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Casos envolveram insider trading, falhas informacionais e falta de dever de diligência
Colegiado julga três processos administrativos sancionadores
O Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) julgou, em 5/12/2017, os seguintes acusados:
1. Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/12710: Gelson da Silva Batista.
2. Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/3401: Márcio Rocha Mello e Wagner Elias Peres.
3. Processo Administrativo Sancionador CVM nº SEI 19957.003482/2017-35: Luis Eulálio de Bueno Vidigal Filho.
Conheça os casos
1. O Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/12710 foi instaurado pela Superintendência de Relações com Empresas (SEP) para apurar a responsabilidade de Gelson da Silva Batista, na qualidade de diretor de relações com investidores (DRI) e diretor presidente da CCX Carvão da Colômbia S.A., por supostas irregularidades na divulgação de informações no contexto da venda de projetos de mineração para a Yildirim Holding A.S. (infração ao disposto no parágrafo único, art. 6º, da Instrução CVM 358, combinado com o art. 157, §4º, da Lei 6.404/76 e art. 3º, caput e §5º, da Instrução CVM 358).
Acusação
Segundo a SEP, teriam sido identificadas três irregularidades relativas à divulgação de informações envolvendo a alienação dos projetos de mineração Cañaverales, Papayal e San Juan à Yildirim.
As duas primeiras estariam relacionadas ao fato relevante divulgado no dia 29/10/2013, às 18h40, a fim de informar ao mercado sobre a celebração de Memorando de Entendimentos (MOU) entre a CCX Colômbia S.A. (controlada indireta da CCX) e a Yildirim, por meio do qual foram estabelecidos os termos e as condições para venda de projetos de mineração pelo valor aproximado de USD450 milhões.
Considerando que o MOU foi celebrado por volta das 15h30 e que teria sido constatada oscilação atípica na cotação da ação, sendo identificada elevação acentuada a partir de, aproximadamente, 15h50, a Acusação sustenta que a divulgação teria sido intempestiva, pois investidores teriam negociado por mais de uma hora (de 15h50 às 17h00) em assimetria informacional.
Além disso, a área técnica destaca que a divulgação do referido fato relevante foi falha ao não trazer todas as informações referentes aos termos pactuados no MOU.
Por fim, a SEP também ressalta que, no dia 20/1/2014, teriam sido novamente identificadas oscilações atípicas e a Companhia, ao ser questionada, afirmou que seguia com as negociações e que desconhecia a ocorrência de qualquer outro fato que pudesse justificar aquelas oscilações.
No dia 3/2/2014, a Companhia divulgou fato relevante sobre a assinatura de carta de intenções, firmada em 31/1/2014, com a Yildirim, estabelecendo os termos e as condições definitivos para venda dos projetos de mineração da CCX Colômbia pelo valor de US$125 milhões.
Diante disso, para a Acusação, os administradores da CCX já teriam conhecimento da alteração substancial das premissas de negociação desde o final de dezembro de 2013 e teriam optado por mantê-la em segredo. Entretanto, em face das oscilações atípicas no pregão de 20/1/2014, eles não teriam outra opção que não a imediata divulgação, o que não teria ocorrido.
Voto
O Diretor Relator Henrique Machado afirmou não ter dúvidas quanto à obrigatoriedade da CCX prover o mercado com informações referentes à operação, cujas tratativas iniciais foram formalizadas por meio da assinatura do MOU.
O Diretor observou que não há hesitação em afirmar que no dia 29/10/2013 foram detectadas oscilações atípicas nas cotações das ações ordinárias da CCX, uma vez que o modelo estatístico utilizado pela SEP (média dos 60 pregões anteriores adicionada a duas vezes o desvio-padrão) se demonstra, a priori, uma ferramenta útil para detecção de oscilações atípicas.
Caracterizada a atipicidade das oscilações, o Relator salientou que a informação deve ser divulgada imediatamente, cabendo ao julgador, diante do caso concreto, analisar se o momento em que foi publicado o fato relevante atende aos propósitos do princípio do full and fair disclosure, uma vez que não há definição legal do termo “imediatamente”, como ocorre nos Estados Unidos.
Diante desse cenário, Machado ponderou não ser razoável exigir que o DRI conseguisse, a partir das 15h50, (i) verificar um movimento de alta na ação, (ii) concluir que houve oscilação atípica, e (iii) preparar o fato relevante sobre operação complexa e de extrema importância para a companhia, tudo isso em pouco mais de uma hora. Portanto, concluiu que não se mostraria razoável e proporcional esperar que houvesse a divulgação desse fato relevante nas circunstâncias do caso, razão pela qual votou pela absolvição do Acusado.
