“Nasci na aldeia Galheiro, em cinco de fevereiro de 1971, ao meio-dia, perto de um pé de jatobá chamado de “tehcré”, onde começou a minha vida sofredora neste mundo, pois não é fácil ser uma mulher indígena”.
Mulheres-cabaça, mulheres pesquisadoras
Creuza Prumkwyj Krahô é professora indígena em sua comunidade, na Aldeia Nova, Terra Indígena Kraholândia, e liderança importante para o campo da educação intercultural.
Fez magistério indígena no Estado do Tocantins, graduação no Curso de Educação Intercultural, no Núcleo Takinahaky de Formação Superior Indígena, na Universidade Federal de Goiás, especialização em Educação Intercultural e Transdisciplinar no mesmo espaço, e mestrado no Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Territórios Tradicionais (MESPT), na Universidade de Brasília (UnB).
Desde sempre seu interesse se deu sobre a complexa prática dos resguardos Krahô. Prumkwyj pesquisa, sistematiza e registra uma série grande de cuidados mehi, que garantem a saúde física e espiritual de seus parentes.
“Se a pessoa não faz o resguardo, ela não saberá mais quem ela é, não terá memória, pois, para guardar os ensinamentos e o jeito certo de ser Krahô, a pessoa tem que viver, ouvir, praticar, falar, compartilhar. Esse conhecimento não está nos livros” (2017, p.7).
Para Creuza, atualmente as pessoas mais jovens estão deixando de praticar os resguardos, o que ameaça a sustentabilidade do grupo.
Na pesquisa de Prumkwyj, os resguardos trazem, de maneira entrelaçada, práticas alimentares, saberes territoriais, atividades cotidianas e cerimoniais, cantos, ciclos anuais, estágios etários e saúde, indicando a complexidade da vida mehi.
Ela reflete, ainda, de maneira brilhante, sobre métodos de pesquisa. Creuza percebe que as pesquisas comumente realizadas em seu povo, por antropólogos/as, historiadores/as, linguistas, etc, são, na realidade, realizadas, sobremaneira, por homens. Ela observa, então, que os homens, normalmente, vão pesquisar nas aldeias, e consultam, sobretudo, homens indígenas, gerando um conhecimento centrado no gênero masculino.
Creuza conclui que os estudos atuais sobre seu povo deixam de lado os conhecimentos femininos e, ainda, se apresentam como conhecimento sobre o povo Krahô, de maneira geral e equivocada. Ela entende, também, que há dados e situações que apenas pesquisadoras/es mehi podem realmente entender, os pesquisadoras/es cupê (não indígena) possuem, portanto, limites de entendimento. Possuem um conhecimento quadrado, distinto dos saberes circulares de seu povo.
Prumkwyj é também parte de uma família de mulheres importantes e poderosas. Tuhhocm, sua mãe, e Wejchihàc, sua avó, são grandes guardiãs dos conhecimentos ancestrais. Ela possui três filhas, sendo que Letícia Jokakwyj Krahô segue seu caminho, consolidando trajetória acadêmica e de liderança.
Desta forma, Prumkwyj é uma pesquisadora fundamental para os estudos sobre a questão indígena, a educação intercultural e a antropologia. Para Prum, ela deve seguir a tradição das mulheres-cabaça, as primeiras mulheres Krahô
A primeira mulher-cabaça era a mulher do Sol, ela viveu e tem a sabedoria do primeiro resguardo, o da menstruação, do sangue que flui. Ela repassou este conhecimento para as mulheres mehi. Menstruação e gestação caminham juntas, o sangue flui nessas duas situações e este deve ser cuidado. Após o evento da menstruação, vivido pela mulher de Sol, as mulheres passaram a ter filhos (2017, p. 30).
Na próxima edição da Revista Pihhy, com muito prazer e honra, lançaremos o e-book “Wato ne hômpu ne kãmpa Convivo, vejo e ouço a vida Mehi (Mãkrarè)”, baseado no mestrado de Creuza, realizado com orientação da Professora Doutora Sílvia Maria Ferreira Guimarães.
A revista semente segue o movimento de estimular e difundir a autoria indígena, como forma de fortalecer a democracia e o bem viver.
Referências:
PRUMKWYJ, Creuza Krahô. Wato ne hômpu ne kãmpa Convivo, vejo e ouço a vida Mehi (Mãkrarè). Dissertação de Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Territórios Tradicionais - MESPT, do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, 2017.
Imagem: Sumário criado por Prumkwyj para expor e organizar sua pesquisa sobre resguardos apresentada no mestrado