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Notícias
364ª RO
Foto: Ascom CNS
O Brasil já ocupou o posto de campeão mundial em acidentes de trabalho e ainda enfrenta uma elevada incidência desses casos. Em 2021, foram registrados 536 mil acidentes, resultando em 2.556 mortes – o equivalente a sete óbitos por dia. No entanto, especialistas apontam que a subnotificação pode ultrapassar de 70% a 80%, devido a uma cultura de omissão nos ambientes laborais e falhas no sistema de notificação. Além disso, a contabilização oficial frequentemente desconsidera trabalhadores informais, ampliando ainda mais a dimensão do problema.
Os dados foram apresentados pelo presidente da Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), Pedro Tourinho de Siqueira, na 364ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS), nesta quarta (12/02), em Brasília. Toureiro participou da mesa temática sobre o Eixo 1: Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, da 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (CNSTT), que tem sua etapa nacional programada para acontecer em agosto.
O presidente da Fundacentro ressaltou que diante desse cenário, reforça-se a necessidade de uma abordagem integral pelo SUS, garantindo proteção à saúde dos trabalhadores, independentemente do vínculo empregatício. Ele destacou que o Brasil conta com dois marcos normativos recentes que estruturam a saúde e segurança no trabalho e a implementação de suas políticas. O primeiro é a Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho (PNSST), instituída por decreto em 2011, que reafirma o compromisso do Estado na promoção da saúde ocupacional, prevenção de acidentes e proteção dos trabalhadores. Já a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT), estabelecida por portaria em 2012, define as atribuições do SUS na área e reforça a intersetorialidade entre os Ministérios do Trabalho, da Previdência e da Saúde. Em 2023, o Decreto 11.496 organizou a gestão da PNSST e a Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP), que discute normas regulamentadoras.
Garantia de proteção a todas as pessoas trabalhadoras
Um ponto central da PNSTT é a garantia de proteção a todos as pessoas trabalhadoras – urbanos, rurais, formais, informais, autônomas, cooperadas ou assalariadas –, consolidando a saúde do trabalhador e da trabalhadora como um direito humano. “A PNSST tem no DNA a sua vocação, a consequência lógica do entendimento da saúde do trabalhador como um direito humano. É nesse sentido que é muito importante fazermos essa discussão este ano, entendendo, inclusive, que o SUS, por ter a capilaridade e a vitalidade que possui em sua constituição, desempenha um papel fundamental nesse processo”, completou.
Tourinho ponderou que ainda falta identificar, hoje, quais são os determinantes desse processo sistemático de negligência em relação à saúde dos trabalhadores e das trabalhadoras. “A subnotificação é um problema grave, mas há outros desafios urgentes na área de Segurança e Saúde no Trabalho (SST). Entre eles, destaca-se a persistência de antigos contextos de trabalho precário e informal, agora agravados pelo surgimento de novas formas de precarização. O advento da plataformização do trabalho representa uma nova roupagem para a velha relação de informalidade, marcada pela destituição de elementos protetivos essenciais”. Para ele, esse cenário se configura como um dos grandes desafios tanto para a regulamentação e organização do trabalho quanto para as políticas previdenciárias.
Resgate/valorização, reconhecimento e reinvenção
O coordenador-geral de Vigilância em Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, Luís Henrique Leão, destacou a importância da 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, e endossou a necessidade de reforçar a Política Nacional de Saúde do Trabalhador (PNSTT) como um direito humano fundamental.
Em sua participação, Leão estruturou sua reflexão em três conceitos centrais: resgate/valorização, reconhecimento e reinvenção. Em primeiro lugar, enfatizou a necessidade de reconhecer a PNSTT como um patrimônio do povo brasileiro, fruto de um processo histórico que remonta à década de 1980 e se consolidou ao longo de quatro conferências nacionais. Em segundo lugar, apontou a importância de compreender e valorizar o conteúdo da política, ressaltando os avanços conquistados nos últimos anos. Por fim, abordou a necessidade de inovação e fortalecimento da política, destacando as iniciativas que a Coordenação-Geral de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde tem desenvolvido para garantir sua efetividade. Concluiu reforçando que a 5ª CNSTT deve ser um espaço para reafirmar a relevância da PNSTT e construir caminhos para seu aprimoramento.
Ele fez questão de destacar ainda os mais de 10 milhões de procedimentos realizados em saúde do trabalhador no SUS, entre 2012 e 2024, dos quais 67% foram consultas médicas. Isso demonstra a necessidade de Mais Médicos para a Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, um passo essencial para atender a uma demanda social crescente.
Além disso, ele mencionou a realização de mais de 300.000 inspeções sanitárias em ambientes de trabalho, o que reflete a importância de modificar o modelo produtivo e o processo do trabalho. A fiscalização, uma missão do SUS, é realizada em parceria com o Ministério do Trabalho e Emprego e com a Previdência Social. Ele destacou ainda que está sendo discutida uma portaria conjunta com o Ministério do Trabalho e Emprego para fortalecer as inspeções, garantindo uma atuação mais eficaz na promoção da saúde e segurança dos trabalhadores.
Leão destacou ainda a importância de transformar as políticas de saúde do trabalhador em ações efetivas, indo além dos textos infraconstitucionais. Para ele, o desafio central é alcançar os trabalhadores onde eles estão, promovendo debates que conectem as políticas públicas às realidades concretas da população. "Essa 5ª Conferência, para nós, pode representar a 8ª Conferência Nacional de Saúde para o campo da saúde do trabalhador."
Leão também refletiu sobre a marginalização desse tema, que muitas vezes é colocado em um contexto de menor importância. Destacou que isso não é por acaso; há uma questão histórica e social de classe que incide na forma como formamos nossos profissionais de saúde, como nos organizamos e como construímos valores. Parece contradizer com um certo projeto de desenvolvimento, quando, na verdade, ele está intrinsecamente ligado a esse projeto. "Qual é o projeto de desenvolvimento? É o de um país justo, onde as pessoas tenham a dignidade de suas vidas respeitada, e em que o trabalho seja um objeto de realização e não de adoecimento”, concluiu.
Assista o debate na 364ª Reunião Ordinária
Elisângela Cordeiro
Conselho Nacional de Saúde