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Carta aberta do CNS às autoridades brasileiras no enfrentamento ao Novo Coronavírus
Foto: CNS
Carta aberta do CNS às autoridades brasileiras no enfrentamento ao novo Coronavírus
Em virtude do cenário de pandemia, devido ao Novo Coronavírus (Covid-19), o Conselho Nacional de Saúde (CNS) publica esta carta aberta voltada às autoridades brasileiras, em especial gestores e gestoras públicos, parlamentares e agentes responsáveis pela tomada de decisões emergenciais, que afetam diretamente a vida de todos os usuários(as) e trabalhadores(as) do Sistema Único de Saúde (SUS). O objetivo é zelar pela Seguridade Social no nosso país e pela vida das pessoas, propondo encaminhamentos e medidas que podem atenuar o cenário que estamos enfrentando no país.
Brasília, 23 de março de 2020
Excelentíssimos(as) senhores(as), Presidente da República, Ministros de Estado, Governadores(as), Prefeitos(as), Secretários(as) de Saúde e gestores(as) do SUS,
O CNS, enquanto órgão responsável pelo controle social no SUS, orienta que todos(as) os(as) referidos(as) nesta carta adotem medidas emergenciais, em todas as unidades da federação, para os próximos dois meses (abril e maio), visando conter a crise de Saúde que vivemos hoje e que pode se agravar nos próximos dias. Nesse sentido, é fundamental que sejam potencializadas ou desenvolvidas as seguintes ações:
1. Ampliar benefícios e programas sociais para populações mais vulneráveis e em risco pelo impacto da epidemia, no âmbito da Política Nacional de Assistência Social (Pnas) e do Sistema Único de Assistência Social (Suas), com a proposição de um programa de renda mínima mensal que amplie e desburocratize o acesso a programas sociais como o Bolsa Família. O objetivo é garantir a proteção a trabalhadores(as) do mercado informal, subempregados(as) e desempregados(as) ou qualquer outro segmento vulnerabilizado e em risco como;
- Pessoas em Situação de Rua;
- LGBTI+ e Pessoas Vivendo com HIV/Aids;
- Pessoas com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas;
- Pessoas com deficiência;
- Prostitutas e Trabalhadores(as) do Sexo em geral;
- População negra e indígena;
- Catadores de Lixo e Cooperativas de Reciclagem;
- Populações Ribeirinhas e Marisqueiras(os)/pescadores(as) artesanais;
- Empregadas domésticas e diaristas;
- Artesãos(ãs) e camelôs;
- Dentre outros(as);
2. Apoiar trabalhadores(as) formais e/ou desempregados(as) com seguro desemprego, ampliando o tempo de seguro durante a crise e com renovação automática de benefícios em curso como auxílio-doença, benefícios previdenciários e assistenciais; desenvolver medidas em defesa do trabalho e da renda para cooperativas, instituições de economia solidária e trabalhadores precarizados e aplicativos; proibir despejo de pessoas que não consigam pagar aluguel; criar medidas alternativas para quem não possuir recursos para pagar contas fundamentais como energia e água;
3. Impedir que seja vedado o acesso à água e à energia a todos os cidadãos e cidadãs no Brasil em todo o período de crise; que sejam tomadas as providências para que o abastecimento de água ocorra em todas as regiões onde vivem pessoas sem acesso ao bem para que as mesmas possam exercer o direito de implementar as medidas sanitárias orientadas pelo Ministério da Saúde;
4. Buscar a aprovação de medidas de proteção econômica e financeira a pequenas empresas, microempreendedores(as) individuais e trabalhadores(as) da iniciativa autônoma, durante o período de expansão e manutenção da epidemia;
5. Isentar contas de água e energia à população de baixa renda, desenvolvendo programas locais de entrega gratuita de itens de higiene pessoal e distribuição gratuita de alimentos ou cestas-básicas, garantindo o acesso à alimentação saudável, em especial às populações que mais precisam, listadas no item 1 desta carta. Alimentos saudáveis precisam estar disponíveis de forma estável e permanente durante o período de crise e pós-crise até que as pessoas sejam capazes de assegurar a si mesmas e aos seus familiares; garantir apoio financeiro e de vigilância sanitária na manutenção de restaurantes populares; apoio a casas de repouso para pessoas idosas e outras instituições filantrópicas;
6. Garantir a defesa do controle social e público sobre a Saúde Suplementar; que as normas do Ministério da Saúde junto à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não contrariem os princípios do SUS; que sejam acionados todos os mecanismos legais para que os planos de saúde cumpram suas responsabilidades sanitárias; que seja priorizado o investimento de recursos públicos na rede pública de Saúde; que o atendimento da rede de planos de saúde seja, de fato, suplementar e financiada com recursos próprios. Se houver necessidade de investimento no setor privado, que seja via estatização.
