Passarela 04 - programa de filmes
APRESENTAÇÃO
Um dos elementos mais emblemáticos do entorno do CTAv, que está localizado no bairro de Benfica, no Rio de Janeiro, é a Passarela 04, o principal ponto de referência do prédio do Centro Técnico Audiovisual (CTAv). Cotidianamente, ela possibilita a passagem de pedestres na Avenida Brasil.
Esse símbolo marcante nomeará o novo projeto de difusão do acervo CTAv: Passarela 04 - Programa de Filmes, que tem como intuito realizar mostras e curadorias, reunindo filmes em torno de temáticas, estéticas e perspectivas livres e distintas. Os programas serão desenhados com curtas, longas-metragens e demais materiais audiovisuais do acervo CTAv, em conexão com títulos pertencentes a outras instituições, coletivos ou realizadores brasileiros.
Iniciaremos o projeto de forma remota, mas pretendemos expandir o alcance dos programas a partir de parcerias institucionais e exibições presenciais em nossa sala de cinema. Os quatro títulos mensais serão disponibilizados através do YouTube e do site oficial do CTAv, sempre acompanhados de mediações textuais que dão possibilidades de entendimento a cada um dos programas, fundamentados por pesquisas históricas e estéticas.
PROGRAMA 11
PRÁTICAS DOCUMENTAIS: INSTITUTO NACIONAL DO CINEMA - INC
13 a 30 de agosto
54'
O Instituto Nacional do Cinema (INC), criado em 1966, foi responsável pela "produção, importação, distribuição e exibição de filmes, ao desenvolvimento da indústria cinematográfica brasileira, seu fomento cultural e sua promoção no exterior"1. Criado no seio da ditadura civil-militar, os oficiais do Estado contavam com que os materiais fílmicos reproduzissem um ideal democrático de nação, investindo sobretudo em homenagens a heróis, eventos e símbolos nacionais.
O INC sofreu com vigilância extrema por órgãos de segurança e informações durante seu funcionamento, sendo frequentemente apontado como um espaço frequentado por cineastas e intelectuais "subversivos". Apesar do enrijecimento e controle, a produção da época apresentou conteúdos contestadores, nem sempre conformados ao discurso político governamental. Muitos diretores, como David Neves, Fernando Coni Campos, Sérgio Muniz, Ruy Guerra, Zelito Vianna, entre outros, produziram filmes através do INC, sobretudo documentários, que nos fazem pensar nos modos de representar e ensaiar sobre um país em pleno estado de exceção.
Nesse sentido, reunimos quatro documentários que, realizados com diferentes interesses e operando em geografias distintas, nos auxiliam nas reflexões acerca do Brasil, tendo em vista suas complexidades territoriais, raciais, de gênero e classe. O que olham? Como olham? O que desejam mostrar? O que escondem?
Em Brás (1973), Regina Jehá investiga a ocupação de São Paulo por imigrantes italianos e do nordeste brasileiro, com olhares atentos às consequências do êxodo rural. Ainda que faça confluência às concepções raciais que valorizam a mão de obra imigrante em detrimento às das populações indígenas e negras, o filme destaca-se por acompanhar o cotidiano desses personagens sociais, questionando a ideia de progresso e de desenvolvimento que opera nesse centro urbano.
Nos deslocamos até o Ceará para encontrar outras trabalhadoras, que dão título ao filme de Ipojuca Pontes, Rendeiras do Nordeste (1974). Na Praia de Flecheiras, no Ceará, as lentes do diretor acompanham um grupo de mulheres que costuram rendas, uma forma de artesanato que percorre por séculos a região litorânea de nosso país. Apesar de o narrador comentar, em algum momento, que essas artistas "não possuem senso estético", o que as imagens revelam é radicalmente o oposto: entrelaces, tramas e agilidades nas mãos, que dão materialidade a rendas diferentes e coloridas, nós que guardam as tecnologias que atravessam gerações e garantem o sustento de milhares de comunidades.
Em Carmen Miranda (1969), de Jorge Ileli, o velório da grande intérprete e dançarina é tomado de ponto de partida para criar uma pequena biografia. A sua dança e suas canções não são exibidas por pura homenagem ou exaltação: são fragmentos de conflitos que uma mulher encarnou ao simbolizar o Brasil e ter sua imagem exportada, venerada e explorada até as últimas consequências. A crítica desenha-se contra a indústria do entretenimento e tenta nos fazer ver a beleza em meio à violência.
Mesmo com o respiro de vida ao fim do documentário de Jorge Ileli, Alcântara - Cidade Morta (1968), de Sérgio Sanz, nos devolve o pessimismo ao lembrar que a exploração faz parte da maquinária que sustenta o mundo e suas distinções. Já na década de 1960, o realizador entrecruza presente e passado para investigar o abandono de uma cidade do estado do Maranhão. O retorno às águas remonta aos eventos históricos que fundaram o país e, mesmo quando não desejamos, continuam a operar na superfície das imagens e nas nossas formas de fazer perguntas àquilo que está ao nosso redor.
