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Pesquisadores propõem mecanismos para avaliar a regeneração natural de florestas
A Floresta Amazônica tem passado por um intenso processo de desmatamento e de queimadas que vem destruindo grandes áreas naturais. O impacto dessas alterações tem levado os pesquisadores a discutir dois grandes pontos: o limite da capacidade da Floresta Amazônica de continuar a existir frente a tantas mudanças (o chamado “ponto de não retorno”, a partir do qual não seria mais possível evitar a completa destruição desse Bioma) e, especialmente, a necessidade de restauração de grandes áreas de floresta para evitar que se chegue a esse ponto. Uma das principais estratégias de restauração de florestas é a regeneração natural- que acontece quando se garantem condições para que as florestas voltem a crescer naturalmente após o desmatamento. O baixo custo e o tempo necessário para a total regeneração da floresta são os grandes atrativos dessa estratégia.
Mas como avaliar se a floresta está caminhando de fato para um processo de regeneração? Essa questão movimentou os pesquisadores do Projeto Regenera, do Centro de Síntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos – SinBiose/CNPq, que adaptaram o conceito de Integridade Ecológica para a análise de diferentes estágios da regeneração de florestas tropicais. O resultado dessa análise foi publicado na revista Biological Reviews no início de dezembro (2022).
Milena Rosenfield, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e uma das autoras principais do estudo, destaca a importância de se avaliar as florestas em regeneração (também chamadas de secundárias) à medida em que ela vai crescendo, em cada um dos estágios e cada uma das idades. “A nossa abordagem é muito semelhante à utilizada no controle da saúde das crianças: embora haja necessidade de conhecer as condições físicas e mentais que as crianças devem atingir na idade adulta, é importante para avaliar a trajetória de desenvolvimento e crescimento dessa criança”, explica Milena Rosenfield. Da mesma forma, para avaliar as florestas em regeneração, os pesquisadores identificaram um índice de Integridade Ecológica máxima em cada estágio e idade da floresta.
“A floresta intacta é o máximo de integridade que temos, é uma floresta que nunca teve distúrbio. Até o momento, a forma de avaliar o grau de integridade dos ecossistemas era sempre em comparação com esse ambiente de integridade máxima”, explica Catarina Jakovac, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e vice-coordenadora do projeto Regenera/SinBiose, “o que fizemos foi ampliar o conceito de Integridade Ecológica para incluir as mudanças com relação ao tempo, para sermos capazes de medir essa integridade ao longo do caminho de regeneração dessas áreas”.
Assim, os pesquisadores adicionaram às referências da floresta intacta indicadores de uma trajetória sucessional ótima, isto é, indicadores de diferentes idades ou estágios sucessionais ao longo do processo de regeneração das áreas. Para isso, os pesquisadores do Regenera/SinBiose coletaram dados na região Amazônica e criaram modelos de trajetória ótima para ter valores de referência para esse monitoramento. Dessa forma, é possível avaliar esse processo e inserir práticas de gestão que tenham o potencial de incrementar o processo de regeneração, quando necessário.
Além disso, é possível relacionar esses indicadores de monitoramento da regeneração com os serviços ecossistêmicos da área estudada. “Por exemplo, se há aumento da área basal das árvores presentes na área isso é um indicador de aumento de capacidade de absorção de carbono e, consequentemente, de mitigação de mudanças climáticas”, ressalta Catarina Jakovac. “A classificação da Integridade Ecológica dessas florestas em regeneração é apenas um passo na árvore de decisão para o planejamento do uso do solo e da restauração da paisagem. É importante também considerar a restauração social, legal, fatores econômicos e políticos que influenciam a governança dessas áreas”, acrescenta a pesquisadora.
Fig. 1. (A) Diagrama ilustrando o conceito de integridade ecológica (IE) aplicado a florestas secundárias. Ele mostra a mudança da IE ao longo do tempo e através de diferentes trajetórias sucessionais (faixas verdes) originadas da regeneração das florestas secundárias após corte raso e abandono da área. A faixa verde escura indica a trajetória sucessional ótima que pode ser alcançada em dada região e condições ambientais. Faixas verdes com cores claras representam trajetórias com menores valores de IE. Na porção superior do gráfico (faixa cinza), está indicada a faixa de variação natural da IE observada em florestas maduras de referência que representam o valor máximo potencial da IE que uma área pode alcançar quando ela se torna uma floresta madura. Em (B) mostramos diferentes trajetórias sucessionais que podem surgir devido a limitações à sucessão causadas por limitações ambientais ou de degradação: (1) trajetória sucessional ótima, que acontece quando não há limitações ou impedimentos à sucessão ecológica; (2) flutuações ao longo do tempo que reduzem a taxa de recuperação; (3) desenvolvimento inicial rápido, mas estabilização em uma condição subótima, provavelmente por causa de degradação ou fatores que limitam o crescimento da floresta; e (4) recuperação inicial relativamente rápida, mas seguida de degradação, possivelmente resultante de um distúrbio forte como um surto de uma praga ou uma seca extrema.
Fonte da imagem: Rosenfield, M.F., Jakovac, C.C., Vieira, D.L.M., Poorter, L., Brancalion, P.H.S., Vieira, I.C.G., de Almeida, D.R.A., Massoca, P., Schietti, J., Albernaz, A.L.M., Ferreira, M.J. and Mesquita, R.C.G. (2022), Ecological integrity of tropical secondary forests: concepts and indicators. Biol Rev. https://doi.org/10.1111/brv.12924