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Nota de Esclarecimento
Reportagem sobre transparência no Governo Federal
Em relação à matéria publicada pela Revista Veja nesta sexta-feira, dia 22/4, sob o título “Só daqui a 100 anos: aumenta a lista de sigilos do governo Bolsonaro”, a Controladoria-Geral da União (CGU) informa que foi procurada pela reportagem e enviou, ao veículo, de forma clara e detalhada todos os esclarecimentos relativos à Controladoria solicitados pela revista.
No entanto, parte das informações enviadas pela CGU que são necessárias para o verdadeiro esclarecimento dos fatos sobre a transparência no governo federal não foi utilizada pela reportagem. Diante desse cenário, a Controladoria publica, abaixo, a íntegra das perguntas feitas pela reportagem, bem como a resposta enviada a eles pelo órgão.
DEMANDA ENVIADA PELA REVISTA VEJA À CGU, NA TERÇA-FEIRA, DIA 19 DE ABRIL:
Caros, boa tarde
Na nossa próxima edição, teremos uma reportagem sobre casos de falta de transparência no atual governo. Vamos citar como exemplo os decretos de 100 anos de sigilo sobre visitas ao Palácio do Planalto do senador Flávio Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro, de Valdemar Costa Neto e dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura.
Vamos também abordar a queda na média de acessos concedidos a dados requisitados via Lei de Acesso a Informação (LAI): em 2020, a média caiu a 58% de acesso totalmente concedido, a pior desde a implementação na lei. Em 2021 foi concedido acesso total a 68% dos pedidos, ainda abaixo da média até 2019. Falaremos também no atraso na divulgação de dados de desmatamento em novembro de 2021, e a tentativa de mudar a metodologia de divulgação de dados sobre a pandemia de covid-19 em junho de 2020.
Outro ponto que concerne a CGU é a edição da Medida Provisória 928, em 2020, que suspendia prazos de resposta a pedidos via LAI e restringia seus mecanismos de acesso a informação -- assinada pelo ministro Wagner Rosário, e que foi apontada como inconstitucional.
Todos esses pontos são apontados por especialistas ouvidos por VEJA como exemplos da falta de transparência no governo.
A CGU gostaria de se posicionar sobre esse assunto?
Se sim, podem responder nesta terça-feira, 19, por favor?
Desde já, obrigado
RESPOSTA ENVIADA PELA CGU À REVISTA VEJA, NA QUARTA-FEIRA, DIA 20 DE ABRIL
INTRODUÇÃO
A Política de Acesso à Informação no âmbito do Poder Executivo Federal deve ser analisada de forma sistêmica, respeitando-se os dispositivos legais vigentes. Importante destacar que a Lei 12.527/11, em seus Art(s). 15 e 16, prevê a existência de recursos para as situações de negativa de acesso à informação. Ou seja, para considerarmos que houve negativa definitiva de acesso à informação no âmbito do Governo Federal é necessário verificar se a negativa foi confirmada nas 4 instâncias previstas em Lei, a saber: (i) autoridade hierarquicamente superior à que denegou inicialmente o pedido de acesso; (ii) autoridade máxima do órgão ou entidade recorrido; (iii) Controladoria-Geral da União (CGU); e, (iv) Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI).
Além do acima exposto, verifica-se que algumas situações possuem sigilo específico, o que por óbvio impede o fornecimento de informações ao cidadão, visto que a concessão geraria o descumprimento de uma norma legal. Vale neste ponto transcrever os incisos II e III do Art. 6º, o Art. 22, e o caput e o § 1º do Art. 31 da LAI:
Art. 6º Cabe aos órgãos e entidades do poder público, observadas as normas e procedimentos específicos aplicáveis, assegurar a:
II - proteção da informação, garantindo-se sua disponibilidade, autenticidade e integridade; e
III - proteção da informação sigilosa e da informação pessoal, observada a sua disponibilidade, autenticidade, integridade e eventual restrição de acesso.
