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Antártica: pesquisadores do Projeto Paleoantar descobrem fósseis de aves e plantas que viveram junto aos dinossauros há milhões de ano
Equipe do Paleoantar
Os pesquisadores do projeto PALEOANTAR – Museu Nacional/UFRJ, recentemente renovado pelo CNPq, acabam de divulgar pesquisas sobre novos fósseis encontrados na Península Antártica.
Novos exemplares de aves
No primeiro estudo, os cientistas do Museu Nacional/UFRJ Geovane Souza, Bruno Bulak, Marina Soares, Juliana Sayão e Alexander Kellner, em parceria com o pesquisador Luiz Weinschütz, do Centro Paleontológico da Universidade do Contestado, e Alessandro Batezelli, do Instituto de Geociências da UNICAMP, apresentaram dois novos exemplares de aves fósseis coletados na Ilha Vega, no litoral da Península Antártica. Os fósseis são compostos da região sacral (região da coluna vertebral) e parte de um tarsometatarso (osso da perna). Com o auxílio de tomografia computadorizada, os pesquisadores encontraram um padrão de estruturas internas das vértebras sacrais semelhantes às encontradas no grupo Neornithes, que envolve as aves modernas. No tarsometatarso, foi empregada análise microscópica para investigar o tipo de tecido ósseo presente.
Para o geólogo Dr. Luiz Carlos Weinschütz (CENPALEO/Universidade do Contestado), coordenador dos trabalhos de campo da equipe do Projeto PALEOANTAR, o que mais chama a atenção na descoberta é a quantidade de aves fósseis encontradas em um mesmo local. “Ficamos acampados lá por 50 dias, durante o verão de 2018/19 em busca de fósseis e amostras de rochas. Na época, identificamos centenas de fósseis, mas, ao contrário do que esperávamos, não encontramos os famosos dinossauros não-avianos", mas sim, aves, complementa o pesquisador.
O impacto do meteoro no Hemisfério Norte há 66 milhões de ano atrás pode ter tido efeitos mais devastadores naquela metade do globo do que no Hemisfério Sul. Na Antártica, os fósseis de plantas não registram qualquer tipo de mudanças bruscas na abundância ou composição florística durante a passagem do Cretáceo para o Período seguinte (o Paleoceno), sugerindo que talvez o continente não tenha sido tão afetado pela extinção. “Nesse cenário, a Antártica teria atuado como um refúgio para a vida terrestre durante o cataclisma, principalmente para as Neornithes que viviam em abundância por ali”, explica Geovane Souza, discente de doutorado do Programa de Pós- Graduação em Zoologia (PPGZoo), primeiro autor do trabalho.
As aves viventes são descendentes diretas dos dinossauros que viveram na Era Mesozoica (popularmente conhecida como Era dos Dinossauros), explica a Dra. Marina Soares, professora do Departamento de Geologia e Paleontologia do Museu Nacional/UFRJ. “O impacto de um meteoro, na região onde fica o México bloqueou a entrada de luz solar, impedindo a fotossíntese das plantas”, explica Marina. Sem as plantas, os herbívoros não podiam mais se alimentar e as cadeias ecológicas ruíram. Entretanto, os animais menores, capazes de se alimentar de insetos, sementes ou restos vegetais conseguiram sobreviver. Dentre estes, estão anfíbios, lagartos, tartarugas, mamíferos - que, na época, não eram maiores que camundongos, além de crocodilianos e as aves.
A Antártica do passado
O geólogo Dr. Alessandro Batezelli, do Instituto de Geociências/Universidade de Campinas destaca que: “durante o Cretáceo, a Corrente Circumpolar Antártica, um dos fenômenos responsáveis pela glaciação do continente, ainda não havia sido formada, permitindo que um clima bem mais quente predominasse no planeta”. A Antártica, por exemplo, apresentava temperatura média em torno de 15ºC, o que permitia a formação de densas florestas povoadas por uma fauna diversa. Atualmente, a Antártica é considerada como um sítio fossilífero muito interessante para a paleontologia mundial.
As aves na Era dos Dinossauros
As aves são dinossauros emplumados que surgiram muito antes até mesmo do famoso Tyrannosaurus rex. “Durante a maior parte da Era Mesozoica, os dinossauros avianos e não-avianos coexistiram lado a lado em vários ecossistemas terrestres”, comenta Geovane Souza. “Existem vários sítios paleontológicos onde fósseis de aves primitivas são encontrados em grande quantidade. Estas pertencem a várias linhagens aparentadas às aves modernas, que chamamos de Ichtyornithes, Enantiornithes, Hesperornithes, só para citar algumas. Aves modernas, assim como as viventes hoje, pertencem a uma outra linhagem que já existia desde a Era dos Dinossauros e são chamadas tecnicamente de Neornithes”, acrescenta.
As aves primitivas eram capazes de voar, mas exibiam características “dinossaurianas” primitivas, como uma boca repleta de dentes, garras nos dedos das asas e algumas apresentavam caudas sustentadas por vértebras alongadas como a de um lagarto ao invés de cobertas de penas como das aves atuais” – destaca Geovane.
