Tendências/debates: Instituição consolidada
Veículo: Folha de S. Paulo
Data: 31 de outubro de 2014
Quando, no primeiro dia de governo, em 2003, o presidente Lula enviou ao Congresso a medida provisória 103 (atual lei nº 10.683), que, entre outras medidas, criava a CGU (Controladoria-Geral da União), poucos apostariam que esse novo órgão se tornasse uma das mais reconhecidas instituições de defesa do Estado, do patrimônio público e da transparência na gestão pública.
Doze anos depois, ao nos aproximarmos do fim de mais um período de governo, é o momento para uma reflexão sobre o que isso representou e o que ainda importa garantir e fazer avançar.
A CGU é hoje uma instituição consolidada, com status de ministério e plena autonomia, que atua ao lado de outros organismos --Ministério Público, Polícia Federal, Tribunal de Contas da União--, alguns deles de existência centenária.
Apesar de sua curta história, encontra-se enraizada na sociedade de forma a não permitir retrocessos. Isso se deve às lacunas que veio preencher: fazia falta um órgão incumbido do controle interno federal, com a função de supervisionar a fiscalização primária a cargo de cada ministério, seja sobre suas próprias despesas, seja sobre os recursos repassados a Estados e municípios.
Fazia falta também um órgão que fosse capaz de processar e punir servidores públicos envolvidos em ilícitos e empresas que fraudassem licitações e contratos; um órgão impulsionador de medidas de transparência para dar visibilidade às despesas, salários, contratos, convênios e até mesmo relatórios das fiscalizações. Fazia falta, enfim, um órgão que estimulasse o cidadão a participar dessa vigilância.
Por isso, veio a CGU.
Mais tarde, porém, a essas funções outras se acrescentaram. Veio o controle do nepotismo e dos conflitos de interesse; a gestão do sistema de acesso à informação; a pesquisa prévia às nomeações; a lei que pune as empresas corruptoras e que induz à prevenção do suborno com a colaboração das próprias empresas.
Com essa institucionalidade e mediante ação articulada, os últimos governos puderam, na defesa do Estado brasileiro, expulsar dos seus quadros cerca de 5.000 agentes públicos culpados, proibir de contratar com entes públicos mais de 4.000 empresas e cerca de 2.500 ONGs flagradas em atos ilícitos.
Isso apenas na esfera administrativa, sem depender de processo judicial. Nesta última esfera, o Ministério Público tem ajuizado milhares de ações criminais ou de improbidade administrativa. A Polícia Federal tem efetuado centenas de operações e milhares de prisões e condenações já têm ocorrido.
Não se ignoram as dificuldades próprias de qualquer processo de crescimento, sobretudo de um órgão novo com funções que não são praticadas tradicionalmente no país. Não se ignora também o quanto ainda é preciso avançar.
Em alguns momentos se fez necessário reordenar prioridades e remanejar recursos de alguns programas para outros, em razão de restrições orçamentárias conjunturais que afetaram o governo recentemente. Isso, somado às novas atribuições e à determinação do governo para que todas as denúncias sejam apuradas, exige grande esforço das equipes da Controladoria. E põe à prova a enorme dedicação e competência dos seus quadros, compostos de servidores de carreira, profissionais de alto nível e do mais elevado espírito público.
É assim que a CGU está conseguindo atuar em diversas frentes investigativas, como na Petrobras, incluindo casos como o da refinaria de Pasadena (EUA), da SBM Offshore, da Transpetro e da Petrobras Biocombustíveis.
É essa a instituição que se construiu e se consolidou nesses 12 anos. E que há de continuar a crescer e prestar grandes serviços ao Brasil.
---
JORGE HAGE, 76, é ministro-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU)