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Outubro Rosa: a atenção ao câncer de mama e o impacto da pandemia sobre os números da doença
O câncer de mama é o segundo tipo de câncer de maior incidência no mundo, atrás apenas do câncer de pulmão, conforme aponta a última estimativa mundial sobre a doença, datada de 2018. Segundo o levantamento, no mundo ocorreram, apenas naquele ano, 18 milhões de novos casos da doença e 9,6 milhões de óbitos devido a ela. No caso do Brasil, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), a estimativa para cada ano do triênio 2020-2022 é que ocorram 625 mil novos casos de câncer. Desse total, a previsão é de que sejam detectados 66 mil casos de câncer de mama a cada ano desse intervalo de tempo, alçando esse tipo da doença ao segundo lugar entre as variedades de câncer que mais afetam a população no país. Esse valor corresponde a um risco estimado de 61,61 novos casos a cada 100 mil mulheres. O prognóstico para o câncer de mama no Brasil fica atrás apenas dos números previstos para o câncer de pele não melanoma, que afeta 177 mil pessoas por ano. Entre a população feminina diagnosticada com câncer, o de mama afetará a parcela de 29,7% do total.
Embora os especialistas apontem que o mapa na distribuição de casos de câncer no mundo esteja mudando – a incidência de alguns tipos de câncer tem variado segundo o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos países e o desenvolvimento da doença também tem sido influenciado por fatores como sedentarismo e alimentação inadequada - as taxas de câncer de mama nas mulheres predominam independente do IDH. A coleta de dados sobre essa variedade de câncer e informações sobre o tratamento dos pacientes com a doença foram prejudicados pelo impacto da pandemia de COVID-19, que impôs desafios sem precedentes a pacientes e a profissionais de saúde. Ainda que o real impacto da pandemia seja pouco conhecido no momento, estudos recentes já demonstraram que as suspensões temporárias de tratamento durante a pandemia influenciaram o rastreamento do câncer de mama. Ademais, a interrupção de ensaios clínicos e os atrasos na terapia de pacientes com esse tipo de câncer têm colaborado de forma negativa para a morbidade e para a sobrevida desses pacientes. “As necessidades de medicina de emergência e cuidados intensivos durante a pandemia de COVID-19 forçaram uma interrupção repentina e dramática dos programas de triagem e tratamento do câncer de mama em todo o mundo”, afirma a bolsista de Produtividade em Pesquisa (PQ) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/MCTI) e professora do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Ana Katherine Gonçalves de Oliveira .
Pesquisadores alertam para o impacto da pandemia de COVID-19 nos cuidados relacionados ao câncer de mama: suspensão de tratamentos e ações de prevenção e diagnóstico
Segundo a pesquisadora, fatores sociais, econômicos, culturais e étnicos também estão na origem do impacto da epidemia de COVID-19 sobre a prevenção e o tratamento de mulheres com câncer de mama ao redor do mundo. Pacientes negras, latinas e com baixo nível socioeconômico enfrentaram disparidades significativas nos estágios de apresentação, de tratamento cirúrgico e de mortalidade por câncer de mama durante a pandemia. Nesse período, acentuaram-se os atrasos no tempo para a cirurgia entre os pacientes vulneráveis como os desses três grupo, fato que motivou o Colégio Americano de cirurgiões a recomendar a incorporação da coleta de determinantes sociais da saúde à prática clínica, com vistas à melhor compreensão do impacto da pandemia sobre as disparidades raciais e étnicas no manejo cirúrgico. Além de pesquisas que avaliem resultados específicos de raça e de nível social, e da educação dos profissionais e dos provedores de saúde sobre essas desigualdades, uma estratégia mencionada pelos especialistas para combater esse quadro seria se conceder melhor acesso à telessaúde, à manutenção de programas de navegação das pacientes e à educação das pacientes sobre a segurança e a necessidade de inscrição em ensaios clínicos.