“Fósseis de aves primitivas predominam nos depósitos fossilíferos de idade Cretácea do mundo todo, enquanto as aves modernas (Neornithes) são raras”, afirma Geovane. “Aparentemente, as adaptações das aves modernas não garantiram um sucesso diferencial quando comparado às aves primitivas da mesma época. Contudo, o único deposito fossilífero do mundo onde as aves modernas são mais abundantes do que as aves primitivas e os dinossauros não-avianos é na Antártica”, acrescenta. “Nessa pesquisa questionamos o porquê de as aves modernas serem tão abundantes na Antártica durante o Cretáceo através da descrição desses novos achados e uma extensa revisão da literatura paleontológica” – destaca o pesquisador.
Estudo da anatomia
Bruno Bulak, discente do curso de Ciências Biológicas da UFRJ e bolsista de Iniciação Científica FAPERJ , analisou a microestrutura óssea dos fragmentos fósseis das aves encontradas na Antártica. Segundo Bulak: “A quantidade de fósseis de aves e a fragmentação do material causada pelo congelamento de descongelamento anual dos solos antárticos permitiram que fossem destinados alguns ossos para osteohistologia, sem que houvesse a perda de informações morfológicas da espécie", esclarece. A análise microscópica do tecido ósseo revelou compatibilidade com o padrão encontrado nas Neornithes, endossando o estudo anatômico.
A extinção de algumas aves
Um dos maiores mistérios da paleontologia é descobrir o porquê que aves modernas sobreviveram à extinção no final do Cretáceo, mas as primitivas não, ressalta a Dra. Marina Soares. “Ao longo das últimas décadas, diferentes autores sugeriram que talvez as aves modernas fossem as únicas capazes de se alimentar de sementes, um recurso que se tornou abundante na época. Outros argumentam que o cérebro das Neornithes era mais desenvolvido e isso teria garantido sua sobrevivência diferencial”, destaca.
Interação inseto-planta na Antártica
No segundo estudo, os autores Edilson B.S. Filho, Arthur S. Brum, Geovane
A. Souza, Rodrigo G. Figueiredo, Cristian D. Usma, João H.Z. Ricetti, Cristine Trevisan, Marcelo Leppe, Juliana M. Sayão, Flaviana J. Lima, Gustavo R. Oliveira e Alexander W. A. Kellner acabam de apresentar novos registros de interações inseto-planta, do Cretáceo Superior, na Ilha Nelson, Península Antártica. O material consiste em 15 espécimes foliares de Nothofagus sp., uma angiosperma, que preservaram vestígios de atividade de insetos (figuras abaixo)
"O gênero Nothofagus é um elemento importante da paleoflora da Península Antártica no período Cretáceo, sendo, para algumas localidades, o fóssil mais comum em assembleias fósseis. O estudo das interações inseto-planta no continente é muito escasso, no entanto, trazemos aqui registros inéditos dessa evidência para o Cretáceo Superior (Campaniano). Essas descobertas nos ajudam a entender melhor as relações ecológicas nos ecossistemas antárticos", explica o professor da Universidade do Cariri e doutorando na Universidade Federal do Pernambuco, Edilson Bezerra Dos Santos Filho.
O material foi coletado em uma região chamada Rip Point, na Ilha Nelson, no período entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020, quando pesquisadores do PALEOANTAR participaram da OPERANTAR 38. Os pesquisadores acreditam que, além de contribuir para uma melhor compreensão do funcionamento dos ecossistemas, tais evidências preservadas nas folhas permitem identificar a presença de insetos como um importante componente das teias alimentares nesses ecossistemas há cerca de 80-70 milhões de anos.
Pesquisadores do segundo estudo representam as seguintes instituições: Programa de Pós-Graduação em Geociências da Universidade Federal de Pernambuco/PPGEOCE-UFPE, Museu Nacional/UFRJ, Universidade Regional do Cariri/URCA, e Universidade Federal Rural de Pernambuco/UFRPE, além de pesquisadores do Instituto Antártico Chileno (INACH).
Projeto Paleontar
O PALEOANTAR, coordenado pelo Dr. Alexander Kellner do Museu Nacional da UFRJ, e em parcerias com diversas instituições brasileiras, é um dos projetos financiados pelo Programa Antártico Brasileiro. “O fato de o Brasil estar fazendo pesquisa pioneira na Antártica destaca o papel importante da nossa nação no cenário geopolítico internacional, no que diz respeito a conhecer o passado e o presente daquele continente. Ao mesmo tempo, coloca o nosso país no centro das tomadas de decisões que afetarão o futuro do continente branco, o qual pertence a toda a humanidade”, acrescenta a Dra. Juliana Sayão, vice coordenadora do projeto e participante de ambas pesquisas. “Todos ficamos muito gratos ao CNPq pela renovação deste projeto, o que garantirá novas pesquisas por mais quatro anos”.
Veja o trabalho dos pesquisadores na Antártica:
Link dos artigos:
https://www.scielo.br/j/aabc/a/3mNnMRr8G3NHpKZ4w8K6m8J/?format=pd f&lang=en
https://www.scielo.br/j/aabc/a/H39DmsfkXyHWmQF4kXrk8Cy/?format=pdf &lang=en