1 Conforme promulgado em 18 de novembro de 1966 através da Lei nº 4.131.
LISTA DE FILMES
Brás (Regina Jehá, 1973, 11', HDCAM)
Rendeiras do Nordeste (Ipojuca Pontes, 1974, 16', DVCAM)
Carmen Miranda (Jorge Ileli, 1969, 17', HDCAM)
Alcântara - Cidade Morta (Sérgio Sanz, 1968, 10', HDCAM)
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PROGRAMA 10
BRIGAR PELA ARTE
09 a 31 de Julho
94’
O título do décimo programa do Passarela 04 retoma um verso da música Sambista Perfeito, de Arlindo Cruz. Em Caixa Preta (2023), de Bernardo Oliveira e Saskia, o verso repetido incessantemente faz com que os significados dessas palavras se amplifiquem. O choque entre a poesia do sambista e uma gravura com duas figuras em posição de luta, por sua vez, acentua seu valor descritivo, mas são os sons e a montagem errantes que lançam outros acentos à expressão. Nesse ritmo, a constelação de filmes aqui persegue a ideia em que "brigar" confunde-se com persistir, desafiar, continuar, fazer arte.
Desculpe Atrapalhar o Silêncio de Sua Viagem (2015), de Lia Letícia, está na Estação Central do Recife, onde Jessé de Paula toca seu violino. Local de trânsito intenso de trabalhadores, a música aparece como elemento de suspensão temporal. A batalha é deflagrada contra a automatização da experiência cotidiana. O ato performático instala-se sem desejar ser confundida à paisagem. Pelo contrário, faz questão de rasurar simbolicamente o ciclo repetitivo de exploração capitalista.
Heitor dos Prazeres (1965) é um pequeno retrato sobre a vida e obra do pintor. Sua paixão, suas estéticas e cores são transportadas ao público pelas lentes de Antonio Carlos da Fontoura. O ensaio de aproximação ao artista negro dialoga com outros experimentos do diretor, que buscou se aproximar da fatal Gal Costa, da malemolência do chorinho, da psicodelia de Os Mutantes e da ginga da capoeira. Em particular, o que essas imagens e sonoridades oferecem é um retorno ao passado, em suas belezas e complexidades, criando ferramentas importantes para irmos de encontro à sequência do programa.
Vexations (2023), de Leonardo Mouramateus, enfrenta a precariedade e a iminência do desaparecimento da memória através da dança. O corpo-arquivo de João Fiadeiro reencena e revisita as histórias de mais de 30 anos de trabalho. Prestes a fechar o Ateliê RE.AL, seus arquivos e materiais são posicionados às vistas, sendo a imaginação e a inscrição no tempo as principais matérias para esse exercício que é, ao mesmo tempo, fílmico e historiográfico.
Por fim, Caixa Preta combina sampleamentos e hackeamentos que nos mergulham em expressões do pensamento radical negro, sob influência da sonoridades e expressividades negras. Do afrogospel da pastora Ana Lúcia ao Terceiro Milênio de Negro Leo, a negridade emerge de forma não-linear, impura e completamente fragmentada. Brigar pela arte, então, torna-se um movimento de fuga e risco, de desobediência e de desejo. Ou, até mais: de profunda inadequação.
LISTA DE FILMES
Desculpe Atrapalhar o Silêncio de Sua Viagem (Lia Letícia, 2015, 6', arquivo digital)
Heitor dos Prazeres (Antonio Carlos da Fontoura, 1965, 14', arquivo digital)
Vexations (Leonardo Mouramateus, 2023, 23', arquivo digital)
Caixa Preta (Bernardo Oliveira e Saskia, 2023, 51', arquivo digital)
Agradecimentos: Lia Letícia, Saskia, Rita Vênus, Uma Pedra no Sapato, Antonio Carlos da Fontoura, Bernardo Oliveira, Leonardo Mouramateus, Luís Fernando Moura.
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PROGRAMA 9
FOGO NO TERREIRO
13 a 30 de junho
86’
Num primeiro movimento, Fogo no Terreiro nasce de um desejo de investigar as performatividades presentes em festas e comemorações que dialogam estreitamente com a religiosidade, o mítico e as cosmopercepções que alargam aquilo que compreendemos como "folguedos" ou "espetáculos populares".
O contato com os filmes, no entanto, nos soprou um novo elemento: o fogo.
Seja como comunicação, purificação, energia cinética ou ferramenta necessária para o ato de cozinhar, o fogo persiste como (e se metamorforseia para além do) símbolo entre os quatro curtas-metragens aqui apresentados, sendo eles São João em Santa Cruz, Pankararu de Brejo dos Padres, Dramática Popular e Aguyjevete Avaxi'i.
Assim, o programa dobra a aposta nos atos celebratórios e criativos, buscando ir além da superfície das imagens, para reivindicar o poder do mistério, da proteção e do segredo que se alastram com as múltiplas formas que o fogo aparece no conjunto de filmes.
"O carro de som prenuncia o São João quente como a fogueira, gostoso como a pamonha e a canjica de nossa terra", diz o locutor do carro de som que atravessa o filme de Katia Mesel, São João em Santa Cruz (1987). O trocadilho dos quitutes com o gostinho do festejo prenuncia o ato performático: bacamarteiros ajustam suas armas de fogo em plena luz do dia, sob o céu de bandeiras coloridas, para fazer parte da quermesse.
A inflexão, a suspensão e o contraste conectam o filme anterior a Pankararu de Brejo dos Padres (1977). O cotidiano de uma comunidade dos Pankararus é documentado pelo olhar de Vladimir Carvalho. Se não é o fogo o elemento visível, é a fumaça derivada dos corpos que se movimentam no chão de terra batido que nos faz lembrar da fumaça liberada pelos bacamartes em ação.
Mesmo que entrevistas e relatos orais tentem oferecer a quem assiste um pouco de partilha daquele modo de vida que estava sendo transformado em imagens, é a performatividade e plasticidade da Festa do Umbu que causa atrito naquilo que ensaia enunciar ou explicar algo do mistério que envolve a cerimônia desses povos originários. O fogo no fumo nos convida a retornar ao fluxo do programa.
Mergulhamos novamente nas performatividades populares com o filme de Geraldo Sarno, Dramática Popular (1969). Se as vozes, no filme anterior, tentavam se sobrepor às imagens como forma de apreensão daquilo que estava sendo visto ou vivenciado, uma das maiores potencialidades desse curta de Sarno é justamente ouvir a brincadeira do Boi Bumbá e dos fogos de artifício que são lançados em meio à festa.
Por fim, Aguyjevete Avaxi'i (2023) nos devolve a outro território indígena, a aldeia Kalipety do povo Guarani M’bya. Fogo para defumar, fogo para assar o milho, fogo para aquecer, fogo para dançar. Se aqui o filme acompanha as etapas de colheita do milho e sua relação ancestral entre todos os seres visíveis e invisíveis, é o fogo que mais uma vez persiste, sendo o elo elementar entre todos os movimentos que Kerexu Martim não apenas observa, mas de que participa enquanto filma.
LISTA DE FILMES
São João em Santa Cruz (Katia Mesel, 1987, 9', Arquivo digital)
Pankararu de Brejo dos Padres (Vladimir Carvalho, 1977, 41', HDCAM)
Dramática Popular (Geraldo Sarno, 1969, 15', Arquivo digital)
Aguyjevete Avaxi'i (Kerexu Martim, 2023, 21', Arquivo digital)
Agradecimentos: Kerexu Martim, Victoria Moawad, Natali Mamani, Sophia Pinheiro, Rede Katahirine, Katia Mesel, Instituto Catitu, Cinelimite, William Plotnick, Avir Mesel.
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PROGRAMA 8
TRABALHAR NO CINEMA
06 a 31 de maio
77'
No mês em que se rememora a luta e o direito de trabalhadoras e trabalhadores ao redor do mundo, nós decidimos olhar para as múltiplas formas de trabalho dentro do cinema, passeando pela linguagem e percebendo como o fazer cinematográfico pode representar ou fabular o ambiente e o ato de trabalhar.
Se, para muitos, o cinema pode ser um ambiente luxuoso e deslumbrante, para outros, sobretudo aos que dedicam longas jornadas de trabalho para edificar o campo cinematográfico no país, a palavra cinema evoca um misto de sentimentos que pendula entre instabilidade e satisfação, prazer e necessidade, resistência e oportunidade.
Abrimos o programa com o SRTV 089, material da Embrafilme protagonizado por Haroldo de Oliveira, que compartilha suas impressões sobre o trabalho do ator e como a racialidade, sendo ele um homem negro, interfere na sua trajetória enquanto artista do audiovisual em nosso país. Com irreverência e criticidade, ele revela um cenário íntimo e nos estimula a pensar acerca da indústria cinematográfica nacional.
O direito às imagens, à história, ao passado e à moradia se confundem em Mutirão - O Filme (2022), de Lincoln Péricles (LKT). Construir uma casa, um museu, um filme: a partir das imagens que Maria Eduarda vê, e o filme nos mostra, a voz em off da garota revela uma sobreposição de lugares de trabalho. Sempre procurando pelas crianças diante daquilo que está olhando, Duda faz o próprio filme como quem brinca, já deseja o próximo, ao mesmo tempo em que chama pela coletividade, pela voz do outro, e faz uma pergunta importantíssima: Quem é que aguenta trabalhar todo dia?
A voz é um elemento fundamental em Amores de Rua (1994), de Eunice Gutman. Ao reunir diversas mulheres envolvidas com o trabalho sexual e a luta pela regulamentação das profissionais do sexo, a diretora possibilita que o cinema torne-se um instrumento de autoorganização, um documento fundamental para um labor ainda tão estigmatizado, uma contravenção ao escutar vozes que, muitas vezes, são excluídas da paisagem tanto do cinema como das de discussões sobre o trabalho.