Art. 22. O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.
Art. 31. O tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais.
§ 1º As informações pessoais, a que se refere este artigo, relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem:
I - terão seu acesso restrito, independentemente de classificação de sigilo e pelo prazo máximo de 100 (cem) anos a contar da sua data de produção, a agentes públicos legalmente autorizados e à pessoa a que elas se referirem; e
II - poderão ter autorizada sua divulgação ou acesso por terceiros diante de previsão legal ou consentimento expresso da pessoa a que elas se referirem.
Em linhas gerais, é importante mencionar que houve queda nas médias histórica de negativas de acesso à informação com base em proteção a informações pessoais, evidenciando que não houve impacto na LGPD nas respostas da LAI, conforme gráfico abaixo com dados do Painel da LAI (Motivos para negativa de acesso):
Assim sendo, seguem as respostas específicas acerca das situações relatadas em seu pedido.
SITUAÇÃO 1 - Na nossa próxima edição, teremos uma reportagem sobre casos de falta de transparência no atual governo. Vamos citar como exemplo os decretos de 100 anos de sigilo sobre visitas ao Palácio do Planalto do senador Flávio Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro, de Valdemar Costa Neto e dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura.
Conforme já explanado inicialmente, não se pode dizer que houve negativa de acesso à informação pelo Governo Federal antes de finalizadas as instâncias recursais. Vale ressaltar que todas as informações de acessos de visitantes ao Palácio do Planalto vêm sendo concedidas pelo Governo Federal. É falsa a afirmação de que os dados não foram concedidos. As entradas dos pastores foram entregues ao solicitante nas instâncias internas do próprio órgão. Sendo que o caso do Sr. Valdemar Costa Neto está em análise no âmbito da CGU (3ª instância).
Já em relação ao caso concreto de classificação de informações referentes à família do Presidente, esta se deu por determinação do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), face ao risco de mapeamento de rotinas, horários e hábitos dos familiares do Presidente, uma vez que o referido pedido incluía até mesmo as visitas da filha menor de idade do mandatário.
A classificação da informação, nestes casos, foi feita com base no inciso VII do artigo 23 e no § 2º do Art. 24 da LAI e vale apenas até o fim do mandato presidencial . Não há que se falar, portanto, em sigilo de 100 anos, como de maneira inverídica vem divulgando a mídia em geral.
Segue a previsão legal acima especificada:
Art. 23. São consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de classificação as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possam:
VII - pôr em risco a segurança de instituições ou de altas autoridades nacionais ou estrangeiras e seus familiares; ou
Art. 24. A informação em poder dos órgãos e entidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada.
§ 2º As informações que puderem colocar em risco a segurança do Presidente e Vice-Presidente da República e respectivos cônjuges e filhos(as) serão classificadas como reservadas e ficarão sob sigilo até o término do mandato em exercício ou do último mandato, em caso de reeleição.
SITUAÇÃO 2 - Vamos também abordar a queda na média de acessos concedidos a dados requisitados via Lei de Acesso a Informação (LAI): em 2020, a média caiu a 58% de acesso totalmente concedido, a pior desde a implementação na lei. Em 2021 foi concedido acesso total a 68% dos pedidos, ainda abaixo da média até 2019. Falaremos também no atraso na divulgação de dados de desmatamento em novembro de 2021, e a tentativa de mudar a metodologia de divulgação de dados sobre a pandemia de covid-19 em junho de 2020.
Com relação à análise realizada pela Revista Veja sobre a suposta queda na média de acessos concedidos a dados requisitados via Lei de Acesso à Informação (LAI), avaliamos que as informações constantes do Painel da LAI demonstram que essa conclusão está incorreta.
Segundo a apuração da reportagem, “em 2020, a média [de acessos concedidos] caiu a 58% de acesso totalmente concedido , a pior desde a implementação na lei. Em 2021 foi concedido acesso total a 68% dos pedidos, ainda abaixo da média até 2019.”