Um dado positivo é o fato de o tratamento do câncer de mama estar avançando de forma significativa, tanto em relação aos métodos de abordagem cirúrgica, quanto em relação às técnicas de radioterapia e ao tratamento sistêmico da doença. Hoje se sabe que o câncer de mama pode ser dividido em inúmeros subtipos, diferenciados por conterem receptores de estrogênio ou de progesterona, ou mesmo os dois juntos. Ao permitir a identificação dos subtipos, assim, o conhecimento atual sobre a diversidade molecular do câncer de mama possibilita o desenvolvimento de terapias capazes de atuar em alterações genéticas que impulsionam esses subtipos de câncer. De acordo com o bolsista de Produtividade em Pesquisa (PQ) do CNPq e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), Daniel Guimarães Tiezzi , a utilização da biópsia líquida também corresponde a um grande avanço tecnológico no diagnóstico do câncer de mama. O método detecta componentes derivados do tumor em biofluidos de pacientes. “A depender do componente biológico a ser analisado, informações genômica, epigenética, transcriptômica, proteômica, etc podem ser obtidas da neoplasia primária e de sítios metastáticos por meio de amostragem minimamente invasiva”, diz o professor. Dessa forma, a tecnologia da biópsia líquida pode ser aplicada ao diagnóstico de recorrência sistêmica da doença e também na detecção de novas mutações, que podem ocorrer durante a progressão da doença. Algumas dessas mutações são relevantes fatores de predição de resposta aos tratamentos-alvo.
Além dos tratamentos com hormonioterapia e com as terapias-alvo, a terapêutica para combater o câncer de mama pode ser feita também por meio de cirurgia e de radioterapia. Aliado a técnicas de cirurgia plástica, o tratamento cirúrgico busca a minimização dos danos. Na área da radioterapia, as novas técnicas de hipofracionamento de dose permitem o tratamento em curtos períodos de tempo. O professor Daniel Tiezzi salienta que, dessa forma, o serviço é otimizado, de uma forma geral, e os gastos com o transporte dos pacientes é reduzido. A professora Ana Katherine de Oliveira explica que os exames de imagem, como a mamografia e a ultrassonografia, são os mais utilizados para a detecção precoce do câncer de mama. Em anos recentes, os especialistas também tem usado a ressonância magnética da mama e buscado novas tecnologias, como a mamografia 3D, conhecida pelo nome de tomossíntese mamária. Esse procedimento tira imagens de diferentes ângulos ao redor da mama e as constrói em uma imagem semelhante, em 3-D. Todos esses métodos de rastreamento, contudo, são considerados de prevenção secundária, não tendo capacidade para diminuir a incidência populacional da doença ou o risco pessoal de se desenvolver a doença. “A utilização da mamografia, por exemplo, de rastreamento impacta na mortalidade populacional e não na incidência da doença”, comenta o professor Daniel Tiezzi.
Para ele, a prevenção primária do câncer de mama pode ser aplicada e existem duas situações em que é importante citá-la. A primeira delas, ressalta o professor, é a utilização de métodos de redução de risco, indicados para mulheres consideradas de alto risco. Essa primeira opção envolve desde métodos farmacológicos, em que são utilizados medicamentos e método cirúrgico, como a mastectomia, com o objetivo de reduzir o risco de a paciente vir a desenvolver a doença. Mulheres sem alto risco para câncer de mama não podem ser submetidas a esse tratamento. A segunda situação para a prevenção do câncer de mama, por sua vez, diz respeito a mudanças de estilo e hábitos de vida. “Alguns dos fatores estão associados com o padrão reprodutivo como a oligo ou nuliparidade, gestação em idade mais avançada, com hábitos de vida como a falta de atividade física regular, ingestão de álcool e obesidade ou mesmo o uso de hormônios como forma de terapia de reposição”, afirma o professor Daniel Tiezzi. Ele observa que todos esses fatores se encontram associados de forma estreita ao desenvolvimento socioeconômico. A incidência da doença em países desenvolvidos é muito maior que a encontrada em áreas rurais de países em desenvolvimento. Ainda segundo o professor Tiezzi, uma das formas de se combater esses fatores comportamentais e socioambientais relacionados ao aumento do risco para câncer de mama são a manutenção do peso adequado, a prática de atividades físicas regulares e a baixa ingestão calórica. “Embora sejam medidas simples, elas são de difícil aceitação pela população em geral, pois vão de encontro com as necessidades pessoais e populacionais para o desenvolvimento econômico atual”, completa ele.
O professor também salienta que a gestação como uma forma de prevenção ao câncer de mama apenas é eficaz se a mulher leva uma ou mais gestações a termo até os 23-34 anos de idade. No Brasil, dados disponibilizados pelo INCA indicam que a incidência de câncer de mama entre o sexo feminino ocupa a primeira posição todas as regiões geográficas brasileiras, com um risco estimado de 81,06 por 100 mil na Região Sudeste; de 71,16 por 100 mil na Região Sul; de 45,24 por 100 mil na Região Centro-Oeste; de 44,29 por 100 mil na Região Nordeste; e de 21,34 por 100 mil na Região Norte, .esta última que é a única região do país onde as taxas de câncer de mama e colo do útero se equivalem entre as mulheres.