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Pesquisadores do IF-UFRJ constroem a primeira armadilha de íons do Brasil
O grupo de pesquisadores do Laboratório de Super-Espectroscopia do Rio, LASER, do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), construiu a primeira armadilha de íons do Brasil, que é também a primeira armadilha de Penning da América do Sul. O resultado do trabalho é tema de artigo publicado em maio na Communications Physics, braço de Física da Nature Communications, e pode ser acessado online. As armadilhas de íons representam tecnologia relevante para estudos em Computação Quântica e permitem a realização de medidas de altíssima precisão no magnetismo e massa de partículas, constituindo ferramentas importantes para testes de teorias fundamentais da Física. Os pesquisadores da UFRJ utilizaram variações da técnica de Sublimação de Matriz de Isolamento, desenvolvidas por eles, para produzir e aprisionar ânions, cátions e elétrons frios. A técnica tem aplicações potenciais em física fundamental, em pesquisas com antihidrogênio e para medidas de massa de neutrino, formação molecular em meio interestelar, elétrons polarizados para informação quântica e estudo de homoquiralidade das moléculas biológicas, isto é, pesquisa sobre propriedades que algumas moléculas têm de serem espelho uma da outra. “Seria desejável ter várias dessas armadilhas em grupos de pesquisa no Brasil, uma vez que possibilitam um grande leque de pesquisas e assim é importante termos dado esse passo”, afirma o bolsista de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e professor do IF-UFRJ, Cláudio Lenz Cesar, um dos autores do artigo.
O professor Lenz Cesar explica que há dois tipos de armadilhas para íons: as de Penning, como a construída pelos pesquisadores do IF-UFRJ, e as de Paul. No continente sul-americano, há uma armadilha desse segundo tipo instalada na Argentina. Segundo o professor, a técnica criada pelos pesquisadores brasileiros possibilitará que eles produzam todo tipo de íon, das espécies atômicas às moleculares. “Dessa forma, uma das aplicações que vislumbramos é no estudo de formação molecular em condições de temperatura de meio interestelar para aprender sobre diferentes mecanismos. Como surpresa da técnica, ganhamos um feixe de elétrons sob demanda somente com a aplicação de um potencial elétrico repulsivo em nossa matriz de neônio. Fazendo contas básicas, se colocarmos um campo magnético intenso ao redor da nossa matriz, devemos poder produzir um feixe de elétrons, em baixas energias, com spin polarizado em próximo de 80%”, afirma Lenz Cesar. Um feixe assim, de baixas energias, não existia até quando o grupo do IF-UFRJ submeteu o artigo à Communications Physics.
Para Lenz Cesar, a maior motivação em experimentos do tipo é a de se questionar a natureza sobre o que o professor chama de “grande mistério” para a explicação teórica do nosso Universo, resposta que ainda não temos. O professor se refere ao fato de os cientistas não conseguirem explicar, ainda, por que a matéria, e não a antimatéria, domina o Universo. “Da mesma forma semântica, mas por princípios físicos que podem ser diferentes, que a matéria foi escolhida frente à antimatéria em nosso Universo e não termos uma boa explicação para isso, assim também a biologia ‘escolhe’ uma quiralidade: 19 de 20 aminoácidos naturais têm quiralidade esquerda, enquanto os açúcares têm quiralidade direita. Esse fenômeno está longe de ter uma boa explicação e precisa ser estudado em sua origem microscópica”, diz ele.
O grupo do IF-UFRJ agora se dedica à construção de uma nova versão da armadilha, com acesso óptico e possibilidade de detecção simultânea de cargas positivas e negativas. Essa armadilha permitirá estudos por espectroscopia a laser de íons aprisionados e produção de moléculas em baixas temperaturas, a partir de cátions e ânions frios. O projeto foi apoiado por edital temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). “Esse tipo de pesquisa requer visão e investimento de longo prazo”, ressalta o professor Lenz Cesar. Ele lembra que o investimento do CNPq na manutenção de infra-estrutura do Laboratório de Super-Espectroscopia também auxiliou no resultado final, que permitiu a construção da armadilha de íons por seu grupo de pesquisa. O CNPq também apóia os pesquisadores brasileiros em repasses de recursos à RENAFAE (Rede Nacional de Física de Altas Energias), para cobrir custos de colaboração internacional com o CERN (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear), além de financiar bolsas de Produtividade em Pesquisa para três co-autores e uma bolsa de doutorado para o primeiro autor do artigo. Junto com o professor Cláudio Lenz Cesar, assinam o artigo publicado na Communications Physics os também bolsistas de Produtividade em Pesquisa do CNPq, Wânia Wolff e Daniel de Miranda Silveira, os professores Álvaro Nunes de Oliveira e Rodrigo Lage Sacramento, o bolsista de doutorado do CNPq, Levi Oliveira Araújo Azevedo, e o aluno de mestrado Rodolfo Souza Costa.