Quanto à divulgação falha do referido fato relevante, o Diretor declarou que as informações consideradas relevantes foram divulgadas no dia 29/10/2013. Para ele, a administração validou-se do disposto no art. 157, §5°, da Lei 6.404/76 (lei societária) ao não divulgar aquelas que ainda não estavam maduras o suficiente para serem reveladas ao mercado. Sua divulgação poderia, além de atrapalhar as condições negociais relacionadas à transação e, consequentemente, por em risco interesse legítimo da companhia, lançar no mercado informações incompletas e ainda não definitivas.
Por fim, quanto à ausência de divulgação de Fato Relevante no dia 20/1/2014, Machado afirmou que, de fato, houve oscilação atípica. Entretanto, seria forçoso, segundo ele, reconhecer que não há relação entre as oscilações identificadas e a alteração nas premissas da negociação. Neste sentido, destacou que as variações atípicas positivas de +16,5% no fechamento e +20,4% durante o pregão do dia 20/1/2014 não poderiam estar relacionadas com as alterações nas premissas da negociação da operação, pois a oscilação seria em sentido contrário, como de fato ocorreu no pregão seguinte à divulgação do Fato Relevante.
Com base na análise dos fatos e das provas juntadas aos autos, o Diretor Henrique Machado concluiu que não deveria ser atribuída ao Acusado responsabilidade, na qualidade de diretor presidente e DRI da CCX, pelas irregularidades que lhe foram atribuídas, tendo votado pela absolvição do Acusado com relação às três supostas infrações.
Diante do exposto acima, acompanhando o voto do Diretor Relator Henrique Machado, o Colegiado da CVM decidiu, por unanimidade, absolver Gelson da Silva Batista das imputações formuladas.
2. O Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/3401 foi instaurado pela Superintendência de Relações com Empresas (SEP) para apurar a responsabilidade de ex-administradores da HRT Participações em Petróleo S/A por uso de informação privilegiada na negociação de ações de emissão da Companhia, antes da divulgação de fato relevante relacionado à exploração de poço offshore situado na Namíbia em 2013 (infração ao disposto no art. 155, § 1º, da Lei 6.404/76, combinado com o art. 13, caput, da Instrução CVM 358).
Acusação
A SEP apurou que os conselheiros de administração da HRT, Márcio Rocha Mello e Wagner Elias Peres, venderam quantidade significativa de ações cerca de duas semanas antes da divulgação, pela Companhia, de fato relevante anunciando ao mercado que o poço Moosehead-1, perfurado dentro da campanha exploratória de petróleo na Namíbia, havia sido declarado seco.
Apesar da HRT ter informado que os conselheiros só tomaram conhecimento da informação sobre o fracasso da perfuração no mesmo dia da publicação do fato relevante (9/9/2013), a área técnica considerou que, pelo fato de, nas datas de suas negociações, 23 e 26/8/2013, já ter sido perfurado 81,2% do poço, não seria razoável concluir que nenhuma informação sobre a expectativa de resultado da perfuração estivesse disponível.
A SEP concluiu que as negociações foram realizadas mediante uso de informação privilegiada sobre o resultado da perfuração. Segundo a área técnica, foram verificados vários indícios, entre eles: (i) o fato dos conselheiros serem profissionais de grande conhecimento técnico, comandando o corpo técnico da HRT até pouco tempo antes dos fatos; (ii) de estarem sem negociar ações da Companhia há um tempo razoável; e (iii) de não terem dado explicações convincentes para os seus negócios.
Voto
O Diretor Relator Henrique Machado discordou da tese acusatória. Segundo ele, as alienações de ações feitas pelos Acusados ocorreram antes que a perfuração do poço Moosehead-1 atingisse o objetivo (a rocha-reservatório), o que se teria dado em 2/9/2013, e antes, portanto, que a Companhia iniciasse a perfilagem do referido poço, que começou em 5/9/2013.
Nesse sentido, Machado apontou que não há comprovação nos autos de que nos dias das negociações realizadas por Márcio Rocha Mello e Wagner Elias Peres (23 e 26/8/2013), cerca de 20 dias antes da HRT proceder à perfilagem de Moosehead-1, havia indícios da existência ou não de petróleo no referido poço.
Portanto, naquelas datas, não haveria como obter qualquer informação que alterasse a expectativa de resultado do poço, como entendido pela área técnica. Assim, o Diretor considerou ser improcedente a Acusação, uma vez que essa prova é, segundo ele, indispensável para configuaração da infração imputada aos acusados.
Diante do exposto acima, acompanhando o voto do Diretor Relator Henrique Machado, o Colegiado da CVM decidiu, por unanimidade, absolver Márcio Rocha Mello e Wagner Elias Peres das imputações formuladas.