Terminamos o programa no chão da fábrica, com A Máquina Infernal (2021), de Francis Vogner dos Reis. O controle, a precariedade dos instrumentos de trabalho e a instabilidade das relações trabalhistas são contrastados pela inquietação e emoções de trabalhadoras e trabalhadores. Imagens de arquivo e ruídos do coração do maquinário precedem uma convulsão geral. A ficção formula uma resposta ao sistema que adoece os corpos.
LISTA DE FILMES
SRTV 089. Haroldo de Oliveira - seu trabalho como ator (Equipe do SRTV, 1978, 7', Arquivo digital)
Mutirão: O Filme (Lincoln Péricles (LKT), 2022, 10', Arquivo digital)
Amores de Rua (Eunice Gutman, 1994, 30', Beta SP)
A Máquina Infernal (Francis Vogner dos Reis, 2021, 30', Arquivo digital)
Agradecimentos: Eunice Gutman, Lincoln Péricles, Francis Vogner dos Reis.
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PROGRAMA 7
CAMINHAR CONTRA O VENTO
08 a 30 de abril
83'’
A referência ao verso da música Alegria, Alegria, de Caetano Veloso, condensa o imaginário presente no conjunto de filmes do sétimo programa do PASSARELA 04.
Caminhar contra o vento é uma constelação de média e curtas-metragens realizados durante a ditadura civil-militar brasileira. As multidões, as manchetes de jornais, o militarismo, a resistência, o depoimento, as prisões, os modos de viver nas diferentes geografias do país, as experiências raciais marcadas pelo trauma, a arte, a censura, a liberdade, os exílios, as canções: tudo se mistura entre as imagens e sons que se combinam e se contrastam nessa sessão.
Começamos com Fênix (1980), de Silvio Da-Rin. Com depoimentos de Zé Celso, Norma Bengell, Caetano Veloso, Cacá Diegues, Chacrinha, entre outras personalidades, o diretor constrói um caleidoscópio que revela a complexidade de um país em seus tempos de repressão constitucionalizada. Sob influência do Movimento Estudantil, Cinema Novo e Tropicalismo, revela o ato rebelde de ir contra a corrente, de mover o corpo em oposição aos ventos reacionários. A violência do período é contraposta pela voz e pela inquietude daquelas que estavam dispostas à luta.
Poderíamos dizer, dessa forma, que Rocinha Brasil 1977 (1977), de Sérgio Péo, é o avesso do avesso. A dificuldade de refletir sobre as resistências contra a ditadura civil-militar fora da ótica das classes médias e brancas e da elite intelectual do país ainda persiste. No entanto, enquanto o asfalto era ocupado pelos militares, nas vielas e becos de agrupamentos periféricos do país e, particularmente, do Rio de Janeiro, experienciavam-se diversas formas de violência que ainda seguem invisibilizadas.
A questão da habitação é apresentada e são as múltiplas formas de coletividades negras (e não brancas) que se manifestam em oposição à máquina de morte física e simbólica que o regime ditatorial (e a ideia de Brasil) impôs. E, no meio disso tudo, as contradições permanecem vivas. Acorde Maior (1983), de José Inácio Parente, firma uma ruptura no fluxo de imagens e som, mas destaca-se justamente por sua suspensão enigmática.
Por fim, Em Nome da Segurança Nacional (1984), de Renato Tapajós, acompanha o Tribunal Tiradentes, ocorrido em São Paulo. As ferramentas e impunidades da ditadura são compartilhadas em sua rigidez, mas os depoimentos de pessoas que combateram ou vivenciaram de perto o horror do regime encontram uma multidão que celebra a vida, a liberdade, o ar de um país que seguia em rumo à redemocratização.
Há coisas das quais precisamos lembrar.
LISTA DE FILMES
Fênix (Silvio Da-Rin, 1980, 12', U-matic)
Rocinha Brasil 1977 (Sérgio Péo, 1977, 19', Arquivo digital)
Acorde Maior (José Inácio Parente, 1983, 4', Beta SP)
Em Nome da Segurança Nacional (Renato Tapajós, 1984, 48', Arquivo digital)
Agradecimentos: Maya Da-Rin, Francis Vogner dos Reis, José Inácio Parente, Laboratório Cisco, Lucas Parente, Sérgio Péo, Sílvio Da-Rin, Renato Tapajós.
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PROGRAMA 6
REMONTAR/EXPERIMENTAR
04 a 31 de março
O que se pode fazer com e através do cinema? Por mais simplória que pareça a formulação, ela nos leva a pensar sobre as possibilidades técnicas-estéticas do fazer cinematográfico, a dimensão ética das imagens, os desejos de historização e criação de memória do cinema nacional, uma interrogação que, no fundo, não é nada simples.
No programa Remontar/Experimentar, reunimos quatro curtas-metragens que fazem de si laboratórios de investigação da linguagem do cinema, em seus aspectos formais e políticos. Ao revisitar a história do cinema, impulsionam reformulações do fazer cinematográfico, vislumbrando, muitas vezes, uma crítica ao país.
