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Conitec participa de audiência pública do legislativo sobre incorporação de medicamento para tratamento de pacientes com AME no SUS
Audiência Pública Ordinária/Câmara dos Deputados - Brasília. Fotos: Walterson Rosa/MS
A Secretaria-Executiva (SE) da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) participou da audiência pública sobre a incorporação do medicamento onasemnogeno abeparvoveque (Zolgensma) no SUS, convocada pela Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (25). A assessora técnica do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde (DGITS), Corah Prado, foi quem apresentou informações sobre a avaliação inicial da tecnologia para o tratamento da Atrofia Muscular Espinhal (AME) feita pelo Plenário da Comissão, em agosto, durante reunião extraordinária (assista aqui). O medicamento esteve em consulta pública até o início deste mês e retornará para avaliação final da Conitec em novembro.
A recomendação inicial da Comissão foi desfavorável à incorporação no SUS em razão de incertezas quando aos benefícios a longo prazo e segurança do medicamento, bem como o impacto econômico no sistema de saúde. “Muito mais do que incorporar uma droga órfã, é necessário que tenhamos uma política que amplie o acesso ao diagnóstico, uma linha de cuidado para os pacientes portadores de doença rara”, disse o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, também ouvido durante a audiência.
No caso debatido, a questão é que há incertezas em relação a eficácia comparativa. Segundo Corah, o que se considerou pelas evidências apresentadas no período da primeira avaliação do Plenário, é que o Zolgensma seria semelhante aos dois medicamentos já incorporados pela Comissão para os tipos I e II da doença. “Desfechos de mortalidade e não evolução para ventilação mecânica, o nusinersena já havia mostrado. Por isso que foi considerado semelhante. E ganhos motores também, assim como com o risdiplam”, argumentou. “As crianças com AME tem tratamento dentro do SUS e o Zolgensma viria como uma terceira opção. O que se precisa, de fato, é demonstrar a efetividade de que ele realmente é tão superior aos outros já incorporados e que justifique o valor que ele está.”
Quanto aos aspectos de segurança do medicamento levantados pela Comissão, e que provocaram questionamentos por parte de alguns participantes da audiência, Corah respondeu de maneira objetiva. “A grande vantagem do Zolgensma pode ser o grande problema do Zolgensma. Ele é dose única. Uma vez que você fez a medicação, se você não conhece em longo prazo a segurança disso, você não tem como reverter o que foi feito. Enquanto que com os demais são feitos com uma certa periodicidade, você pode detectar o efeito adverso e pode atuar tomando as providências cabíveis ou retirando a medicação. O Zolgensma, não. Uma vez feito, os efeitos estão lá, positivos e negativos. E por isso a questão de segurança é tão importante para a Conitec”, explicou Corah, médica pediatra que atua há mais de dezessete anos no Ministério da Saúde e integra o Plenário da Conitec desde 2012.
“O processo de avaliação de tecnologias em saúde é muito amplo, não é só questão de quantos milhões, mas sim, mediante o que foi incorporado, o que de fato esse novo medicamento vai trazer para o paciente, antes de mais nada”, disse Corah. “Por isso a gente faz avaliação econômica e mostra qual diferença de custo e resultado, e o quanto se equivalem.”
Corah também garantiu que não houve postergação em relação ao processo de avaliação do Zolgensma. “Nós temos uma média de avaliação dos medicamentos de 165 dias. Recentemente, sofremos uma auditoria pela CGU e, assim, todas essas questões são muito observadas, porque respeitamos bastante os normativos legais que nos guiam.” Ela lembra que a Comissão já avaliou 150 demandas para doenças raras e que entre PCDT e Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT), 40% dos documentos é relativo a doenças raras. “Esse número mostra o quanto o tema tem sido prioridade dentro da avaliação de tecnologias em saúde, os nossos dados mostram isso”, afirma.
Entenda
A demanda para avaliação com proposta de incorporação do medicamento foi encaminhada à Conitec pelo fabricante, a Novartis. A indicação proposta é de que o medicamento atenda pacientes pediátricos abaixo de 2 anos de idade com atrofia muscular espinhal (AME) do tipo I ou com até três cópias do gene de sobrevivência do neurônio motor 2 (SMN2). O demandante seguiu integralmente a indicação no país feita pela Anvisa, como consta em bula. No entanto, a Conitec considerou inicialmente que há incerteza na eficácia da tecnologia em pacientes com mais de seis meses e na efetividade de longo prazo em comparação com outras alternativas terapêuticas. "O processo de ATS é muito amplo", afirmou. "Ainda há uma certa confusão entre a atuação da Anvisa e atuação da Conitec. A Anvisa, como órgão regulador, analisa segurança e eficácia, porém, a avaliação da Conitec dentro do SUS tem vários outros aspectos. Não necessariamente o que a Anvisa avaliou, como avaliou, será considerado integralmente pela Comissão", esclareceu Corah.
