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Pesquisadores apontam a relevância das diatomáceas no mar antártico
A revista internacional Limnology and Oceanography publicou, no mês de setembro, artigo científico liderado por pesquisadores brasileiros sobre a relevância das diatomáceas, um tipo de microalga marinha, fundamental para a eficiência da bomba biológica de carbono na região do mar antártico. A atividade fotossintética desses organismos fitoplanctônicos auxilia a retirada do excesso de gás carbônico atmosférico, um dos principais gases do efeito estufa, associado às mudanças climáticas e liberado de forma diária pelo homem, por meio da queima de combustíveis fósseis. O trabalho, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), foi desenvolvido pelo Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes (GOAL), da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), no âmbito do Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR). O artigo teve a participação de vários pesquisadores e foi liderado pelo bolsista de Iniciação Científica (IC) do CNPq, Raul Rodrigo Costa, que verificou in situ as condições ambientais prevalentes durante o período de desenvolvimento da floração de diatomáceas na região antártica.
Ao observar uma atípica floração de diatomáceas, considerada um fenômeno natural, os pesquisadores procuraram identificar os processos físicos responsáveis pelo controle do desenvolvimento desse tipo de microalgas. O trabalho mostrou que o crescimento massivo das diatomáceas gerou um fluxo de gás carbônico, da atmosfera para a água, em valor aproximado de cinco vezes a média normal para a região pesquisada, do Norte da Península Antártica (conhecida pela sigla NAP, em inglês). Os pesquisadores observaram também que parcela significativa da biomassa produzida durante a floração se encontrava em processo de rápida sedimentação, isto é, em deslocamento para o fundo do oceano. Concluíram, assim, que a floração massiva de diatomáceas estudada, pelo rápido afundamento, foi pouco significativa para a cadeia alimentar da região, ao não servir de alimento para o krill antártico (invertebrado semelhante ao camarão), item fundamental da dieta de grandes predadores como focas, baleias e pinguins. O trabalho, contudo, mostrou o papel relevante realizado pelas diatomáceas para a chamada "bomba biológica", ou seja, para o sequestro de gás carbônico da superfície da água. A pesquisa poderá gerar ideias para o aperfeiçoamento de modelos matemáticos que tentam prever a dinâmica futura do fitoplâncton, de acordo com os impactos ambientais ocorridos na região.
Esse tipo de pesquisa é raro. Apesar de sua importância para o ecossistema daquela área e para o ciclo de carbono marinho, o conhecimento ecológico e de distribuição das diatomáceas no Oceano Sul permanece generalizado. Algas comuns em ambientes ricos em nutrientes das regiões polares e em zonas costeiras, as diatomáceas possuem papel relevante nos ciclos biogeoquímicos antárticos e respondem por cerca de 40% da produtividade primária marinha, sendo imprescindíveis para toda a cadeia alimentar da região da NAP. Além disso, são as principais mediadoras do processo conhecido como "bomba biológica", pelo qual essas algas, por meio da fotossíntese, retiram o gás carbônico da água, levando-o para o fundo do oceano, onde fica retido por centenas de anos. Como resultado do processo, a pressão parcial desse gás na interface do ar com a água se altera, gerando fluxo potencial de gás carbônico atmosférico para o oceano. Durante o período amostral da pesquisa, as diatomáceas dominavam uma ampla área da NAP, que incluiu os Estreitos de Gerlache e de Bransfield.
As algas são incapazes de se locomoverem contra as forças das correntes marítimas. Portanto, qualquer mudança que exista no compartimento físico do ecossistema pode afetar a sua sobrevivência ou desenvolvimento, tornando-as excelentes indicadores de mudanças ambientais ou climáticas. A NAP, por sua vez, se mostra um laboratório relevante para observações dos impactos sob os quais esses organismos microscópicos estão suscetíveis, devido a sua sensibilidade às consequências do aumento da temperatura. Desde a década de 1950, a região já registrou aumento médio de sete graus Celsius na temperatura de inverno, o equivalente a cinco vezes a média global. Devido a isso, a temperatura superficial da água na região aumentou, acompanhada pela retração dos glaciares e pela redução da cobertura de gelo. As mudanças físicas e climáticas na NAP são acompanhadas pelo declínio da biomassa de fitoplâncton, produzida durante o verão austral. As grandes diatomáceas vêm sendo substituídas por pequenas células de criptófitas, outro grupo de microalgas que não são consumidas pelo krill e, por isso, geram sérias consequências para a cadeia alimentar e biogeoquímica da região.
As informações da pesquisa, analisadas pelo bolsista Raul Costa, foram coletadas pelos pesquisadores durante um cruzeiro oceanográfico ao longo da Península Antártica, a bordo do navio da Marinha brasileira RV Almirante Maximiano, durante o verão antártico de 2016. O estudo cobriu a área do Estreito de Gerlache, que separa as ilhas de Anvers e Braband da Peninsula Antártica, o Estreito de Bransfield, entre as ilhas Shetland do Sul e a Península, e o Mar Bellingshausen, ao nordeste. Para o bolsista Raul Costa, a bolsa de Iniciação Científica (IC) do CNPq foi muito importante para o trabalho, pois permitiu a ele dedicação exclusiva ao estudo, sem a necessidade de buscar renda extra, o que inviabilizaria todo o processo. "Desenvolver esse tipo de pesquisa, ao menos para um oceanógrafo em formação, é um privilégio. Digo, pois este tipo de trabalho permite expandir muito o conhecimento, abrangendo um maior horizonte científico; isto sem levar em consideração a relevância do estudo, é claro", afirma Raul. O estudo foi desenvolvido no âmbito do projeto INTERações BIOlógicas em ecossisTemas marinhos próximos à Península Antártica sob diferentes impactos de câmbios climáticos (INTERBIOTA), contemplado pela Chamada Nº 64/2013 - MCTI/CNPq/FNDCT-Ação Transversal - Programa Antártico Brasileiro - PROANTAR com o valor global de R$ 1.108.880,00.
O artigo pode ser acessado por meio do link:
https://aslopubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/pdf/10.1002/lno.11437