ALFABETIZANDO EM LÍNGUA KAINGANG
O povo Kaingang está entre os três povos indígenas mais numerosos do Brasil. São falantes de língua pertencente ao tronco linguístico Macro-Jê, que é reconhecida somente no território brasileiro e que tem falantes desde o sul do Pará e Maranhão até o Rio Grande do Sul. De acordo com critérios geográficos, socioculturais e linguísticos, os Kaingang pertencem ao grupo Jê Meridional. Em termos demográficos, os Kaingang se constituem na primeira etnia do tronco Macro-Jê e a segunda etnia do território brasileiro.
A língua Kaingang apresenta cinco variações que são: o kaingang paulista, o kaingang do Paraná, o kaingang central de Santa Catarina, o kaingang do sudoeste ao sul do Rio Uruguai e a oeste do Rio Passo Fundo, e o kaingang do sudeste ao sul do Rio Uruguai e leste do Rio Passo Fundo. A organização sociocultural Kaingang é conhecida pelos princípios cosmológicos dualistas, de acordo com o mito de origem, representado pelos antepassados Kamẽ e Kajru, que não impõem uma separação espacial entre as diferentes dualidades, e sim, princípios sociais fundamentados na complementariedade e na reciprocidade.
O material aqui apresentado é construído na Terra Indígena de Inhacorá, município de São Valério do Sul (RS), sul do Rio Uruguai e a oeste do Rio Passo Fundo. O material didático para uso nas escolas Kaingang evidenciam outras epistemologias, buscando a construção da educação escolar decolonial e intercultural. Desta forma, colabora para a alfabetização da língua materna Kaingang na educação escolar. Nesse sentido, o material didático contextualizado em palavras com significados próprios contribui de forma mais profunda no componente curricular das escolas Kaingang para o entendimento das crianças, compreendendo bases epistemológicas distintas das demais escolas não indígenas. Promove também um amplo processo de interaprendizagem entre as pessoas, crianças, jovens, os velhos, os Kujá Kaingang, desenvolvendo a alfabetização e o letramento das crianças Kaingang, processo no qual todos estão envolvidos com seus territórios e na relação com as sociedades não indígenas.
O material didático está sempre em construção, como o aqui apresentado, representando a busca de efetivação de outras práticas pedagógicas nas escolas Kaingang, possibilitando, portanto, condições de práticas pedagógicas decoloniais nas escolas, e assim, instigando a constituição de outras raízes metodológicas e epistemológicas, potencializando os conhecimentos e saberes do povo presente no uso da língua materna e, assim, articulando saberes e conhecimentos. Com esse entendimento, o material didático faz parte da alfabetização e do letramento. Lembrando que a escrita moderna é dinâmica e presente em outras epistemologias, relacionadas à compreensão de códigos importantes para a vida nesse mundo hierarquizado.
Nesse contexto, a alfabetização escrita e o letramento contribuem como um importante meio de expressão, que fortalece a oralidade indígena. Importante destacar que na interculturalidade o código escrito não é superior à oralidade, são modos de expressão que comungam da mesma condição sem hierarquização, lembrando que a hierarquização configura uma violência epistêmica.