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Artigo: Luta Antimanicomial uma Epifania da Liberdade
Foto: CNS
Por Fernanda Magano
O Brasil viveu, nos últimos anos, crises sociopolíticas extremamente agravadas pelos efeitos da recente Sindemia de Covid-19 com profundos impactos na economia e na saúde mental das pessoas, panorama este agravado pelas experiências de luto e impedindo a adequada ressignificação das perdas, aumentando ainda mais processos de adoecimento e ataques a subjetividade humana.
Atingindo em especial pessoas e grupos sociais vulnerabilizados nas relações interpessoais e institucionais, principalmente aqueles submetidos a relações de opressão, dominação e discriminação.
Estamos retomando um projeto de Nação, construindo novas proposições de desenvolvimento da atenção à saúde mental e de redução de danos, tornando-se crucial investimentos na seguridade social no país.
A origem da Luta Antimanicomial, em 18 de maio de 1987, se deu a partir de um encontro realizado na Cidade de Bauru – SP, por grupos favoráveis a políticas antimanicomiais. Nesse encontro, surgiu a proposta de reformar o sistema psiquiátrico brasileiro.
Pela importância do movimento, a data de 18 de maio tornou-se o dia de Luta Antimanicomial.
A Lei Paulo Delgado / Lei da Reforma Psiquiátrica 10.216/2001 foi promulgada com o intuito de garantir os direitos de pacientes com sofrimentos mentais a receberem atendimentos em liberdade, priorizando o tratamento através da reinserção na família, no trabalho e na comunidade.
Rompendo com determinados procedimentos que considerados procedimentos médicos, na prática são violência, tortura e segregação, como exemplo o eletrochoque, gourmetizado sendo nomeado de eletroconvulsoterapia.
O tema do Controle Social no campo da Saúde Mental é fundamental porque configura uma estratégia de consolidação do processo de Reforma Psiquiátrica.
O controle social permite aos atores do campo da atenção psicossocial participar da fiscalização da gestão das políticas de saúde mental nas três esferas de governo e dos serviços de saúde mental por meio de conselhos de saúde e, atualmente, os intersetoriais, a exemplo dos conselhos de assistência social, no enfrentamento do deslocamento das comunidades terapêuticas ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS).
Os grupos econômicos que defendem o manicômio nunca saíram do cenário e não foram derrotados enquanto concepção, e hoje os novos manicômios vem travestidos da alcunha de Comunidades Terapêuticas. Somos contrários a todas as formas de nosocômios.
Um “apagão de dados” sobre a situação da saúde mental no país, no desgoverno passado próximo, houve fechamento de serviços da Rede de Atenção Psicossocial - RAPS, desfinanciamento de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e desmonte dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) na Atenção Básica, faltou monitoramento e avaliação dos serviços prestados, e não houve incentivo a pesquisas no setor, além da ausência de transparência no uso de recursos públicos, fazendo um escoadouro de recursos ao não público, as CTs e não há controle público, nem padronização nem mecanismos de avaliação.
É um cenário de barbárie que precisa ser enfrentado, em fiscalização recente pela (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão) PFDC e Conselho Federal de Psicologia (CFP) foram encontrados indícios graves de tortura, tratamento cruel, desumano e degradante.
A retomada e consolidação das Políticas Públicas para o campo da Saúde Mental depende, necessariamente, de usuários, familiares e profissionais engajados para fiscalizarem.
O Movimento de Luta Antimanicomial, em suas diferentes formas de organização, tem sido um ator social que visa ações contra qualquer abuso e exploração, um exercício maior de cidadania.
Mas ainda existem muitas ameaças e muitos retrocessos que estão sendo engendrados a partir de quem não acredita no cuidado em liberdade.
Sempre são necessárias ações de conscientização social para superar estigmas e considerar modos alternativos de ver e estar no mundo, priorizando um cuidado que visa a autonomia e o respeito à cidadania. Dar voz ao convivente dos serviços de Saúde Mental no que concerne aos seus interesses e o tratamento que pode ser mais adequado para todes.
Mas somos resistência: nenhum passo atrás, manicômio nunca mais.
Na construção e realização em data próxima da etapa nacional da 5ª Conferência Nacional de Saúde Mental (CNSM) em Outubro de 2023 denominada: “A Política de Saúde Mental como Direito: Pela defesa do cuidado em liberdade, rumo a avanços e garantia dos serviços da atenção psicossocial no SUS”. O eixo principal da 5ª CNSM é “Fortalecer e garantir Políticas Públicas: o SUS, o cuidado de saúde mental em liberdade e o respeito aos Direitos Humanos”
Manicômio Nunca Mais! Por uma Democracia Antimanicomial!
Fernanda Lou Sans Magano, psicóloga, conselheira nacional de saúde e integrante da mesa diretora do CNS