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Aumento de produtividade agrícola pela polinização: integrando biodiversidade e agricultura sustentável
Nossa sociedade depende de processos e produtos providos pela natureza para sua manutenção e sobrevivência. Estes processos e produtos têm sido reconhecidos como contribuições da natureza para as pessoas, abrangendo diferentes dimensões, tais como ambiental, econômica e cultural. A polinização (interação entre as flores e seus animais polinizadores) é uma dessas contribuições para o bem-estar humano e para nossa segurança alimentar, além de ser fundamental para a manutenção e a estabilidade dos ecossistemas. Diversas culturas agrícolas dependem da polinização por animais para a produção de alimentos e outros produtos agrícolas.
No Brasil, 76% dos produtos agrícolas dependem em algum grau dos polinizadores. No entanto, a extensiva conversão de hábitats naturais em áreas agrícolas e pecuária e a intensificação da agricultura por meio do uso de insumos químicos afetam as populações de polinizadores e, consequentemente, a própria polinização das culturas agrícolas. Neste contexto, o projeto SPIN (Síntese Sobre Intensificação da Polinização) propõe fornecer evidências científicas sobre a polinização agrícola em nosso país e embasar iniciativas de restauração ecológica visando a conservação da natureza aliada à agricultura. Nossas primeiras análises, baseadas na produção agrícola de 2017, reforçam a importância dos polinizadores, indicando que a polinização representou US$13 bilhões de ganhos econômicos para o Brasil.
O SPIN propõe aliar restauração ecológica a práticas agrícolas amigáveis aos polinizadores. Este modelo baseia-se na chamada intensificação ecológica, ou seja, o aumento de produtividade agrícola através da polinização, reduzindo a conversão de hábitats naturais em terra agrícola e diminuindo o uso intensivo de insumos agrícolas. As iniciativas de restauração e práticas amigáveis aos polinizadores buscam incrementar ou restabelecer, ao menos parcialmente, o serviço de polinização em paisagens com altos níveis de degradação. Como consequência, essas iniciativas também podem promover ou aumentar a entrega de outras contribuições da natureza, como provisão de água, fertilidade do solo, controle de pragas, sequestro de carbono e diversificação de bens de consumo.
A recomendação de propostas adequadas de restauração ecológica e intensificação da polinização devem levar em consideração tanto aspectos naturais como aspectos socioeconômicos. No Brasil, temos uma enorme variedade de paisagens agrícolas e naturais, desde monoculturas extensivas a práticas integradas como sistemas agroflorestais. Somado a isso, a capacidade de tomar e implementar decisões de manejo depende de diversos fatores que variam de acordo com o contexto local e os atores envolvidos, por exemplo, o perfil do produtor, associações rurais, instituições intermediárias (ONGs, setor privado, extensão rural) e setor público. Por isso, para o projeto SPIN, além de cientistas com atuação em diferentes especialidades, formamos uma equipe com representantes do setor agrícola e do terceiro setor, garantindo experiência de quem atua ao longo da cadeia produtiva.
Nosso principal objetivo é mapear a demanda pela polinização agrícola e as oportunidades de restauração no país, visando maximizar a produtividade agrícola via provisão do serviço de polinização aliada à conservação da biodiversidade. Para isso, trabalhamos em cinco objetivos específicos: 1. Mapear déficits de restauração e dependência de polinização agrícola por município brasileiro; 2. Identificar atributos funcionais das plantas associadas a grupos polinizadores de culturas agrícolas e de espécies nativas; 3. Avaliar os benefícios econômicos e sociais da polinização para a agricultura; 4. Recomendar espécies de plantas e ações de restauração visando a intensificação da polinização dos cultivos agrícolas; 5. Orientar sobre políticas e práticas de conservação e restauração que promovam a intensificação da polinização.
Recentemente, a equipe produziu análises da demanda por polinização (grau de dependência das culturas agrícolas) para cada município no Brasil. Identificamos regiões com alta demanda (alta produção de culturas agrícolas com dependência de polinizadores) associada a alto déficit legal de vegetação, o que permite a indicação de áreas prioritárias para ações de restauração visando a intensificação da polinização. Um próximo passo é entender a configuração da paisagem nestes municípios, para estimar a potencial contribuição da polinização, definida aqui como a dependência em função da distância entre a área cultivada e a vegetação nativa. Iremos incorporar dados dos polinizadores (riqueza, potencial abundância e atributos como distância de voo) para estimar a potencial provisão de polinização agrícola de cada município. Ainda, a partir de dados de interação planta-polinizador, produziremos recomendações de espécies ideais para ações de restauração visando a promoção da polinização nas áreas cultivadas. Com isso, ambicionamos prover elementos para auxiliar o planejamento espacial dos esforços de restauração visando a intensificação da polinização. Nossa expectativa é promover diálogo com as partes interessadas para tradução e coprodução de conhecimentos necessários para subsidiar políticas públicas voltadas para proteção de polinizadores e do serviço de polinização em agroecossistemas no Brasil.
Abelha nativa Xylocopa frontalis polinizando flor da castanheira-do-Brasil (Bertholletia excelsa). Foto: Márcia Maués.
(*) São autores do texto os pesquisadores do projeto Projeto SPIN - Síntese sobre Intensificação da polinização: Biodiversidade e Agricultura Sustentável
Leandro Freitas, Marina Wolowski, Kátia F. Rito, Pedro Joaquim Bergamo, Alberto Ke-iti Oppata, André Rodrigo Rech, Antônio Mauro Saraiva, Blandina F. Viana, Edenise Garcia, Eimear Nic Lughadha, Felipe Deodato da Silva e Silva, Rodrigo Yoiti Tsukahara, Isabela Galarda Varassin, Kayna Agostini, Leandro Reverberi Tambosi, Lucas Alejandro Garibaldi, Marcia Cristina Mendes Marques, Márcia Motta Maués, Paulo Eugênio Alves Macedo de Oliveira, Pietro Kiyoshi Maruyama Mendonça e Tiffany Knight.