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“É como se os 132 anos após abolição não tivessem passado”, lamenta Mariah Fernandes, quilombola, em live do CNS
Foto: André Dias
A Covid-19 atinge todas as pessoas, mas, no Brasil, são os pretos, pardos e pobres os que mais morrem pela doença. Dados do Ministério da Saúde, divulgados ainda em maio de 2020, apontam que 54,8% dos óbitos registrados são de pessoas negras. O impacto da pandemia nessa população foi o tema da Live do Conselho Nacional de Saúde (CNS), realizada na quarta-feira (17/06), nos canais do youtube e facebook.
“Temos problema de vulnerabilidade em Saúde desde sempre. É como se os 132 anos após abolição não tivessem passado”, lamentou Mariah Fernandes, convidada da Live, representante da coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). Mariah destacou o agravamento de questões estruturais e institucionais com a pandemia.
Segundo ela, o racismo, a falta de acesso às políticas públicas e as condições econômicas precárias, impactam tanto na prevenção quanto na assistência, resultando na vulnerabilização. “A população negra historicamente tem uma vivência de muita luta, impactada pelas práticas perversas do racismo”, afirmou a mediadora da atividade, Altamira Simões, conselheira nacional de Saúde, representante da Rede Nacional Lai Lai Apejo – Saúde da População Negra e Aids. A conselheira, emocionada, relatou a perda, naquele mesmo dia, de seu familiar. Gerson Pereira, homem negro, trabalhador, de Candomblé, foi mais uma vítima da Covid-19, na periferia de Salvador (BA).
Desigualdades para população de rua
O impacto da Covid-19 na população de rua que, majoritariamente (67%, segundo IBGE), é formada por negros e negras, foi abordado pelo conselheiro nacional de Saúde, representante do Movimento Nacional População em Situação de Rua (MNPR), Vanilson Torres. Ele falou sobre a falta de acessos tanto a documentos, quanto à água, à alimentação e, principalmente, à saúde. “Sempre houve esse isolamento social, seja pela negação, retirada de direitos ou ausência do Estado”, destacou.
Também presente na Live, a conselheira nacional de Saúde pela Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos das Instituições de Ensino Superior Pública do Brasil (Fasubra), Jupiara Gonçalves de Castro, falou sobre o racismo institucional que, além de negar a saúde, nega aos negros e negras a educação necessária para combatê-lo. “O racismo é um braço do capitalismo. O governo atual tem um projeto político racista e fascista. É o que temos de pior enquanto seres humanos”, destaca.
Covid-19 se alastra pelos quilombos
O avanço da Covid-19 nos territórios quilombolas foi abordado durante a live. Mariah Fernandes apresentou dados levantados pela Conaq que apontam pelo menos 80 mortes, nos últimos 67 dias, pela doença nesses territórios.
“O que está sendo feito para conter a expansão da doença nas comunidades quilombolas? Nada. Fica difícil quando não temos título à terra”, criticou Mariah, referindo-se à insegurança da permanência nos espaços quilombolas e também à falta de atendimento profissional de saúde nas comunidades. “Estamos fazendo o que o nosso povo sempre fez e faz: resistindo, com os nossos saberes”, destacou.
A falta de acesso da população periférica aos serviços de saúde também foi abordada pelo vice-presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Charles Tocantins. “A falta do programa Mais Médicos reflete no diagnóstico e o tratamento da população que está longe dos centros urbanos”. O Mais Médicos, programa iniciado em 2013, foi substituído pelo Programa Médicos pelo Brasil, lançado no dia 1º de agosto por meio da Medida Provisória (MP) nº 890/2019, porém tem sido avaliado por diversos ativistas como ineficiente.
O que é um quilombo?
Os quilombos, no passado, eram comunidades formadas por negros e negras que fugiam da escravidão nas fazendas. Hoje, são espaços de resistência, onde as famílias descendentes lutam por reafirmação da identidade e titulação da posse da terra que lhes é de direito.
Ascom CNS