Sempre houve uma conivência entre o coronelismo e o cinema brasileiro, diz Abraão Aragão, personagem-entrevistado de Que cavação é essa? (2008), de Estevão Garcia e Luís Rocha Melo. A preservação de um material em película rodado em uma fazenda do Coronel Alexandrão é o ponto de partida para a elaboração de um ensaio sobre a preservação audiovisual no país.
Conferindo visibilidade aos trabalhadores dessa atividade ainda pouco reconhecida no Brasil, a reportagem cinematográfica confronta os limites do gênero documental e ficcional, para emitir suas preocupações acerca da memória do cinema brasileiro.
Na sequência, nos encontramos com um filme-ensaio de Paulo César Saraceni, Cinema (1974). Recodificar, explicar, ensinar, comparar: de Godard a Glauber Rocha, o diretor referencia grandes nomes do cinema mundial e compartilha seu olhar minucioso para as noções básicas da linguagem e direção cinematográfica. Cinema-olho, pingue-pongue, plano-sequência, trabalho, liberdade: são palavras que aparecem e são orquestradas pela perspectiva de Saraceni.
As estruturas básicas da linguagem audiovisual são desafiadas através da montagem e dos arquivos de Maldição Tropical (2016), de Luísa Marques e Darks Miranda. Partindo de um dos maiores símbolos de exportação da cultura brasileira, Carmem Miranda, o filme questiona a ideia de progresso, o modelo econômico-colonial de plantation e aterroriza a paisagem de reconhecidos cenários geográficos do país. Diferente da educação cinematográfica do curta de Sarraceni, Marques e Miranda investem na profanação dos símbolos para fazer seu singular cinema terceiro mundista.
Com influências fortes do cinema marginal, Polêmica (1998) carnavaliza a linguagem cinematográfica, sob uma antropofagia que defende a anarquia, a interação e embate entre culturas e racialidades distintas, recuperando a acidez e comicidade do cinema nacional. Noel Rosa e Wilson Batista são figuras centrais do curta e dão o tom e o samba do filme dirigido por André Sampaio.
É o ímpeto da rebeldia que torna o cinema nacional vivo e prevalece na sessão Remontar/Experimentar.
LISTA DE FILMES
Que cavação é essa? (2008), de Estevão Garcia e Luís Rocha Melo
Cinema (1974), de Paulo César Saraceni
Maldição Tropical (2016), de Luísa Marques e Darks Miranda
Polêmica (1998), de André Sampaio
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PROGRAMA 5
Eu QUERO UM CARNAVAL QUE NÃO ESTÁ NO RETRATO (69')
09 a 29 de fevereiro
No samba-enredo "Histórias Para Ninar Gente Grande", do carnaval de 2019 da G.R.E.S Estação Primeira de Mangueira, o verso "eu quero um país que não está no retrato", chama atenção para os sujeitos, episódios históricos e subjetividades que, por muito tempo, estiveram fora de cena, invisibilizadas pela história oficial que privilegia as elites e a branquitude.
Num exercício de imaginação e extrapolação, reformulamos a frase da Mangueira para pensar as representações acerca do carnaval ou o imaginário de festividade que permeia o cinema nacional. Não foi difícil localizar o "samba" e as manifestações culturais do eixo Rio-São Paulo como expressões significativas de uma ideia de "festa", "carnaval" e "brasilidade".
Quais seriam, então, os carnavais que não estão no retrato?
A sessão se inicia com O Que Foi o Carnaval 1920!, de Alberto Botelho. Ainda que imerso em expressividades carnavalescas comuns ao cinema nacional, a retomada de imagens de 1920 surgem como uma rememoração, um contraste ao tipo de carnaval que conhecemos hoje, um retrato saudoso de um tempo que a maioria de nós não vivenciou.
Saindo da pompa das ruas do Rio de Janeiro, passamos para o Programa Cinemateca nº 135 - O cinema e o carnaval (1978), produzido pela equipe da Embrafilme. O episódio revisita títulos do cinema nacional que se passam durante o carnaval ou o têm como expressão máxima para o desenrolar de sua trama. O valor documental das atividades carnavalescas também é exaltado, assim como a influência da festa e canções para o cinema brasileiro, com atenção especial às chanchadas. Lançar-se em depoimentos e processos de realização cinematográfica é uma forma também de desvelar (ou reinventar) o imaginário construído em torno dessa festa tão emblemática.
Em seguida, vamos até terras pernambucanas com o curta-metragem Faz Que Vai (2015), de Bárbara Wagner e Benjamin de Burca. Sob influência das artes visuais, o remix entre cultura drag, vogue, frevo, brega-funk e swingueira faz com que tradição e modernidade reformulem suas próprias fronteiras, a partir de existências dissidentes de gênero e sexualidade que performam com e para a câmera da dupla de diretores. É o frevo quem conduz essa jornada de ritmos e expressividades locais.
