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Discurso do Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, na cerimônia alusiva ao Dia Internacional contra a Corrupção
Excelentíssimo senhor Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal,
Companheiros ministros do meu governo, Jorge Hage, do Controle e da Transparência; Tarso Genro, da Justiça; Juca Ferreira, da Cultura; Patrus Ananias, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; Márcia Bassit, interina da Saúde; general Jorge Armando Félix, do Gabinete de Segurança Institucional; e Luís Inácio Lucena, advogado-geral da União,
Meu caro procurador-geral da República, Roberto Monteiro Gurgel,
Meu caro presidente do Tribunal de Contas da União, Ubiratan Aguiar,
Meu caro corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp,
Senhor Bo Mathiasen, representante do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime para o Brasil e Cone Sul,
Meu querido amigo Maurício de Sousa,
Eu, na verdade, Jorge Hage, não precisaria falar mais, por conta da boa apresentação que você fez e dos bons pronunciamentos. A frase que resume tudo é aquele menininho que disse que todo mundo tem a chance de ser um cara legal. Não é? Poderia ficar resumido naquilo. Se a imprensa não colocasse nada mais, só colocasse aquele menininho falando: “ser honesto torna a pessoa um cara legal” já seria muito importante.
Mas eu queria, Jorge, dizer para você o seguinte: o meu discurso, certamente, teve a tua orientação para a minha “fábrica de discursos”. Eu tenho uma “fábrica de discursos”. Então eu, na verdade... (risos) não, porque é assim no governo, os caras orientam o discurso, mas depois eles fazem o discurso que eles orientaram (risos). Então... bem, eu não vou... portanto, eu não vou ler o discurso, para ganhar um pouco de tempo.
Eu só queria dizer para vocês que essa lei que eu assinei agora, e espero que o Congresso Nacional discuta e aprove, ela envolve todas as instâncias da República Federativa do Brasil: é o Poder Judiciário, é o Ministério Público, é o Tribunal de Contas da União, são os ministros, o presidente, o vice-presidente. Pode ser que não resolva, mas se o Congresso aprovar, pelo menos a gente começa a passar para a sociedade que não existe a ideia da impunidade, porque o que leva o povo inteiro, e se fizer uma pesquisa, vai dar 90% achando que tem impunidade, é que ele percebe que um cara que rouba um pãozinho vai preso e um cara que rouba 1 bilhão não vai preso. Isso está muito forte na cabeça das pessoas. E aquele documentário mostrado pelas Nações Unidas aqui, do que poderia ser feito no mundo e no País com o dinheiro que é desviado...
Vamos pegar a nossa crise econômica, para ver o que aconteceu. Vamos analisar corretamente o crime que o sistema financeiro internacional cometeu com a Humanidade. Quantos bilhões de dólares os cofres públicos dos países ricos tiveram que colocar no sistema financeiro, que quebrou por especulação, sem gerar emprego, sem gerar distribuição de renda, e o dinheiro que faltou para ajudar os países pobres do mundo apareceu para salvar os banqueiros que tinham quebrado os Estados? Se nós não aumentarmos a punição para essa gente, nós vamos continuar enchendo as cadeias de pobres e vamos continuar vendo a corrupção correr solta no mundo.
E essa proposta da lei, viu, Tarso e Jorge, eu vou levar para o G-20. Vou levar para o G-20, porque ou nós atacamos verdadeiramente... O que é o paraíso fiscal, senão uma corrupção? O que é a existência de paraísos fiscais, que não um processo de corrupção de alguém que não quer pagar os seus impostos adequadamente? E as pessoas não querem discutir isso, porque aí você está mexendo com interesses de gente, como diria o Zeca Pagodinho, que tem bala na agulha, de gente que tem café no bule. Você não está mexendo com o baixo clero. Você está mexendo com o alto clero, quando você toma uma atitude como essa.