Sobre os temas, os dados do Painel da LAI demonstram que a média histórica de pedidos de acesso à informação concedidos é de 68,42% (período entre 2012-2022) e que em 2021 o percentual de pedidos concedidos foi de 68,43%, portanto dentro da média histórica. Esse é o parâmetro adequado para se analisar as decisões sobre os pedidos de acesso à informação, pois se refere ao período total de vigência da lei.
O gráfico a seguir demonstra a média histórica (em vermelho) e como as decisões de concessão de acesso variaram ao longo dos anos.
Com relação ao ano de 2020, em que a apuração da reportagem afirma que foi o pior número desde a vigência da lei, em termos de concessão de acesso à informação, avalia-se que os dados sobre os tipos de decisão de atendimento precisam ser analisados em conjunto.
Isso porque as informações percentuais medem, no caso, o número de decisões de concessão de informação relativamente ao conjunto total de decisões. Se em 2020 o percentual de decisões de concessão de acesso foi relativamente menor, isso implica que outro(s) tipo(s) de decisão tiveram acréscimo. E essa avaliação é necessária para se compreender se o percentual de concessão de acessos em 2020 é um indicador de problema no atendimento e cumprimento da LAI.
De fato, analisando os tipos de decisão de acesso à informação em 2020, e comparando-se com os anos anteriores desde a vigência da LAI (2012 a 2019), verifica-se que houve um acréscimo acentuado no número de indeferimentos por não se tratar de uma solicitação de informação. Esse acréscimo representou um aumento de quase 200% nos indeferimentos por não se tratar de uma solicitação de informação, o que levou proporcionalmente a uma redução percentual dos demais tipos de decisões, inclusive, a decisão pela concessão de acesso à informação.
Ou seja, não temos como conceder uma informação se, por exemplo, o cidadão fez uma reclamação sem solicitar nenhum dado ao Governo Federal.
Como efeito de número, apenas a título de exemplo, também verifica-se diminuição quanto aos indeferimentos por negativa de acesso (Acesso negado) em 2020, se comparado com o período entre 2012 e 2019; já quanto às concessões parciais, verifica-se que houve também uma diminuição desse tipo de decisão quando compara-se 2020 e o período entre 2012 e 2019.
O gráfico a seguir espelha a situação verificada.
SITUAÇÃO 3 - Outro ponto que concerne a CGU é a edição da Medida Provisória 928, em 2020, que suspendia prazos de resposta a pedidos via LAI e restringia seus mecanismos de acesso a informação -- assinada pelo ministro Wagner Rosário, e que foi apontada como inconstitucional.
A Medida Provisória nº 928/2020 não suspendeu o atendimento à Lei de Acesso à Informação (LAI). Ela apenas determinou que, em duas situações específicas e excepcionais, os prazos de atendimento a pedidos poderiam ser suspensos.
Nesse aspecto, cabe lembrar que a LAI prevê como conduta ilícita recusar-se a fornecer informação requerida nos termos desta Lei, bem como retardar deliberadamente o seu fornecimento, dentre outras situações previstas no Art. 32. Vale ressaltar ainda que a caracterização dessas irregularidades pode gerar a demissão do serviço público, além da responsabilização do agente por Improbidade Administrativa.
Dessa maneira, segundo o texto da MP nº 928/2020, constituiriam casos passíveis de suspensão de prazos da LAI, as seguintes situações:
(a) quando a informação só pudesse ser obtida mediante acesso físico ao local de trabalho, e nenhum agente público da área responsável pela produção da resposta tivesse como acessá-lo em função de medida preventiva como quarentena ou isolamento por teletrabalho; ou
Obs 1 - Como um funcionário impedido de adentrar ao órgão público poderia acessar fisicamente os arquivos da instituição para cumprir os prazos da lei? Criaria-se uma exceção ao cumprimento de normas sanitárias para que servidores públicos pudessem ir ao local de trabalho?
