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Nas cidades onde atuam, conselhos locais de saúde aperfeiçoam o SUS
Foto: CNS
A campanha pela criação de conselhos locais de saúde por todo o país, em cada Unidade Básica que compõem o Sistema Único de Saúde (SUS), já está acontecendo. No último dia 29 de novembro, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) reuniu 44 representantes de conselhos de saúde de capitais e conselhos estaduais para ouvir experiências e sugestões de cidades onde a experiência já existe.
A proposta do encontro, realizado em Brasília, foi a de visualizar dificuldades, boas soluções e aprimorar estratégias para a campanha. A meta de criar conselhos locais de saúde em, pelo menos, todas as 42 mil UBS’s do país, foi estabelecida em resolução aprovada pela 17ª Conferência Nacional de Saúde e já incorporada pelo Ministério da Saúde. A campanha tem prazo de três anos.
Também com o objetivo de conhecer histórias bem-sucedidas de implementação de conselhos locais, o CNS, representado por Fernanda Magano, acompanhou as eleições realizadas em 25 de novembro na cidade paulista de Mauá, Grande ABC. No município, os conselhos – lá batizados de conselhos gestores – existem desde 1991. Resistiram a diversas trocas de comando na gestão municipal e seguem atuantes.
A exemplo dos já existentes, os futuros conselhos locais serão formados por representantes da gestão, dos trabalhadores da saúde e por pessoas eleitas para representar a população que mora e trabalha nos territórios onde a unidade está instalada. Esses grupos trabalham em conjunto com os conselhos municipais. Os conselheiros e conselheiras locais não serão remunerados para exercer esse trabalho.
Durante o encontro realizado em Brasília, o presidente do CNS, Fernando Pigatto, destacou que o desafio de consolidar os conselhos locais em todo o território nacional insere-se na construção de cidadania e no aperfeiçoamento do próprio SUS. “Onde a participação e o Controle Social são mais fortes, o serviço público de saúde tem melhores resultados, temos visto isso em diferentes oportunidades”, disse ele. “São exemplos exitosos que podem nos orientar nessa caminhada”, completou.
Um desses exemplos exitosos pode ser reconhecido em Mauá, que acaba de eleger 138 novos conselheiros locais e 52 suplentes, que atuarão em todos os equipamentos de saúde da cidade. Por pressão do Controle Social, que vinha apresentando a demanda há bastante tempo, o município vai ter uma quinta Unidade de Pronto Atendimento (UPA). O anúncio da construção foi feito em outubro pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, em visita à cidade. Além dos R$ 6,5 milhões para a nova UPA, Nísia anunciou um reforço de R$50 milhões no repasse à rede de saúde local.
“Com o apoio dos conselhos populares, conseguir que nossa demanda fosse atendida ficou mais fácil”, garante Kátia Watanabe, secretária municipal adjunta de Saúde e vice-presidenta do Conselho Municipal de Saúde. “Se o gestor vai até o governo federal apenas com seu parecer técnico, não tem a mesma força. Mas, se além do projeto, vamos buscar recursos com o embasamento das demandas populares, de quem vive o cotidiano da cidade e usa o SUS, a reivindicação ganha corpo”, diz ela.
Embora destaque que a sensibilidade do governo Lula às demandas sociais também seja um facilitador (“com o governo anterior não conseguíamos estabelecer um diálogo consistente”, comenta), o lastro dos conselhos municipal e locais transcende as relações pessoais ou políticas. “Quando se trata de SUS, aquilo que é verdadeiro, que vem da experiência real, salta aos olhos”, afirma.
Mauá também conquistou, recentemente, a volta do serviço público de hemodiálise. Moradores da cidade que precisavam deste atendimento eram obrigados a se dirigir para cidades vizinhas, desde 2016. Com o aumento do repasse, anunciado em outubro pela ministra da Saúde, uma nova clínica credenciada voltará a operar o serviço, tão logo a decisão seja publicada no Diário Oficial.