Então, eu acho, viu, Jorge... Primeiro, eu fico muito feliz com o trabalho que a CGU vem fazendo. Eu, sinceramente, sou um homem que posso terminar o meu mandato, daqui a um ano, agradecendo o trabalho que está sendo feito neste país, e sempre que a gente faz muito, ainda falta muito para fazer. A contribuição que o Ministério Público dá, a contribuição que o Tribunal de Contas dá, a contribuição extraordinária que a Polícia Federal dá, a contribuição que a CGU dá, acho que não tem país no mundo que tenha um sistema de fiscalização que tem o Brasil.
Eu digo para vocês, de outros países, que muitas vezes a corrupção não aparece,em muitos países, porque não há investigação. A corrupção... se o aparelho do Estado e todas as suas estruturas fossem um corpo humano – o Poder Judiciário, o Ministério Público, o Tribunal de Contas, o Parlamento, o Executivo, os ministros –, se nós fôssemos um corpo humano, nós precisaríamos fazer check-up todos os anos, porque somente fazendo check-up é que você consegue antever uma coisa grave ou descobrir uma coisa grave. Por isso que é importante o processo de investigação. Você veja uma coisa: eu faço check-up todos os anos, Jorge. Todos os anos eu faço check-up. Check-up, também, não é coisa para qualquer um. É coisa para gente mais chique. Este ano eu não fiz. Eu não fiz porque o José Alencar está com problema de saúde, a Dilma teve o problema dela. Eu falei: pô, se eu fizer e der alguma coisa também, a República está desgraçada. Aí eu falei para o meu médico: olha, vamos esperar, eu faço em janeiro. A Dilma já sarou. O José Alencar tem uma notícia extraordinária, que surpreendeu os mais otimistas: o tumor dele já diminuiu 60%. É uma coisa extraordinária, que eu não sei se existe explicação só científica para isso. O José Alencar já está até pensando em ser candidato nas eleições de 2010. Eu nunca vi tanta vitalidade. Então, eu me guardei, para fazer em janeiro o meu check-up. Se der alguma coisa, sou só eu. Senão, era a República inteira.
Mas então, eu acho que o trabalho que nós estamos fazendo é quase que fazer check-up, porque a corrupção é uma coisa difícil de descobrir. Às vezes, o corrupto é o cara que tem a cara mais de anjo, é aquele cara que mais fala contra a corrupção, é aquele cara que mais denuncia, porque ele acha que ele não vai ser pego. Esse é o problema da bandidagem: é que o cara acha que sempre vai dar no outro e ele vai sair impune, e de vez em quando a arapuca pega o seu passarinho, de vez em quando as pessoas são pegas.
Eu acho que nós devemos isso às instituições que nós criamos. Falta muito? Falta. Mas nós precisamos ter consciência de que, embora sejamos cobradores de nós mesmos, nós temos que ter consciência de que nós estamos andando a passos largos e, cada vez mais, fiscalizar mais, porque são muitas instituições que lidam com o dinheiro público; é muita transferência de dinheiro do governo federal para os entes federados; são muitos convênios que os Ministérios fazem com instituições da sociedade civil. E precisa controlar mesmo, não tem outro remédio.
Eu sei que isso é muito difícil, mas eu acho que nós precisamos ter a coragem, a consciência de que nós precisamos fazer o que estiver ao nosso alcance para que a gente, um dia, se não for possível se livrar da corrupção como um todo, que se livre da corrupção ou da maioria dela. Eu acho que nós estamos...
Eu, quando vi, Jorge, o número de funcionários públicos que já foram demitidos – dois mil, oitocentos e poucos –, 2.350, que eu vi, é um número extraordinário. Às vezes, a corrupção é como uma droga. Tem um pai que vê na televisão um adolescente sendo pego por droga, ele acha que é só o filho dos outros que tem droga. Ele não sabe que, às vezes, ele tem dentro de casa. Às vezes, o filho dele está queimando um “baseadinho” no quarto, e ele não sabe. A corrupção é assim. Às vezes ela está dentro da tua casa, ela está na tua porta e você não sabe.
