Série Taowá Karão Jaguaribaras
Sou Merremii Karão Jaguaribaras, artista visual, indígena residente na aldeia Kalembre Feijão, zona rural, interior do Estado do Ceará.
Sou fruto resistente do sangue derramado pelas violências coloniais das caboclas serpentes, do clã das cobras pretas, da Nação Indígena Karão Jaguaribaras, um povo considerado extinto três vezes na história escrita pelos colonizadores, a última em 1863.
Nossas práticas culturais estão preservadas e são ensinadas de geração a geração. Uma destas práticas tem a ver com nossas artes gráficas, que na língua materna chamamos Taowá, e significa Linguagens Fixadas.
A arte indígena na cosmovisão Karão Jaguaribaras
O território que hoje é conhecido como Brasil passou por longas transformações, o que afetou diretamente as estruturas sociais de povos indígenas já existentes.
Nossos processos artísticos também foram afetados e estereotipados.
Na cultura indígena, há uma pluralidade grande na arte. Cada povo traz suas particularidades por meio de distintas linguagens, dentre elas estão as pinturas corporais e os grafismos indígenas.
Para nós, Karão Jaguaribaras, a arte indígena é um oráculo indesvendável, cheio de pluralidades. Através dela podemos navegar nas mais diferentes linguagens, uma de nossas faces indefinidas. É também uma linha que costura as dimensões, como se fosse uma teia que liga e protege os mundos.
Meu trabalho artístico
Meu trabalho aborda a diversidade existente na arte indígena, por meio das expressões artísticas de meu povo indígena Karão Jaguaribaras.
Através das Taowá, preservamos a escrita em códigos, contamos nossa história de luta, vivenciamos nossa memória.
A arte na língua originária de meu povo é chamada de Taowá e é representada pelos grafismos e pinturas.
São artes sagradas que representam interligações entre a história de vida ancestral e a atual, nos conectando às várias dimensões. Elas são utilizadas na pele, em objetos e em tudo aquilo que sirva para despertar memórias.
Antes de colocá-las em tela, nossa arte sagrada estava invisível e, por conta disto, sofremos discriminações e preconceitos quando nos pintamos. Pela dor, comecei a me inserir no ambiente da arte, em geral, a fim de quebrar estes sentimentos negativos impostos a nós.
Uso a estratégia de fazer Taowá nas telas e, através da pedagogia de ensino, atuo na quebra de estereótipos/preconceitos por meio de apresentações, dinâmicas em exposições coletivas, nas redes sociais, universidades, palestras, em oficinas, etc.
Meu trabalho, além de evidenciar uma identidade étnica originária, é um ato de ativismo, que possui a particularidade de meu povo. Quando trato de existência cultural, contribuo para a inclusão social, para o senso de pertencimento, de identidade, de memória e de reparação histórica.
Título da obra: Cordel do Sonho Alheio
Dimensão: 100x100 cm
Ano: 2022
Descrição: É uma tela híbrida em formato de grafismos e pintura, ela é a descrição em códigos de um conto intitulado Guyá Kahoo: os espíritos e as serpentes que retratam a origem do ritual Karão Jaguaribaras chamado de Yorém. A construção dessa tela foi um experimento que fiz, durante um laboratório de arte apoiado pela instituição RETICENCIAS aqui no Ceará. A Cordel do Sonho Alheio é um oráculo de diversidade que mostra mensagens individuais para o mundo e, ao mesmo tempo, mensagens do mundo para o indivíduo. Hoje ela se encontra exposta no museu de arte - Pinacoteca do Ceará e permanecerá exposta até março deste ano de 2024.
Título da obra: Estrela Radiosa
Dimensão: 80x83cm
Ano: 2023
Descrição: É um dos símbolos importantes em nosso calendário lunar, baseado em nossas narrativas. A cada década a Estrela Radiosa aparece no céu evocando aqueles que honram o sangue de seus antepassados a dançar sobre o brilho das estrelas, agradecendo pela longevidade e pela vida. Esta obra faz parte do acervo cultural do Banco do Nordeste.
Título da Obra: Memória
Dimensão: 50x70
Ano: 2023
Descrição: Esta obra simboliza a memória, trazendo a narrativa de que a memória não tem pontos centrais, mas existe em sincronia, pode adquirir formas. Observar os pontos de conexão e compreender é o ponto. Traçar o caminho e encontrar o começo é a pergunta. Onde mora a memória? Este é o universo central deste trabalho gravado em tela. Presente em tudo, a entidade Memória se move entre pontos que podem estar em você ou em outros, ou talvez em uma nação. A filosofia transcendental da memória derruba paredes, épocas, corpos, formas e guarda segredos.
Título da Obra: Metamorfose
Dimensão: 50x40cm
Ano: 2022
Descrição: Simboliza a mudança e está representada por duas imagens em um mesmo tempo e espaço, uma formiga saindo do subterrâneo para buscar alimentos no verão e a mariposa que representa as mudanças das estações. Uma imagem que mexe com nossas mentes. A metamorfose tem disso, de nos envolver na diversidade.
Título da Obra: Thijibu
Dimensão: 147x162cm
Ano: 2023
Descrição: Tchijibu significa o rio que corre com a ancestralidade em formato de Karakupeba (serpentiforme), expressando o mais intenso pensar de nossas ancestralidades de pertencimento. Nesta obra, a serpente representa o rio e o sangue. É uma canção que entoa a vida e a morte, a noite e o dia.
O jabuti unido à serpente representa a ancestralidade, juntos unem-se ao sol e à lua, demonstrando o equilíbrio que precisamos para existir. A ancestralidade é a entidade primeira que transita em nossa existência e molda nossa essência. Através dela somos o que somos, igualmente ao primeiro de nós, sendo alterado apenas pela forma física e pelo passar das gerações. Esta obra fez parte da exposição Afinidades Estratégias- Estratégias para um mundo Mutante, na Universidade de Fortaleza (UNIFOR), no ano de 2023.
Além das pinturas em tela também faço pinturas corporais, na minha aldeia sou a responsável por pintar aqueles/as que vão para os rituais nos momentos indicados pelo nosso líder espiritual (Papuã).
Nos vestimos de linguagens, pintar o corpo representa força, coragem, vida, conexão.