Em sua versão atual, o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) da AME recomenda o uso do medicamento nusinersena no tratamento da AME tipos I e II. Em março de 2022, o Ministério da Saúde decidiu incorporar ao tratamento desses dois tipos de AME o risdiplam. O tratamento medicamentoso no SUS é realizado a partir do diagnóstico, conforme critérios estabelecidos no Protocolo, e se mantém pelo tempo em que o paciente se beneficiar do seu uso. “Nós já temos um corpo de evidência que nos permite vislumbrar algumas questões relativas ao medicamento. Além dos ensaios clínicos, existem estudos de comparação indireta, quatro estudos observacionais com dados importantes que foram considerados na discussão da Conitec", explicou a assessora técnica. No caso do Zolgensma, a questão é quanto esse medicamento traz de benefício a mais que poderia justificar um valor/preço maior. O preço proposto para incorporação foi de R$ 5.722.712,79/paciente, sendo a estimativa da empresa de aproximadamente 66 pacientes elegíveis no primeiro ano. Um impacto orçamentário para o SUS de aproximadamente R$ 347 milhões no 1º ano a R$ 493 milhões no 5º ano de incorporação do medicamento.
Durante a exposição do representante da Novartis, na ocasião da audiência pública, alguns pontos não ficaram claros. Houve afirmações de que os prazos para avaliação de incorporação de tecnologias são muito longos e não atendem as necessidades da sociedade. No entanto, sabe-se que, nesse caso, antes mesmo de submeter a registro no país, o fabricante prospectou e passou a estimar possíveis valores do Zolgensma para a negociação com o Ministério da Saúde. Durante dezessete meses, o fabricante discordou dos preços estabelecidos pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) para comercialização no país, entrando com recursos e optando por não comercializar o produto em menor tempo. O medicamento foi considerado equivalente ao nusinersena e, portanto, o valor inicialmente proposto era relativo a dois anos de tratamento.
Já a Conitec avaliou todas tecnologias para AME dentro do prazo legal de 180 dias. Em relação ao Zolgensma, o prazo se esgota no dia 19 de novembro, estando, portanto, dentro do tempo previsto para a recomendação final. “O que a Conitec visa, antes de mais nada, é dar segurança aos pacientes, assegurar que eles realmente vão ter os resultados que os ensaios clínicos demonstraram, e, sim, pensando na sustentabilidade do Sistema”, destacou a assessora técnica.
Apesar dos questionamentos sobre a necessidade de diminuição do prazo de 180 dias para avaliação de incorporação de tecnologias no SUS, a Conitec é uma das instâncias de ATS que trabalha com menor prazo e dispondo de áreas técnicas mais enxutas. Para se ter uma ideia, o NICE, agência do Reino Unido responsável por conduzir todos os processos de avaliação de tecnologias, tem 500 técnicos e tem como média para análise das demandas de 7 a 14 meses. A Conitec o faz em 6 meses.
Quanto à disponibilização do risdiplam, a atualização do o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) está sendo feita junto ao processo de compra do medicamento, e a previsão é de que ele esteja no SUS a partir do primeiro trimestre de 2023. “Todo medicamento incorporado na Conitec é incorporado mediante PCDT”, reforça.
Outra questão abordada pela Novartis foi a proposta de acordo de acesso gerenciado apresentado pela empresa à Comissão, que se concentra na avaliação de desfechos como mortalidade e ventilação mecânica invasiva permanente, alegando dificuldade de se medir desfechos de escalas motoras no país. A assessora técnica do DGITS ressaltou que um estudo encomendado pelo MS mostrou que há uma estrutura de centros de referências de profissionais qualificados que acompanham os pacientes com doença rara. “Uma vez diagnosticado e em tratamento, ele vai necessitar dos centros de referência. Grande parte deles são centros universitários com neurologistas que têm experiência em acompanhar a AME e outras doenças. Então, nós temos essa rede em doenças neuromusculares que é capaz, sim, de acompanhar a efetividade dos medicamentos.” O objetivo desse estudo é avaliar os pacientes que usaram o Zolgensma em relação a ganhos em escalas motoras, o que permitirá avaliar a efetividade do medicamento na vida real.