Por fim, o domínio da ideia de festa se alastra para uma outra temporalidade e vamos até a festa da Nossa Senhora do Rosário, em Ouro Preto, com o filme Congados (1975-76), de Pe. Massote. Apesar de não fazer parte do ciclo carnavalesco, optamos trazer para perto as congadas, entendendo a aproximação entre sagrado e profano, tão presente no carnaval, e com o intuito de reiterar a influência das culturas e religiões africanas na Folia de Momo. Há um esforço, ainda, de deslocamento geográfico e da percepção da circularidade e dos tambores como elementos presentes no Brasil, para além dos meses de fevereiro e março, que marcam o carnaval.
LISTA DE FILMES
O Que Foi o Carnaval 1920! (Alberto Botelho, 1920, 10', Betacam SP)
Programa Cinemateca nº 135 - O cinema e o carnaval (Equipe SRTV, 1978, 30', U-matic)
Faz que vai (Bárbara Wagner e Benjamin de Burca, 2015, 12', arquivo digital)
Congados (Pe. Massote, 1975-76, 17', HDCAM)
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PROGRAMA 4
JOGOS DO OLHAR (55')
12 a 31 de janeiro
Em Anatomia do Espectador (1980), a atriz Stela Freire passeia pela história do cinema, pelas ruas e faz uma viagem de imaginação e intervenção na sala de exibição. Espectador, um substantivo masculino, no filme dirigido por Ana Carolina, sofre uma fratura. Ao colocar em primeiro plano uma personagem feminina, que repensa o seu lugar de ação e cocriação no cinema, ambiente em que o imaginário masculino, muitas vezes, não conferiu agência a esses corpos ou fez, do ato de olhar, uma prática supostamente masculina, o curta nos estimula a investigar como olhamos para as mulheres e como elas se veem no (e através do) cinema. E é assim que começamos o programa Jogos do Olhar.
O curta-metragem de Ana Carolina estabelece as regras do jogo: é preciso sentar e brincar com as imagens na tela, buscar senti-las intervir no próprio corpo, assim como quando a chuva de Singin' in The Rain (Gene Kelly e Stanley Donen, 1952) molha a nossa protagonista. Feita a mudança em nosso estado de presença, o que fazer? Como olhar, então, para o próximo filme, A Musa do Cangaço (1952)?
O documentário de José Umberto Dias mescla entrevista com imagens de arquivo do bando de Lampião para reviver o banditismo social a partir da ótica de Dadá, companheira de Corisco, e narradora do cotidiano de luta e criatividade vivenciada por ela e por outras mulheres que se aventuraram sertões adentro em busca de sobrevivência e seus ideais. A categoria de musa, no título, à qual Dadá é elevada, parece ser desconstruída paulatinamente através das memórias da figura histórica, um gesto de intervenção sutil e tão localizável quanto a que a atriz Stela Freire faz enquanto assiste a filmes no cinema de Anatomia do Espectador.
Mudado o jogo, passamos a escutar Norma Bengell, no programa SRTV nº 214, sobre sua personagem em Na Boca do Mundo, longa-metragem de Antonio Pitanga (1978). Diferente do lugar de musa em que poderia facilmente ser colocada, tendo em vista sua filmografia e sua imagem dentro do cinema nacional, a simplicidade de sua casa e de sua forma de abrir a intimidade perante a equipe da Embrafilme desmontam qualquer sinônimo de estrelato. E ela diz: "Eu sou um trabalhador!", após justificar as roupas simples e o cabelo molhado, recém chegada da ioga. A presença da entrevista no programa tensiona mais uma vez os olhares, perante a atriz, e destacamos, sobretudo, seu lugar de trabalhadora, assim como sua forma singular de ver e narrar sobre o filme em que esteve atuando.
Como última cartada, a sessão se encerra com um filme assinado pela artista Lygia Pape, A Mão do Povo (1975). Etnográfico, experimental e fotográfico, o olhar que se lança para perseguir formas de trabalho que se dão através de manualidades compõem uma trança de materialidades distintas (plástico, ferro, barro, tinta), com canções e sonoridades que pluralizam e confundem as significações das imagens. Uma tese, uma aposta, uma mirada: de dentro para fora e de fora para dentro, Lygia Pape desafia, no programa, os modos de olhar para o cinema e o mundo.
LISTA DE FILMES
Anatomia do Espectador (Ana Carolina, 1980, 20', HDCAM)
A Musa do Cangaço (José Umberto Dias, 1952, 17', HDCAM)
SRTV nº 214 - Norma Bengell sobre Na Boca do Mundo (Equipe da Embrafilmes, 1978, 6', HD)
A Mão do Povo (Lygia Pape, 1975, 12', HDCAM)
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PROGRAMA 3
MISTÉRIO E PRESENÇA: PRETITUDES NO CINEMA BRASILEIRO (77')
13 a 30 de novembro de 2023
Quando eu faço o filme como um ator, eu sou um coautor.
Eu não acredito que o ator esteja isolado da história.
O cara que vai empurrar o carrinho, vai fazer um travelling, o cara que mede o foco…
Uma equipe!
