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A alimentação como autocuidado, resistência e autonomia: live do CNS dialoga sobre papel das mulheres na garantia da soberania alimentar
Fotos: Clésio Júnior | Secult/ES
“As mulheres iniciam a transição agroecológica tendo como principais motivações a preocupação com a saúde e a alimentação da família, a conservação da biodiversidade e a resistência ao agronegócio”. A afirmação é da conselheira nacional de Saúde pelo Conselho Federal de Nutricionistas e coordenadora da Comissão Intersetorial de Alimentação e Nutrição do CNS, Myrian Coelho Cunha Cruz. Ela foi uma das debatedoras da live do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que discutiu o papel estratégico e de resistência das mulheres na defesa e na promoção da soberania e segurança alimentar e nutricional, nesta quarta (24/03).
Myrian destacou que “a Covid-19 reflete a vulnerabilidade ambiental que se encontra a população mundial e interage com uma variedade de condições existentes”. Com isso, o contexto atual pode ser considerado de uma Sindemia, termo que se refere a essa articulação Covid-19 com outras três grandes pandemias no mundo: a fome, a obesidade e a crise climática.
Degradação ambiental
Somado a isso, o sistema alimentar está cada vez mais no centro do sistema econômico e alimentos básicos estão na condição de commodities, como arroz, milho, soja e a carne, cuja a produção em larga escala impacta na devastação de florestas, nas escolhas para uso do solo na demanda pela uso de agrotóxicos, no acesso aos alimentos no país – em função da elevação dos preços -, assim como na ocupação das pessoas, dada a alta mecanização envolvida no agronegócio.
As commodities são produtos que funcionam como matéria-prima, produzidos em escala e servem de base para a indústria. “Transformando-se em produtos ultraprocessados hipercalóricos, hiper palatáveis, cujo consumo nos afasta da nossa imensa diversidade de alimentos e das relações afetivas implícitas no modo de vida que situam o ser humano como parte da natureza”, explica a conselheira.
O debate foi mediado pela conselheira nacional de Saúde Ruth Guilherme, representante da Associação Brasileira de Nutrição (Asbran). Ela ressaltou que a Soberania Alimentar deve refletir o direito dos povos de decidir sobre suas políticas de agricultura e produção de alimentos, incluindo a defesa de culturas alimentares, não deixando de produzir, trocar e consumir conforme seus costumes e culturas.
Ancestralidade da comida afrobrasileira
A doutora em Educação em Ciências e Saúde e membro do Núcleo de Estudos Afro-brasileiro e Indígena da cidade universitária de Macaé, Rute Costa ressalta o papel da culinária como uma fonte de resistência a um sistema violento de opressão, de dominação e de exploração. “A colonização foi isso, a exploração não só dos elementos da matéria, do território físico, mas também se apropriou do nosso ser, do nosso saber e do poder”.
A pesquisadora falou sobre o trabalho desenvolvido no projeto de extensão da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no campus de Macaé, Culinafro: A Culinária Afro-brasileira como Promotora da Alimentação Saudável no Ambiente Escolar, que desde 2014 observa as relações da população afrodescendente com a cozinha afro- ancestral.
“Ao estudar mais sobre a produção afro-brasileira, percebemos uma série de técnicas aplicadas na produção de farinhas, moquecas, que têm origem na produção africana, como a produção das massas, os bolinhos, as comidas verdes, o processo de moagem e as plantas alimentícias não convencionais”, destaca.
Para as debatedoras, as mulheres estão agroecológicas, tendo como principais motivações a preocupação com a saúde e com a alimentação da família, com a conservação da biodiversidade e com a resistência ao agronegócio. Entendendo também que a cozinha é um lugar de autocuidado, resistência e autonomia.
“As mulheres são as guardiãs das sementes”, ressaltou Ana Heloisa Dorneles, mãe e mulher negra, do assentamento Filhos de Sepé em Viamão (RS). Ela relatou a experiência das mulheres que estão na linha de frente da luta pela conservação da biodiversidade e a resistência ao agronegócio, motivadas pela preocupação com a saúde e a alimentação da família.
Ana Heloisa também falou sobre os alimentos ancestrais que são fontes de aprendizado e trocas nas rodas de mulheres do assentamento. “Nós fazemos muitas trocas entre as mulheres do assentamento, as mulheres negras e as quilombolas, isso nos ajuda a sobreviver ao longo desses anos. Não se discute e nem se pensa com fome”.
O Guia Alimentar para a População Brasileira, publicado em 2014, traz os padrões tradicionais de alimentação desenvolvidos e transmitidos pelas gerações como fontes essenciais de conhecimentos para formulação de recomendações que visam promover a alimentação adequada e saudável.
Ele é uma das estratégias da Política Nacional de Alimentação e Nutrição e da Política Nacional de Promoção da Saúde e fornece, de maneira prática, as recomendações atuais para orientar a população a fazer valer esse direito.
Ascom CNS