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Nota pública: Diante da guerra, CNS se solidariza ao povo palestino, “uma ferida aberta no coração do Oriente Médio”
Foto: BBC
Luzes que surgem no céu escuro costumam ser associadas a comemorações e festividades em diversas localidades do mundo. Nas últimas semanas, essa percepção se alterou diante dos conflitos armados que riscam a noite escura em que vive a população palestina. São ataques e contra-ataques que cintilam a olho nu e que se perfazem no brilho mortal de mísseis e bombas jogadas em prédios, bairros e cidades inteiras onde a população palestina constrói a sua história.
O Estado de Israel, sob o discurso de tratar-se de uma estratégia de defesa de sua integridade, tem protagonizado um novo projeto de colonização do território palestino, semelhante aos horrores da ocupação promovida no contexto do apartheid sul-africano, de acordo com a reflexão do pensador Achille Mbembe no livro “Política da Inimizade” (2017).
Focalizando as condições de ambos os casos na criação de regimes racistas, Mbembe reflete sobre a construção de um inimigo comum e os processos culturais que passam a ser alimentados como desejo de separação, destruição e morte das pessoas que encarnam essa construção.
Em seu ensaio “Necropolítica” (2019), o mesmo autor nos mostra que esse processo, a ocupação colonial contemporânea da Palestina, é o mais bem sucedido projeto de necropoder dos nossos dias. Projeto este que legitima sua soberania e autoridade na sua própria versão da história e da construção das identidades históricas, políticas e religiosas.
Diante de cenários como esse, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) demarcou posição em defesa do povo da Palestina, por meio da Moção nº 009, 17 de julho de 2014, através da qual manifestou-se pelo fim imediato dos ataques ao povo árabe, dada a escalada da violência militar de Israel contra o povo palestino iniciada naquele mesmo mês.
Agora, em maio de 2021, voltamos às mesmas cenas de guerra com novos confrontos desencadeados pelas ameaças israelenses de despejo de famílias palestinas de Sheikh Jarrah, bairro da capital de ambos os povos, Jerusalém. Sabemos que em diversas ocasiões, desde 1979, o Conselho de Segurança da ONU afirmou que esses processos são “uma violação flagrante da legislação internacional”. E, como tal, não devem mais ser admitidos.
Ademais, como destacou o jornalista Jeremy Bowen, para quem esse conflito “é uma ferida aberta no coração do Oriente Médio”, a manutenção dessas condições bélicas não afeta apenas algumas famílias desalojadas, mas corrobora com a manutenção de uma guerra entre os povos, gerando ódio e ressentimento que atravessam gerações inteiras.
Por isso, as longas décadas que registram o conflito entre israelenses, com grande poder bélico validado pelos Estados Unidos, e os palestinos, acompanharam gerações que cresceram associando termos como “Faixa de Gaza” e “Cisjordânia” a zonas de violência e conflito aberto.
Para além desses efeitos geracionais, essa crise humanitária afeta diretamente a saúde das populações sobreviventes. Somente para responder ao agravamento da crise de saúde na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou, n última eira, dia 20 de maio de 2021, que serão necessários 7 milhões de dólares, cerca de 37 milhões de reais, para mitigar os impactos à saúde da população atingida.
Esses recursos serão necessários para o urgente envio de suprimentos médicos para as regiões afetadas pelo conflito armado, a fim de viabilizar cirurgias de traumatologia e combate à pandemia da Covid-19, entre inúmeros outros procedimentos.
Essa ajuda internacional revela-se necessária tendo em vista que, com mais de 240 pessoas mortas, milhares de feridos e prédios públicos atingidos pelos bombardeios (incluindo o único laboratório que realizava testes de Covid-19 em Gaza), as autoridades palestinas não encontram soluções para manter condições mínimas de atendimento de saúde e para promover a campanha de vacinação contra a Covid-19 de sua população.
Diante de mais um exemplar da necropolítica israelense na ocupação dos territórios da Palestina, voltamos a expressar nosso apoio e solidariedade a esse povo marcado pela guerra colonial contemporânea, reconhecendo a sua autonomia como maneira de honrar os seus direitos, respeitar a sua história e reestabelecer a paz na região.
Talvez assim, com paz efetiva e respeito mútuo, será possível supor que um dia as luzes no céu palestino deixarão de ser associadas à dor, às perdas e aos tremores no chão em que vive e continua a morrer o seu povo.
Brasília, 21 de maio de 2021
Comissão Intersetorial de Políticas de Promoção da Equidade
Conselho Nacional de Saúde