Não existe um isolado, o indivíduo.
O cinema é uma equipe.
Antonio Pitanga
Como desenhar uma sessão de filmes que remontasse experiências pretas no cinema brasileiro, a partir do material audiovisual presente no CTAv, quando poucos dos títulos depositados em nosso acervo são dirigidos por pessoas negras? Em entrevista ao SRTV*, programa de reportagens sobre o cinema brasileiro produzido entre as décadas de 1960 e 1980, sobre seu primeiro longa-metragem, Na Boca do Mundo (1970), Antonio Pitanga nos deixa uma pista: o cinema é uma equipe.
A participação de atores, atrizes, montadores, roteiristas e demais técnicos audiovisuais, assim como grupos, personalidades e coletivos negros, no cinema brasileiro, é um fato. A epígrafe deste texto evidencia que, sendo o cinema uma realização coletiva, é impossível (e irresponsável) não reconhecer a coparticipação de todos esses agentes na feitura de um filme. Já que não podemos mudar o passado que estruturalmente favoreceu que muitas pessoas brancas (co)criassem e capturassem imagens de individualidades, presenças, performatividades pretas, decidimos assumir o gesto de devolver algumas delas para circulação, sem querer negá-las ou alterá-las, mas, em constante negociação.
Buscando tornar visíveis as estéticas, tensões, belezas e complexidades que rodeiam filmes e materiais audiovisuais com/sobre pessoas negras, realizados a partir do olhar do Outro (branco), reunimos quatro títulos no programa Mistério e presença: pretitudes no cinema brasileiro. Filmes que dançam juntos, mas que também se chocam e, sobretudo, nos revelam rastros sobre a história do cinema brasileiro que nós precisamos lembrar (e investigar).
O programa inicia-se com o material do SRTV (nº 213) protagonizado por Antonio Pitanga, que compartilha sobre a história e apresenta as personagens de Na Boca do Mundo. Ao imprimir suas vontades de cinema enquanto olha firmemente para a câmera, Pitanga nos contamina com seu desejo em fazer uma história de amor, ao mesmo tempo que nos acende a vontade de remontar e narrar a história do cinema negro no Brasil.
Em seguida, nos deparamos com Partido Alto (1982), filme dirigido por Leon Hirszman, com colaboração, segundo uma de suas cartelas, de Paulinho da Viola. Com filmagens de rodas de samba na casa de Candeia e Manacéa, a câmera é atraída pela conversa entre os sambistas, pelo dançarino com seus sapatos brancos, pelo coro de mulheres que dão continuidade aos versos de quem dá o tom das canções, pela forma como os instrumentos se movimentam nas mãos dos músicos. Os planos-sequências dão espaço para que as presenças negras, em festa, se façam incontornáveis.
Damos continuidade à sessão com um episódio do Programa Cinemateca nº 123, o qual dedica-se à obra do diretor negro Waldir Onofre, que compartilha sobre a realização de seu longa-metragem As Aventuras Amorosas de Um Padeiro (1975). Ainda bastante desconhecido pelo público, a entrevista nos possibilita se aproximar da trajetória de Onofre no teatro e no cinema. O material inédito deixa evidente que ainda há muito que se conhecer sobre a história do cinema negro realizado em nosso país.
Por fim, lançamos uma cópia mais recente e com áudio remasterizado de Orixá Ninú Ilê - Arte Sacra Negra I (1978), de Juana Elbein dos Santos. Com textos de autores como Muniz Sodré, o filme investiga a espacialidade de terreiros e as expressões religiosas afro-brasileiras, ao mesmo tempo que, ao optar mais por narrar e compartilhar símbolos e materiais de cultos, ele nos convida a imaginar e preencher as imagens com o movimento e presença dos orixás, sem necessariamente mostrá-los, em transparência. O lugar do mistério que habita a dimensão do sagrado se preserva, apesar da tentativa de traduzir e informar ao público sobre essa experiência social e sensível.
Aqui, o conjunto de filmes nos lembra que precisamos encontrar, cada vez mais, maneiras de fazermos vibrar o mistério que ronda a presença e inventividade de pessoas negras no cinema brasileiro.
O cinema é uma equipe.
*SRTV - Serviço de Rádio e Televisão da Embrafilme. O acervo, composto de materiais em película 16mm e fitas magnéticas, encontra-se arquivado no CTAv. Muitos dos materiais trazem conteúdos não editados ou sobras.