Qual é a forma que nós temos como saber? Primeiro, a investigação, o check-up. Check-up todos os anos. Por isso, a Polícia Federal tem que ser mais eficiente; por isso, o Tribunal de Contas tem que ser mais eficiente; por isso, o Ministério Público tem que ser mais eficiente. Tudo sem exagero, levando em conta que todo ser humano é inocente até prova em contrário, para que a gente não faça o inverso: todo mundo é culpado até prova em contrário. Então , eu penso que nós temos que ser cada vez mais eficientes, cada vez utilizar mais as tecnologias ao nosso alcance para que a gente possa controlar cada vez mais o dinheiro público. Essa é uma coisa importante.
A outra forma de você saber é o processo de denunciar. As pessoas que denunciam têm que ter garantia de que vão ser protegidas. Às vezes, você fica sabendo por uma informação. É como doença. Quanto remédio, Luiz Fernando, diretor da Polícia Federal, você já tomou porque você estava tomando um drinque com um amigo teu, em algum lugar... no tempo em que você tomava drinques, quando você não tinha a responsabilidade de diretor-geral da Polícia Federal. Você estava tomando um drinque num lugar, lá em Porto Alegre , tomando um chimarrão, e aí você contava algum sintoma que você estava sentindo e o cara do teu lado falava: “toma tal remédio”, e você vai e toma o remédio. A corrupção é assim: se alguém der um sinal de que tem, você vai atrás, e às vezes tem alguém que sabe... É como a violência contra a mulher. Às vezes, tem alguém que sabe que tem violência, e a própria mulher que é vítima tem medo de denunciar porque não sabe o que vai acontecer com ela no dia seguinte.
Então, a corrupção, nós precisamos motivar as pessoas que sabem a denunciar, porque a punição tem que ser para o corrupto e tem que ser para o corruptor, porque a moeda não tem só um lado, ela tem dois. Então, é preciso que a gente seja duro.
Eu, Gilmar, estou feliz, com os avanços que a gente tem conseguido no Poder Judiciário. Eu acho que o mundo ainda vai ouvir falar muito do Brasil, ainda vão sair muitas manchetes de corrupção no Brasil, e é bom que saiam. Quero dizer para vocês que, como Presidente da República, eu prefiro que saiam manchetes para a gente poder investigar, do que não sair nada e a gente continuar sendo roubado, e não saber o que está acontecendo neste país. É muito melhor.
Portanto, eu acho que neste dia 9 de dezembro, em que se comemora o Dia Internacional de Combate à Corrupção, eu queria dizer para vocês, meus filhos: vocês já fizeram muito, mas imaginem o tamanho da Muralha da China. Imaginem cada vez que o chinezinho chegava lá para ir construir a muralha, que ele via o quanto faltava.
Então, o que eu quero dizer para vocês é que não é para desanimar, porque ainda tem muita pedra para colocar e tem muita pedra para a gente, ainda, tirar do nosso caminho. A convocação que eu faço é que se a gente está trabalhando muito e fazendo muito, nós temos que fazer muito mais e trabalhar muito mais, para que a gente coloque na cadeia quem deve estar na cadeia. Não é possível, neste país, quem mata um tatu, uma paca é crime inafiançável. E o cidadão rouba o equivalente a comprar um milhão de pacas e não é crime hediondo, não é inafiançável?
Então, eu acho que nós temos que ser duros. Obviamente que não é a solução, como disse o Jorge Hage, a única solução, porque tem país que tem pena de morte e assim mesmo as pessoas continuam praticando corrupção. Mas é mais um degrau na escalada de combate à safadeza com o dinheiro público neste país.
Parabéns, Jorge Hage, e muito obrigado a todos vocês.
Eu vou só comunicar que eu vou sair correndo porque eu tenho que ir até o Itamaraty, porque tem outro ato em que eu tenho que estar presente, lá.
Um abraço e boa sorte. Quero parabenizar os nossos companheiros do mundo africano de língua portuguesa. Um abraço e boa sorte.
Assessoria de Comunicação Social