3. O Processo Administrativo Sancionador CVM nº SEI 19957.003482/2017-35 foi instaurado pela Superintendência de Relações com Empresas (SEP) para apurar a falta de dever de diligência por parte de Luis Eulálio de Bueno Vidigal Filho ao não adotar medidas para prevenir, ou ao mesmo alertar, os investidores sobre o descumprimento de norma do Regulamento para Listagem de Emissores e Admissão à Negociação de Valores Mobiliários da BM&FBovespa (Regulamento), que culminou com a suspensão da negociações das ações da Cobrasma S.A (infração ao disposto no art. 153 da Lei 6404/76).
Acusação
A apuração da SEP foi iniciada a partir de reclamações apresentadas por acionistas a respeito da suspensão da negociação das ações da Companhia. Em sua análise, a área técnica verificou descumprimento ao Regulamento da BM&Bovespa pela Companhia em razão da permanência da cotação das ações abaixo de R$ 1,00. Verificou-se, ainda, que a Cobrasma teria recebido comunicação da BM&FBovespa determinando a divulgação de tal informação ao mercado, bem como a adoção das medidas cabíveis para o devido enquadramento das ações.
A SEP ainda observou que somente a determinação de divulgação da informação teria sido cumprida, conforme fato relevante de 23/10/2015, não tendo sido adotadas, no entanto, quaisquer medidas aptas a promover o enquadramento da cotação das ações.
Diante da inércia da Companhia, em 27/1/2017, a BM&FBovespa divulgou comunicação aos participantes do mercado informando que, em razão do descumprimento reiterado de requisitos previstos em seu Regulamento por determinadas companhias, dentre as quais a Cobrasma, estas seriam deslistadas em 6/3/2017, sendo que a partir de 2/3/2017 as ações de emissão destas companhias já não estariam mais sujeitas à negociação.
Diante do exposto, a SEP entendeu que o acusado, na qualidade de administrador da Cobrasma, não teria observado o seu dever de diligência, dado que, ciente da possibilidade de suspensão da negociação das ações de emissão da Companhia, e, consequentemente, do iminente dano aos seus acionistas, permaneceu inerte, não tendo sequer providenciado comunicado ao mercado noticiando tais circunstâncias.
O acusado, no entanto, apontou a incapacidade financeira da Companhia como obstáculo à adoção de medidas para reenquadramento da cotação das ações. Porém, a SEP argumentou que companhias em situações similares realizaram o grupamento de ações, o qual não demandaria recursos financeiros diretos e que seria medida apta a evitar a suspensão da negociação, ainda que, posteriormente, a cotação retornasse ao mesmo patamar.
Além disso, a área técnica ressaltou que o Colegiado da CVM já teria se manifestado no sentido de que os administradores de companhias em dificuldade financeira devem manter o mercado informado na medida do possível.
Voto
Inicialmente, o Diretor Relator Gustavo Borba esclareceu que, em vista da situação patrimonial e operacional da Cobrasma, inativa desde 1997 e com patrimônio líquido negativo de, aproximadamente, R$ 6,7 milhões, a conduta diligente a ser seguida pelo administrador não consistiria necessariamente na realização do grupamento de ações para aumentar a cotação dos valores mobiliários e, assim, postergar a deslistagem. Isso porque, não haveria indicativos de que, realizado o grupamento de ações, a cotação se sustentaria nesse novo patamar, razão pela qual o Diretor entendeu que tal medida apenas postergaria o problema.
Ainda assim, Gustavo Borba ressaltou que não haveria qualquer elemento nos autos que demonstrasse que o acusado teria refletido e, de forma ponderada e com subsídios adequados, concluído pela não adoção de medidas para elevação artificial da cotação das ações. Pelo contrário, de acordo com a manifestação do acusado, a sua intenção inicial seria justamente realizar o grupamento de ações sugerido pela área técnica.
Entretanto, não obstante a intenção alegada e as inúmeras comunicações encaminhadas pela BM&FBovespa solicitando a manifestação da Companhia acerca da iminente deslistagem, o acusado não prestou qualquer esclarecimento sobre quais medidas pretendia tomar em relação à delicada situação pela qual passava a Companhia, assim como não tomou qualquer medida efetiva para realizar o grupamento (sua alegada intenção).
Por esta razão, o Diretor Relator concluiu que não haveria como se admitir como diligente a postura adotada pelo acusado, já que, diante do grave e iminente risco de deslistagem, o acusado deveria ter informado quais medidas entenderia convenientes para endereçar o problema e ter adotado os procedimentos adequados para efetivá-las.
Diante de todo o exposto, considerando na dosimetria da pena a primariedade do acusado, o quadro financeiro e a situação de longa inatividade da companhia, o Diretor Relator Gustavo Borba votou, sendo acompanhado por unanimidade pelo Colegiado da CVM, pela condenação de Luis Eulálio de Bueno Vidigal Filho, na qualidade de administrador da Cobrasma S.A., à multa no valor de R$ 50.000,00, por violação ao dever de diligência (infração ao disposto no art. 153 da Lei 6404/76).
O acusado poderá apresentar recurso com efeito suspensivo ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.