LISTA DE FILMES
SRTV 213 - Na Boca do Mundo. Antonio Pitanga (Equipe do Serviço de Rádio e Televisão da Embrafilme, 1978, 6', HD)
Partido Alto (Leon Hirszman, 1982, 23', HDCAM)
Programa Cinemateca nº 123 - Especial Waldir Onofre (Equipe do Serviço de Rádio e Televisão da Embrafilme, 1979, 32', U-matic)
Orixá Ninú Ilê - Arte Sacra Negra I (Juana Elbein dos Santos, 1978, 25', HDCAM)
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PROGRAMA 2 - IMAGEANDO INFÂNCIAS, IMAGINANDO HISTÓRIAS (69')
09 a 30 de outubro de 2023
"Quando nascemos, os nossos olhos abriram-se para uma terra cruel e triste. Não conhecemos na nossa infância a ternura, que a liberdade gera no coração dos homens", diz o narrador de Plantar nas Estrelas (1979), filme dirigido por Geraldo Sarno. A curiosidade e os olhos atentos de crianças de uma comunidade moçambicana parecem ser aquilo que procuram aqueles e aquelas que vão à luta. A infância pode ser vista, então como ponto de retorno para uma vida livre, onde a guerra, a dança, a música e o cinema se confundem e são instrumentos para se preparar para a revolução.
Se cabe nos direcionarmos à luta, seria salutar não nos esquecermos das brincadeiras e canções que povoam nosso imaginário: cantar também pode ser ferramenta para a liberdade ou ao menos a suspensão desse mundo cruel que nos atravessa. Em A Velha a Fiar (1974), de Humberto Mauro, uma instigante montagem dá ritmo e imagem a uma cantiga popular. O rato, a aranha, o homem e o cachorro perturbam a velha enquanto ela trabalha. E, do outro lado, nós nos divertimos com o trava língua da música.
Diversão e imaginação são matérias de A Fábula da Festa no Céu (1974), de Noilton Nunes. Enquanto a barata quer tornar-se uma ave, o filme revela a coletividade como possibilidade de reinvenção e desvela o encanto do cinema aos nossos olhos. Daquilo que é possível ver através das imagens em movimento, Luiz Paulino dos Santos, em Ikaténa (vamos caçar) (1983), acompanha o tempo das crianças do povo indígena Zoró, em Aripuanã, no estado brasileiro de Rondônia, onde acompanhamos seus modos de compartilhar a vida e, sobretudo, sua vitalidade.
LISTA DE FILMES
Plantar nas Estrelas (Geraldo Sarno, 1979, 11', HD externo, digitalização recente em 2K)
A Velha a Fiar (Humberto Mauro, 1964, 6', HDCAM)
A Fábula da Festa no Céu (Noilton Nunes, 1974, 14', HDCAM)
Ikaténa (vamos caçar) (Luiz Paulino dos Santos,1983, 38', Beta Digital)
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PROGRAMA 1 - CANTOS DE TRABALHO (49')
04 a 29 de setembro de 2023
A palavra 'trabalho' pode ser sinônimo de ofício, de um conjunto de atividades, uma ação ou fabricação de alguma coisa ou a dedicação expressiva a algo. No programa Cantos de Trabalho, título que faz menção ao curta-metragem dirigido por Leon Hirszman, em 1974, o conjunto de filmes apresenta a atividade laboral em diferentes estados e suas significações se manifestam não apenas pela dimensão física ou simbólica do ato de trabalhar, mas pelas musicalidades e performatividades que envolvem cada uma das práticas que serão vistas aqui.
Apesar do esforço de Os Romeiros da Guia (João Ramiro Mello e Vladimir Carvalho, 1962) em "recolher o lírico e o folclórico das peregrinações" ao redor da Igreja de Nossa Senhora da Guia, localizada no litoral da Paraíba, para "registrar o fato social", as imagens da fé de moradores locais extrapolam o ideário etnográfico dos diretores. É por meio da música, da dança e da forma como os corpos interagem em espaços de socialização da cidade que somos tomados pela força da devoção e pela singularidade das pessoas e do ambiente documentado.
Em A Baiana (Moisés Kendler, 1973), logo de início, a cidade de Salvador é conectada à iconografia colonial da representação de vendedoras de acarajé. A voz cientificista do narrador é contrastada pela câmera que observa e escuta com atenção uma mulher negra enquanto se veste para o seu trabalho. A indumentária, a força da repetição de sua cozinha e o encontro de mulheres negras com os folguedos populares realçam as influências africanas em solo brasileiro, assim como possibilitam movimento e subjetividade para essa figura historicamente exotizada pelo imaginário colonial.
Se em Álbum de Música (Sérgio Sanz, 1974) retornamos a imagens recorrentemente vistas, de artistas do samba, bossa nova ou da MPB, como Nelson Cavaquinho, Clementina de Jesus, Maria Alcina, Luiz Melodia, Nara Leão e Jards Macalé, em Cantos de Trabalho - Mutirão são os trabalhadores do roçado e da tapagem de casa, em Chã Preta, no interior de Alagoas, que se destacam pela sua música, canções que dão fundamento ao ato de trabalhar.
LISTA DE FILMES
Os Romeiros da Guia (João Ramiro Mello e Vladimir Carvalho, 1962, 16', Beta Digital)
A Baiana (Moisés Kendler, 1973, 9', HDCAM)
Álbum de Música (Sérgio Sanz, 1974, 11', HDCAM)
Cantos de Trabalho/Mutirão (Leon Hirszman, 1974, 13', HDCAM)
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