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CNEN inicia projeto conceitual em dessalinização nuclear em colaboração com a Marinha e universidades
A combinação de esforços entre a Marinha do Brasil, Universidades e a CNEN apresenta um histórico de projetos de sucesso, como o domínio do processo de enriquecimento de urânio. Essa parceria deve agora ser repetida no desenvolvimento de um projeto nacional em dessalinização nuclear para fazer face à necessidade de se garantir simultaneamente seguranças energética, hídrica e alimentar. Para tanto, o projeto conceitual de um reator de pequeno porte da geração GIII+ tendo como ponto de partida o LABGENE, combinado a diferentes sistemas de dessalinização, foi iniciado com o envolvimento dos institutos de pesquisa da CNEN, a Marinha e Universidades brasileiras, a partir da colaboração em rede de pesquisadores especializados nessa área. O Termo de Referência foi encaminhado ao Ministério de Ciência, Tecnologia Inovações e Comunicações, que o enviará para a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP).
A segurança hídrica é uma preocupação em todo o mundo. No Brasil, especificamente, a recente redução no nível de reservatórios que abastecem grandes cidades e a existência de regiões onde a seca inibe o desenvolvimento, tornaram este tema alvo de muitos estudos, debates e projetos.
Uma das alternativas mais viáveis está nos processos de dessalinização para obtenção de água potável, aplicados atualmente em cerca de 150 países. Neste universo, se destacam Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Catar, Barein e Omã, que obtêm cerca de 90 % da sua água potável através de processos de dessalinização. Juntos, estes países produzem cerca de 45 % de toda a água dessalinizada no mundo. O Brasil possui apenas uma usina de dessalinização, localizada em Fernando de Noronha. Também há projetos em andamento em outros estados, como Ceará, Pernambuco e Bahia.
No quadro geral da atividade de dessalinização no mundo, uma parcela significativa ocorre com utilização de reatores nucleares. O processo já é adotado em países como Canadá, Rússia, Paquistão e Argentina. Para a CNEN, este seria um caminho viável e econômico de resolver a escassez de água em nível nacional, já que o Brasil é o país com a sexta maior reserva de urânio, que serve como combustível para reatores nucleares, e tem autonomia no seu enriquecimento e na produção dos elementos combustiveis.
Vale destacar que desde a década de 70 o Brasil opera reatores nucleares de potência, tendo reconhecido domínio nesta área e também na produção de combustível nuclear. Além disso, é notório o domínio brasileiro da tecnologia de evaporação industrial no setor álcool-açucareiro, assim como de pesquisas em evaporação, osmose reversa e membranas nanoestruturadas, relacionadas às principais técnicas de dessalinização.
O grupo de trabalho que estruturou a proposta destaca que um reator nuclear conjugado a um sistema de dessalinização serviria tanto para abastecimento hídrico quanto de eletricidade. O calor gerado na reação nuclear seria parcialmente aproveitado para geração de eletricidade e parcialmente empregado, com melhor aproveitamento do calor residual, no processo de dessalinização. Em direta conexão à ideia de construção de um reator com este perfil, propõe-se a criação, em torno do empreendimento, de um parque agroindustrial abastecido pela eletricidade gerada; e também o desenvolvimento de atividades agrárias que possam ser irrigadas com excedentes de água da região, a partir da garantia do abastecimento da população e de determinados processos com a água dessalinizada produzida.
Nas próximas décadas, certamente a energia nuclear deverá desempenhar papel crescente e importante na produção de eletricidade e também na dessalinização da água, para suprir a necessidade crescente de suprimento de água potável no mundo. Para países em desenvolvimento, pequenas usinas modulares apresentam-se como solução interessante para a produção simultânea de eletricidade e água dessalinizada.
Apenas como ilustração e de forma simplificada, um reator de pequeno porte, com cerca de 75MW(t) e 25MW(e), a máxima energia gerada seria de cerca de 540.000 KWh/dia. Considerando um limite máximo de energia para dessalinização de 3KWh/m3, tem-se 160.000 m3/dia de produção de água dessalinizada. Supondo-se um consumo de água por pessoa de 3,3 m3/mês, ou seja, 110 litros/dia, o número máximo de pessoas atingidas chega a 1.400.000.
Do acima exposto pode-se concluir que mesmo um reator de pequeno porte, com origem no projeto autóctone LABGENE da Marinha do Brasil, pode se constituir numa solução tecnica e economicamente interessante no desenvolvimento de um sistema de dessalinização nuclear nacional, capaz de ajudar o País a atingir as almejadas seguranças hídrica, energética e alimentar em regiões critica e tradicionalmente afetadas.