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Artigo: Pandemia, LGBTfobia e os impactos das negligências do Estado para esta população
Foto: CNS
Nem os analistas políticos, econômicos e sociais mais dedicados puderam antecipar 2020. Vemos o mundo enfrentando transformações em todas as áreas, provocadas por intensos conflitos políticos, aprofundando uma grave crise econômica e uma avassaladora pandemia, a qual, aliada às desigualdades sociais e econômicas, agravou ainda mais a fome, o desemprego, a violência e a precarização das vidas. A população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT+) segue intensamente impactada por este cenário de caos.
O primeiro caso confirmado de Covid-19 no Brasil foi diagnosticado em 26 de fevereiro, em um homem branco de 61 anos, residente na capital paulista, que voltara de uma viagem para a Itália, e a primeira morte confirmada pelo coronavírus aconteceu no Rio de Janeiro, uma mulher de 63 anos, negra e doméstica, um fato bastante simbólico: o vírus é mais letal para quem vive vulnerabilidades. Até 8 de março de 2021, já são mais de 265 mil óbitos, com perspectivas desanimadoras, potencializadas pela indisposição, ineficiência e incapacidade governamental.
O governo federal se absteve do seu papel de comando central no enfrentamento à crise sanitária Promoveu deliberados e contínuos ataques ao Sistema Único de Saúde (SUS) diante das inúmeras mudanças de ministros, secretários, coordenadores e profissionais, guiadas não por critérios técnicos, mas pela ânsia de submeter a pasta a desmandos de toda ordem e nefastas orientações ideológicas. Defender o SUS nunca foi tão necessário.
Temos hoje mais de 14 milhões de pessoas desempregadas, 22% de aumento de casos de feminicídio, 40% mais casos de assassinatos de pessoas trans. A cesta básica aumenta o preço, ao mesmo tempo em que o auxílio emergencial cai 50% numa conta que só amplia as desigualdades para quem já vive a subalternidade.
Para LGBTs, ficar em casa pode ser um risco de violência
Ficar em casa tornou-se um desafio para mulheres e LGBTs, especialmente travestis e transexuais e outras identidades que sofrem violências intrafamiliares. A medida obrigou mulheres e LGBTs a permanecerem em convivência com seus agressores por um período mais prolongado, não à toa casos de feminicídio e transfeminicídio aumentaram em vários estados brasileiros.
No Estado do Mato Grosso, por exemplo, foram registradas 160 ocorrências de crimes contra LGBTs entre janeiro e agosto de 2020, conforme dados do Grupo Estadual de Combate aos Crimes de Homofobia (GECCH), divulgados pela Secretaria de Estadual de Segurança Pública (SESP-MT).
Se comparado com o mesmo período de 2019 – que teve 77 boletins – o número aumentou em 108%. O fato é que o reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da lgbtfobia como crime de racismo, possibilitou acreditarmos no aumento da procura por equipamentos de segurança para denunciar as violências que sempre existiram.
Além disso, identificamos dificuldades em várias cidades no acesso da população LGBT+ a serviços e procedimentos de saúde, incidimos politicamente junto a gestores e fomentamos o controle social para que a saúde integral da população LGBT+ não fosse prejudicada. Mas sabemos que em muitos lugares a desassistência venceu, e acompanhamos pelas redes sociais muitos casos de depressão, tentativas de suicídio e até novas infecções e condições crônicas.
O movimento social fez o que o governo não conseguiu: protagonizou campanhas de arrecadação de roupas e de alimentos para pessoas cujas vulnerabilidades agravaram com o isolamento social. A confecção e a distribuição de máscaras foi uma oportunidade aproveitada para diminuir os impactos da doença na vida das pessoas e reduzir os efeitos da pandemia.
Ausência de dados sobre LGBTs e Covid-19
De acordo com diagnóstico do Coletivo #VoteLGBT entre 28 de abril a 15 de maio de 2020, houve piora na saúde mental em 42,72% dos mais de 10 mil entrevistados de todo o país como o principal impacto da pandemia para a população LGBT+. Uma parcela ainda maior, 54%, afirmou que precisa de apoio psicológico. As novas regras do convívio social, a solidão e o convívio familiar foram mencionados por 39,23% Dos participantes, 17,62% citaram as dificuldades econômicas como os maiores impactos, por falta de trabalho ou de dinheiro.
Segundo dados do Sistema Único de Saúde (SUS), divulgados em 2020, a cada uma hora uma pessoa é agredida devido sua orientação sexual ou identidade de gênero. A vida de uma pessoa LGBT+ no Brasil é marcada pela violação dos direitos humanos, por diversas violências sejam elas psicológica, moral, física e para atualizar ainda mais nossos leitores, o Brasil segue liderando o ranking de assassinatos contra essa população.
Sobre a população LGBT+, não encontramos a informação do número exato de adoecimentos e mortes pela Covid-19. A pesquisa do Coletivo #VoteLGBT, realizada de forma independente, teve participação de 44% das lésbicas; 34% dos gays; 47% dos bissexuais e pansexuais; e 42% das transexuais. Destes, 21,6% do mesmo grupo afirmaram que estão desempregadas. Outros 28% dos entrevistados receberam o diagnóstico prévio de depressão. 97% dos entrevistados consideraram péssima a atuação do governo federal. No Brasil, ser LGBT é um risco de morte. Nossas reivindicações seguem cada vez mais inviabilizadas.
Neste ano de 2021, acreditamos na esperança e na luta para dissipar as angústias e descortinar a felicidade. Em frente ampla, irmanados, irmanadas e irmanades, seguiremos em defesa da democracia, da felicidade, da cidadania. Pela vacina, combatendo racismos, machismos e LGBTfobias. Seguiremos resistindo, avançando rumo à garantia dos direitos de todes, por uma democracia inquebrantável e pela soberania nacional. Esse é o nosso desejo, tão enorme quanto o nosso desejo de liberdade de ser e amar.