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Volta às aulas: qual o momento certo? CNS e especialistas demonstram preocupação com retorno presencial em 2020
Foto: Instituto Alfa e Beto
O Comitê para Acompanhamento da Covid-19, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), trouxe à tona o debate sobre o retorno às aulas presenciais para estudantes das redes públicas e privadas frente à pandemia. A reunião, ocorrida na última quinta (13/08), contou com a presença de especialistas da Educação e da Saúde. Todos foram enfáticos ao defenderem que o risco do aumento exponencial de casos e de óbitos se tornar ainda maior é eminente.
A reunião contou também com a presença de representantes das 18 comissões do CNS. Para Fernando Pigatto, presidente do Conselho, é necessário fundamentar qualquer medida em evidências científicas robustas. “O Brasil teve o primeiro caso em 26 de fevereiro. Hoje convivemos com uma média diária de mais de mil mortos. Estamos vendo governos municipais e estaduais incentivando a volta às aulas sem que haja segurança diante da pandemia”, disse.
A maior preocupação das autoridades sanitárias é o aumento do fluxo de pessoas nas ruas, transportes públicos e unidades de ensino, abrindo espaço para o agravamento da transmissão comunitária, que pode levar a Covid-19 para profissionais da Educação e familiares dos estudantes. Até a tarde de segunda (17/08), os dados Do Ministério da Saúde mostravam 107.852 óbitos no Brasil, que é considerado o pico da pandemia no mundo.
Acesso precário à internet
Maria Helena Guimarães de Castro, conselheira da Câmara de Educação Básica e representante do Conselho Nacional de Educação (CNE), explicou que há muitos alunos em condições precárias de aprendizagem devido à dificuldade de acesso à internet e tecnologias. Ainda assim, segundo ela, é menos danoso para o país mantê-las em casa que retomar o ensino presencial.
Maria Helena é relatora do Parecer 11/2020, do CNE, que apresenta orientações educacionais para a realização de aulas e atividades pedagógicas presenciais e não presenciais no contexto da pandemia. “No Brasil, temos 48 milhões de alunos na educação básica. 85% são alunos da rede pública. Há muita desigualdade na relação público-privado. Temos escolas públicas adequadas, mas há outras que não possuem sequer banheiros”, lamentou.
Para um efetivo retorno, é necessário que escolas privadas, municipais, estaduais e federais readequem as estruturas de ensino. “No Norte e no Nordeste, as escolas usam ar-condicionado, as salas não possuem janelas. E não é recomendado muitas pessoas juntas em ambientes fechados”, disse. Nesse contexto, com objetivo de amenizar danos na aprendizagem, é necessário organizar um plano curricular 2020-2021 para priorizar, em especial, os alunos que estão no período de alfabetização.
Marta Vanelli, secretária de formação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação CNTE, afirmou que “os trabalhadores da Educação precisam de condições para o ensino remoto”. Segundo ela, o poder público está negando o direito à Educação ao não oferecer recursos necessários para professores e alunos ministrarem aulas pela internet. “Temos professores e alunos sem computador e acesso à internet. No entanto, pelo fato da escola ser um local de aglomeração, não é possível pensar em retorno presencial. O ano letivo se recupera, vidas não”.
O pesquisador Cláudio Maierovitch, coordenador do Núcleo de Epidemiologia e Vigilância da Fiocruz Brasília, afirmou que nos países onde houve retorno às aulas pós-pandemia, quando já havia segurança sanitária, foi necessário um plano de retomada. Há lugares onde apenas os mais velhos voltaram às aulas por saberem lidar melhor com as medidas sanitárias. Em outros, houve rodízio de turmas para diminuir o fluxo na escolas. No Brasil, porém, não há uma orientação federal para este retorno, assim como não há um plano nacional de enfrentamento à Covid-19.
“É uma injustiça. Não temos um plano nacional relacionado à pandemia, não temos intervenções eficazes, não temos coordenação, projetos. Depois de abrir o setor econômico sem segurança, querem retomar o setor da Educação. Há exemplos de sucesso com a volta às aulas pelo mundo e há exemplos trágicos, como em Israel, que usa intensamente ar-condicionado nas salas e tiveram uma nova onda casos”, disse.
Ainda assim, ele ressaltou que crianças estão sofrendo com a distância dos colegas e têm tido dificuldade na aprendizagem. O retorno às aulas também dá a possibilidade de retorno dos pais e mães ao trabalho. Porém, “voltando as aulas haverá mais surtos da transmissão em cadeias com professores, familiares, pessoas na rua. São milhões de pessoas circulando em contexto de pandemia. O governo, ao invés de pensar num plano de inclusão digital, oferecendo internet à população, quer simplesmente reabrir as escolas”, lamentou.
Boas práticas
Vitória Davi, conselheira nacional de saúde representante da União Nacional dos Estudantes (UNE), alertou sobre os riscos de evasão escolar em massa no Brasil após a pandemia. “A gente não tem dúvida que o retorno de milhares de estudantes pode propagar ainda mais a Covid no nosso país. Somos contrários ao ensino presencial neste momento, mas muita gente tem dificuldade”. Segundo ela, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), os estudantes cotistas e de baixa renda devem receber em breve R$ 100 por mês para contratarem um plano de internet, além de terem sido disponibilizados notebooks para que universitários possam seguir em casa tendo aulas à distância.
Outros conselheiros e conselheiras também se posicionaram contra o retorno às aulas, evidenciando a necessidade urgente de o governo apresentar um plano de retomada para orientar estados e municípios. Também defenderam mais recursos para alunos e professores terem aulas online de forma adequada. O CNS em breve deve levar o tema para plenário com objetivo de fechar formalmente um posicionamento acerca do assunto e cobrar, mediante os recursos legais, as autoridades competentes.
Ascom CNS