Obs 2 - Observe que não existia suspensão de prazos para documentos existentes em sistemas eletrônicos.
Obs 3 - A norma era clara e afirmava que a suspensão só existiria caso todos os servidores estivessem impedidos de adentrar às instalações públicas. Se apenas um único servidor pudesse ir fisicamente ao local de trabalho não se aplicaria a suspensão dos prazos.
(b) quando a produção da resposta de pedido de acesso a informação exigisse a participação de agente público ou setor direta e prioritariamente envolvido com as medidas de enfrentamento da situação de emergência, resultando em comprometimento do trabalho desenvolvido para o combate à Covid-19.
Obs 1 - A Lei de Acesso à Informação é uma lei nacional, aplicável à União, Estados e Municípios.
Obs 2 - Não sabíamos quais seriam as consequências da pandemia, e principalmente quais seriam estas consequências na realidade de uma prefeitura do interior em que todos os funcionários de uma secretaria de saúde poderiam ser alocados em um hospital para tratamento de pacientes acometidos pelo vírus. Outra hipótese era a solicitação de informações a um hospital público, onde todos os servidores daquele hospital poderiam estar mobilizados para o atendimento de pacientes acometidos pelo COVID 19. Como a lei prevê sanções duras para o seu descumprimento, precisávamos prever essa possibilidade na Medida Provisória.
Assim sendo, a possibilidade de suspensão de prazos administrativos relacionados ao direito de acesso à informação no Brasil, em situações específicas e justificadas, não teve por objetivo suprimir direitos e garantias dos cidadãos, mas sim adequar a norma ao contexto excepcional imposto pela pandemia face aos desafios ainda desconhecidos à época.
Nesse sentido, agiu o país de acordo com as melhores práticas internacionais, inclusive com a Declaração “Acesso à Informação no contexto da pandemia global de COVID-19”, da Conferência Internacional de Comissários de Acesso à Informação (ICIC), maior fórum global de instituições garantidoras do direito de acesso à informação, que assim se pronunciou em 14 de abril de 2020: “Como uma comunidade global, reconhecemos que os recursos possam ser redirecionados dos esforços de manutenção dos direitos de acesso à informação. Organizações públicas irão acertadamente focar os seus recursos na proteção da saúde pública, e reconhecemos nosso papel em termos uma abordagem programática, por exemplo acerca do quão rapidamente órgãos públicos conseguirão responder a pedidos de acesso”. (disponível em: https://www.informationcommissioners.org/covid-19/ ).
No estabelecimento de condições específicas e extraordinárias para a suspensão de prazos, o Brasil mostrou-se extremamente cuidadoso com o impacto possível de tal medida no exercício regular do direito de acesso à informação. Segundo o relatório “Transparencia, el acceso a la información y la protección de datos personales ante la emergencia sanitária COVID-19” , produzido pelo Programa da União Europeia para Coesão Social na América Latina, como fruto da declaração de estado de emergência, Bolívia, Argentina, El Salvador, França, México, Panamá, Peru e República Dominicana decretaram a suspensão dos prazos administrativos como um todo, repercutindo na impossibilidade completa do exercício do direito de acesso à informação pela via passiva naqueles países. (disponível em https://redrta.org/wp-content/uploads/2021/05/HERRAMIENTA_46-Transparencia-el-acceso-a-la-informacion.pdf )
Ou seja, é um absurdo a afirmação de que uma medida racional e excepcional tinha por intuito restringir direitos. A CGU e o Governo Federal foram bastante cuidadosos na escrita da norma, sendo que a motivação para a adaptação normativa foi clara e coerente, sendo triste e inconcebível a decisão de inconstitucionalidade da norma.
CONCLUSÃO
Incentivamos, para a correta informação da população, que a REVISTA VEJA continue a manter esta interlocução com o Governo Federal, para que as informações divulgadas possam trazer a verdade dos fatos a todos os cidadãos.