulos e Valores Mobiliários S.A., Novinvest Corretora de Valores Mobiliários Ltda., Pedro Sylvio Weil, Ricardo Miguel Stabile e SLW Corretora de Valores e Câmbio Ltda.
CONHEÇA O CASO E O RESULTADO:
O Processo Administrativo Sancionador CVM nº 12/2013 foi instaurado pela Superintendência de Processos Sancionadores (SPS) em face de Ágora Corretora de Títulos e Valores Mobiliários S.A. (Ágora CTVM), e seu diretor Ricardo Miguel Stabile, Novinvest Corretora de Valores Mobiliários Ltda., SLW Corretora de Valores e Câmbio Ltda. e seu diretor Pedro Sylvio Wil, por supostas infrações ao cumprimento do dever de comunicação à CVM de operações consideradas suspeitas, na forma das regras de prevenção e combate à lavagem de dinheiro, estabelecidas pela Instrução CVM 301.
O processo teve origem nas investigações no âmbito do Inquérito Administrativo (IA) CVM nº 14/2010, em que a SPS observou indícios de potenciais violações aos comandos da ICVM 301.
ACUSAÇÃO
Após a apuração dos fatos, a SPS teria identificado irregularidades na atuação das corretoras investigadas, por não terem comunicado à CVM a ocorrência de:
• operações, realizadas no mercado futuro de índice Bovespa, consideradas suspeitas por serem incompatíveis com a situação patrimonial e financeira declarada nas fichas cadastrais dos comitentes (infração ao disposto no art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613/98, combinado com o art. 7º, inciso II, e art. 6º, inciso I, da Instrução CVM 301, todos com as redações vigentes à época dos fatos).
• operações tidas por excepcionais, diante da taxa de sucesso obtida por determinados comitentes no mercado de índice Bovespa (infração aos disposto no art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613/98, combinado com o art. 7º, inciso I, da Instrução CVM 301, todos com redações vigentes à época dos fatos).
VOTO
O Diretor Relator do caso, Gustavo Borba, iniciou seu voto tratando de preliminar levantada pelos acusados, relativa à prescrição da ação punitiva da CVM.
Para Gustavo Borba, embora a jurisprudência da CVM entenda que o prazo de prescrição da Lei nº 9.873/99 pode ser interrompido por diversas vezes, em virtude de atos inequívocos que importem em apuração dos fatos (art. 2º, inciso II, da referida lei), essa não seria a melhor interpretação.
Na visão de Borba, seguindo esse raciocínio, o prazo para instauração do processo sancionador poderia ser sucessiva e infinitamente interrompido, em razão de diversos “atos inequívocos”, o que obstaria a própria razão de ser dos institutos da prescrição e da decadência, que é a pacificação social.
Diante disso, para o Diretor Relator, seria necessário interpretar a norma de forma restritiva e em conformidade com o princípio da segurança jurídica, no sentido de que essa interrupção apenas poderia ser realizada uma vez, em decorrência de ato inequívoco de apuração, momento após o qual a instauração do PAS teria de ocorrer, impreterivelmente, no prazo de 5 anos.
No caso concreto, o processo sancionador foi instaurado em junho de 2013, mais de 11 anos após as primeiras operações relacionadas ao presente PAS (janeiro de 2002) e quase 7 anos após a última operação mencionada pela Acusação, realizada em dezembro de 2007. Assim, para Gustavo, mesmo considerando que as infrações em questão tiveram natureza continuada (art. 1º da Lei 9.873), se deveria verificar se transcorreram mais de 5 anos entre o primeiro ato inequívoco de apuração dos fatos após dezembro de 2007 (quando ocorreu a última operação relacionada à acusação) e a instauração no PAS.
Nesse contexto, o primeiro ato inequívoco de apuração dos fatos após dezembro de 2007 teria ocorrido em janeiro de 2008, transcorrendo mais de 5 anos desde o ato administrativo até a instauração do processo sancionador em junho de 2013. Com isso, segundo a linha interpretativa do Diretor Relator, haveria de se reconhecer a prescrição da ação punitiva.