7. Garantir proteção a todos(as) os(as) profissionais de Saúde e trabalhadores(as) de serviços administrativos, de limpeza hospitalar, sem distinção de categoria de vulnerabilidade, em diferentes locais que lidem com a área da Saúde e atendimento ao público, fornecendo Equipamentos de Proteção Individual (EPI) adequados e assegurados por contratação emergencial de compra junto às indústrias do setor hospitalar (luvas, máscaras, álcool gel, outros julgados necessários), em caráter de urgência para rápida tramitação de licitações, com vistas ao crescimento exponencial de casos no próximo período;
8. Garantir assistência especialmente planejada para regiões ou comunidades com situação grave de calamidade por causa da epidemia, com a convocação urgente de parceria dos setores públicos municipais e estaduais com o setor privado para adaptação de hotéis e outros lugares com espaços vazios ou disponíveis para atendimento aos pacientes (Ex: clubes esportivos, refeitórios, escolas, pavilhões de esporte cobertos, galpões ociosos, hospitais de campanha, militares, etc);
9. Contratar trabalhadores(as) da Saúde e de limpeza em regime emergencial nos locais que forem adaptados para o atendimento ampliado a população, onde ocorra apoio de locais cedidos temporariamente para as Secretarias de Saúde;
10. Solicitar audiências (com restrição de pessoas) e formalizar documentos com manifestação de “Pedido de Urgência” para obter apoio do Legislativo e do Judiciário diante da necessidade de imediata revogação da Emenda Constitucional 95/2016.
11. Disponibilizar financiamento adequado para instituições de pesquisa relacionadas aos diversos aspectos da epidemia, com imediato planejamento de linhas de investimento (curto e médio prazo) para àquelas com projetos na área da Saúde pública;
12. Criar ou incluir em Gabinete de Crises Emergenciais do Ministério da Saúde, órgãos e instituições públicas como o CNS, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), Associação Brasileira de Economia de Saúde (Abres), Associação Brasileira Rede Unida, Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), Associação Paulista de Saúde Pública (APSP) e Sociedade Brasileira para Progresso da Ciência (SBPC), representações de Universidades Públicas com excelência em pesquisa na Saúde, Movimento Popular de Saúde (Mops), dentre outros, para construção de apoio diante da necessidade de diálogo social amplificado, incorporando as experiências e know-how do controle social e dos movimentos sociais e acadêmicos numa resposta comunitária à epidemia no país;
13. Apoiar os serviços de saúde, nos diferentes níveis de complexidade (ABS – MAC e AC), com número adequado de profissionais de Saúde formados (com registro profissional de graduação) e demais trabalhadores(as) (de limpeza, segurança, administrativos, entre outros), todos(as) devidamente providos(as) de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), bem como de aparelhos, instrumentos, insumos e medicamentos para o tratamento de pacientes e enfrentamento da Covid-19.
14. Incentivar a racionalização das ações em Saúde sem paralisar, buscando aliar esforços do atendimento ambulatorial (especialidades, etc) aos mais complexos, sempre disponibilizando recursos e servidores(as) para unidades de atendimento imediato e triagem (Ex: Upas), inclusive profissionais da área de Saúde das forças militares, como hospitais de campanha em locais de difícil acesso ou maior emergência da epidemia;
15. Garantir que qualquer medida de restrição de locomoção de pessoas, mesmo em benefício da necessidade de Saúde pública, não viole os direitos humanos fundamentais ou direitos civis, sem ampla discussão com órgãos ligados à Organização das Nações Unidas (ONU). Trabalhadores(as) de setores essenciais, pessoas que necessitem de atendimento em Saúde e pessoas que necessitem comprar alimentos precisam ter a liberdade de ir e vir garantida. O objetivo é zelar pela integridade física e mental dos cidadãos e cidadãs brasileiros, buscando também ações específicas e sensíveis à realidade de pessoas em regime carcerário ou cumprindo medidas socioeducativas, dentre outras populações vulneráveis.
Conselho Nacional de Saúde