“Que movimento nós fizemos? Colhemos dados e embasamos a demanda com os depoimentos colhidos junto à população pelos conselhos gestores. Conseguimos viabilizar”, explica Kátia, que é dentista e servidora pública concursada na cidade.
As dificuldades que a cidade enfrenta não se explicam apenas pelo desmonte do período Bolsonaro, mas também de administrações municipais anteriores, garante a secretária-adjunta. “Não há como não falar disso. Quando a gestão tem raízes democráticas e populares, os conselhos são levados a sério e o planejamento das políticas tem prioridades estabelecidas a partir disso”.
Ampliação democrática
O prefeito de Mauá, Marcelo Oliveira (PT), foi votar na eleição de conselheiros e conselheiras locais. Naquele sábado, a temperatura não passava de 15 graus e uma chuva fina, mas persistente, cobria a cidade, encravada na parte alta da Serra do Mar, caminho para o litoral. A UBS onde Marcelo depositou seu voto é uma das que atendem o Jardim Zaíra, que reúne mais de 100 mil habitantes.
“A participação e o Controle Social são fundamentais para orientar uma prefeitura, para ajudar a estabelecer prioridades. Às vezes, mudamos nosso planejamento, alterando a ordem de execução de obras ou providências a tomar, a partir de demandas que vêm dos conselhos”, comentou o prefeito.
Na UBS Zaíra, o prefeito se encontrou com a conselheira nacional Fernanda Magano. “O que Mauá está fazendo neste sábado é um marco da consolidação e ampliação da democracia”, comentou Fernanda. “Que este exemplo seja um estímulo para que os conselhos municipais de saúde, Brasil afora, ajudem e apoiem o projeto de levar os conselhos locais para todo o território”, disse ela.
De volta a Brasília, onde participou do encontro com representantes de conselhos estaduais e de capitais, no dia 29 de novembro, Fernanda citou a experiência de Mauá como referência para a massificação dos conselhos locais.
Outros exemplos foram apresentados durante o encontro. Pigatto recordou a oficina realizada em parceria com a Fiocruz, em maio, quando representantes de conselhos locais já consolidados compartilharam experiências vividas ao longo do processo (um vídeo daquele encontro pode ser assistido aqui).
Do grupo reunido em Brasília, outras histórias foram apresentadas. Algumas anteciparam dificuldades que devem surgir. Uma delas, a resistência de governos municipais em liberar representantes dos trabalhadores do SUS para participarem dos encontros dos conselhos. Outra, a indiferença de governos estaduais.
Há conquistas também. Em Vitória, novas eleições para conselhos locais acontecem em dezembro, e o funcionamento do Controle Social está cada vez mais sólido. Em Florianópolis, a atuação dos conselhos recebeu, recentemente, um prêmio de boas práticas. Em Manaus foram eleitos novos 600 conselheiros para ocupar os 73 conselhos locais existentes. Naquela capital, um grupo de 400 pessoas participaram da mais recente edição do programa formativo. Em Aracaju, as eleições costumam ser precedidas por faixas espalhadas pela cidade, visitas a organizações da sociedade civil e trabalho porta-a-porta nos bairros.
A própria construção dos conselhos já é um processo de aperfeiçoamento do SUS, na medida em que ajuda a população a entender como funciona, quais as responsabilidades de cada ente federado – municípios, estados e União. Quem garante é Katia Watanabe, de Mauá. “Cada demanda que surge, cada cidadão que procura os conselhos, é uma oportunidade de formação, de diálogo sobre o que representa o SUS, o que pode ser melhorado, e como funciona”, diz.
“Quando dizemos que algo não é possível, precisamos explicar os motivos e convocar para a participação. Nós precisamos encantar as pessoas, mostrar que com a ajuda delas, podemos ganhar a batalha do SUS. Você só defende aquilo que você entende e aquilo em que você acredita”, garante ela.
Ascom CNS