Nesse ponto, contudo, o Presidente Leonardo Pereira apresentou sua divergência, acompanhada pelo Diretor Roberto Tadeu.
Para o Presidente, em linha com o disposto na Lei nº 9.873 e com a jurisprudência do Colegiado, e também do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, a prescrição quinquenal seria interrompida pela ocorrência de quaisquer atos inequívocos de apuração, assim compreendidos como aqueles com objetivo claro de impulsionar o processo administrativo de investigação. Nessa linha, Leonardo Pereira ressaltou diversos casos em que se reconheceu expressamente a ocorrência de mais de um evento interruptivo da prescrição quinquenal.
Assim, tendo em vista a ocorrência de diversos atos inequívocos de apuração entre a última operação relacionada à acusação, e a instauração do PAS em 2013, o Presidente votou pela rejeição da preliminar.
Não obstante, o Presidente Leonardo Pereira salientou que ele, e a própria CVM, também reconhecem que um grande lapso temporal entre a ocorrência dos fatos e sua apuração e julgamento pode acarretar prejuízos de diversas ordens, à defesa, à formulação da acusação e também à própria efetividade do caráter pedagógico e preventivo das penalidades.
Nesse sentido, pontuou que a CVM trata essa questão como um ponto prioritário de atenção, e, na implementação de seu Planejamento Estratégico, tem reduzido o tempo de tramitação dos feitos, por meio de metas progressivas de celeridade aplicáveis à atividade sancionadora.
Rejeitada por maioria a arguição de prescrição e, ainda em sede de preliminar, o Diretor Relator Gustavo Borba concordou com a alegação de Ágora CTVM, de que os documentos nos autos demonstrariam que os negócios mencionados pela SPS teriam sido intermediados pela Ágora Sênior Corretora de Mercadorias e Futuros Ltda. e não pela Ágora CTVM. Com isso, Borba acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva e votou pela extinção do processo, sem resolução de mérito, em relação à Ágora CTVM.
Entretanto, o Relator entendeu que essa extinção não se estenderia a Ricardo Stabile, na medida em que este também era, à época dos fatos, o diretor da Ágora CMF, sendo responsável pelo cumprimento do disposto na ICVM 301. Dessa forma, o direcionamento equivocado da acusação para a Ágora CTVM não afastaria a sua legitimidade.
Além disso, como Ricardo Stabile apresentou defesa efetiva relacionada aos atos da verdadeira envolvida (Ágora CMF), Gustavo afirmou inexistir prejuízo para a sua defesa, não havendo, portanto, necessidade de nulidade do processo ou ilegitimidade do diretor acusado, em linha com o princípio de que não há nulidade sem prejuízo.
No que tange à não comunicação de operações consideradas suspeitas, Borba afirmou que o parâmetro de “volume total negociado”, utilizado pela SPS para verificar se determinado negócio se afiguraria “objetivamente incompatível” com as informações declaradas nas fichas cadastrais dos comitentes, estava em dissintonia com precedentes da CVM, que considera, no caso de day-trade, apenas o valor líquido da operação, representado pela diferença entre o valor de compra e o valor de venda dos títulos negociados.
Em relação ao outro parâmetro adotado pela área técnica da CVM (exposição máxima diária), o Diretor Relator igualmente entendeu que este critério não representaria, por si só, informação útil à verificação da compatibilidade de uma operação com a situação econômico-financeira do cliente, dada a natureza do mercado de futuros.
Desse modo, utilizando como parâmetro comparativo os valores líquidos diários negociados pelos comitentes citados pela Acusação, Gustavo Borba entendeu que não foram realizadas, com substância relevante, operações incompatíveis com os patrimônios declarados em suas respectivas fichas cadastrais, apesar da ocorrência de ínfimos e raros desvios.
A única exceção seria o caso de cliente da SLW que teria movimentado valores incompatíveis com o patrimônio contido em sua ficha cadastral. Entretanto, segundo Borba, informações constantes nos autos demonstrariam que a corretora tinha condições de averiguar, por meio de outros documentos, a compatibilidade do seu patrimônio com os negócios por ele efetuados.
Por conta disso, diante da inexistência de operações objetivamente incompatíveis com a situação econômico-financeira de seus respectivos comitentes, não haveria, por consequência, obrigação de comunicação de tais operações à CVM por parte das corretoras e de seus respectivos diretores, na forma do art. 11, incisos I e II, da Lei nº 9.613, combinado com os arts. 7º, inciso II, e 6º, inciso I, da Instrução CVM 301 (com redações vigentes à época dos fatos).
Por outro lado, com relação às operações com taxas de sucesso excepcionais (negócios em que os comitentes auferiram ganhos em todos, ou em quase todos, os pregões em que operaram), o Diretor destacou que a probabilidade de ganhos sistemáticos no mercado futuro por um mesmo comitente diminui à medida que esse comitente participa de mais pregões.
Segundo relato do Diretor, no caso concreto, a excepcionalidade das transações ficaria clara ao ser observar a ínfima probabilidade da obtenção de taxas de sucesso de 100% pelos comitentes nos pregões em que operaram. Conforme cálculos realizados pela SPS, as probabilidades de ganhos sistemáticos por determinados clientes iriam de 0,0015% a 0,000000000000089%, de modo que tais operações deveriam ter sido comunicadas à CVM, na forma das regras contidas na ICVM 301.
Dessa forma, para Borba, restou configurada a negligência apta a caracterizar infração aos dispositivos da ICVM 301, na medida em que, além de se ter deixado de comunicar à Autarquia as operações, cujas taxas de sucesso eram faticamente inusitadas, essa conduta omissiva foi continuada. Assim, retirou-se da autoridade competente a possibilidade de eventualmente atuar, no momento oportuno, com o fito de detectar com brevidade potenciais atividades irregulares realizadas através do mercado de capitais.
Em relação à atuação dos diretores Ricardo Stabile e Pedro Weil, por sua vez, Gustavo Borba afirmou que eles apenas alegaram genericamente que tomaram todas as medidas para evitar ausências de comunicação relacionadas às hipóteses da ICVM 301, mas não comprovaram, nem ,indicaram, de forma precisa, quais foram as medidas de cautela adotadas com esse desiderato.
Por fim, o Diretor esclareceu que, com relação à dosimetria, o parâmetro de penalidade adotado seria o do art. 12, II (vigente à época) da Lei 9.613, que limitava o valor da multa pecuniária a R$ 200.000,00.
Diante de todo o exposto, após ter sido rejeitada, por maioria, a preliminar de prescrição, o Diretor Relator votou pela:
i) extinção do processo, sem resolução do mérito, em relação à Ágora CTVM.
ii) rejeição das demais preliminares.
iii) absolvição de Ricardo Stabile, Novinvest, SLW e Pedro Weil.pela imputação de descumprimento ao art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613, combinado com os arts. 7º, inciso II, e 6º, inciso I, da ICVM 301.
iv) condenação da Novinvest à penalidade de multa no valor de R$ 140.000,00, pelo descumprimento ao art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613, combinado com o art. 7º, inciso I, da ICVM 301.
v) condenação da SLW à penalidade de multa no valor de R$ 180.000,00 pelo descumprimento ao art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613, combinado com o art. 7º, inciso I, da ICVM 301;.
vi) condenação de Ricardo Stabile à penalidade de multa no valor de R$ 56.000,00, pelo descumprimento ao art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613, combinado com o art. 7º, inciso I, da ICVM 301; e
vii) condenação de Pedro Weil à penalidade de multa no valor de R$ 72.000,00, pelo descumprimento ao art. 11, incisos I e II, da Lei 9.613, combinado com o art. 7º, inciso I, da ICVM 301.
O Colegiado acompanhou o Diretor Relator no tocante às demais preliminares e às questões de mérito.
Os acusados poderão apresentar recurso com efeito suspensivo ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.