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Seminário sobre lobby é marcado pela pluralidade de opiniões
O Seminário Internacional sobre Intermediação de Interesses – A regulamentação do lobby no Brasil, encerrado na tarde desta quarta-feira (12), em Brasília, foi marcado pela pluralidade de opiniões diante do tema. Durante os dois dias de debates e apresentações, acadêmicos, parlamentares, agentes públicos e representantes de empresas refletiram sobre as possibilidades e limites da regulamentação do lobby no contexto brasileiro.
A diretora de Prevenção da Corrupção da Controladoria-Geral da União (CGU), Vânia Vieira, responsável pela organização do evento, considera que o seminário cumpriu o principal objetivo de promover o debate acerca da regulamentação do lobby no Brasil, com a participação dos diferentes setores da sociedade envolvidos e interessados no tema. Segundo a diretora, “foi uma excelente oportunidade para identificar as questões que exigirão discussões mais profundas nos muitos debates que deverão ser ainda realizados para a definição de norma que enfrente efetivamente todos os aspectos do problema e possa ser aplicada de maneira eficaz”.
Os seis painéis realizados durante o seminário evidenciaram alguns consensos. Um deles é que o lobby é uma atividade legítima, própria de regimes democráticos, nos quais é natural que haja a intermediação de interesses. Os lobistas exerceriam, inclusive, importante papel na apresentação de informações necessárias à tomada de decisão no processo legislativo e na formulação de políticas públicas e na busca pelo equilíbrio entre objetivos conflitantes. A normatização e a oficialização dessa função trariam, segundo os debatedores, publicidade a contatos e vínculos que hoje não são claros ao cidadão.
Os participantes do seminário também conviveram com a exposição de pontos de vista distintos. Mesmo o tema que motivou o evento, a regulamentação do lobby no Brasil, não contou com a simpatia de todos os expositores. O jornalista Lúcio Vaz, do Correio Braziliense, participou de um dos painéis e defendeu que a legislação atual é suficiente para orientar a atividade. “O Código Penal está aí e prevê punição para os crimes de corrupção, ativa e passiva, concussão, tráfico de influência”, argumentou o jornalista, ao distinguir lobby bom e lobby mal e fazer relação entre lobby e financiamento de campanhas políticas.
Em consonância com o jornalista, Murilo Aragão, da empresa de consultoria Arko Advice, acredita que a criação de sanções para quem desrespeita os limites éticos é desnecessária. Argumenta que elas já existem no Código Penal e defende uma regulamentação clara, fácil de ser entendida e aplicada. “O que não pode é uma legislação que reforce o encastelamento do poder público frente à sociedade, que torne mais difícil ainda o diálogo da sociedade com o poder público.”
No entanto, Eduardo Carlos Ricardo, da Patri Relações Governamentais, é contrário ao entendimento de que o lobby pode ser ruim ou bom, pois o que se define como lobby ruim, na verdade, é crime. O lobista defende a idéia de que o lobby seja regulamentado por lei federal, de âmbito nacional, e que o processo ocorra de forma negociada, com a participação da sociedade civil e todos os interessados no assunto. O representante da Patri é contra a auto-regulamentação da atividade por meio da criação de entidades e associações de classe e com a edição de códigos de conduta.
Ainda segundo Carlos Ricardo, a regulamentação da atividade deve ser feita de forma gradual: poderia ser exigido desde já que a manifestação do interesse seja feita apenas pelo próprio interessado ou por quem tenha mandato de representação. Essa medida, segundo Ricardo, acabaria com a terceirização do serviço de representação de interesses, a qual traz maiores riscos de ocorrência de corrupção. Além disso, o lobista defendeu que a lei de lobby é apenas um passo, que deve ser acompanhado da edição de uma lei de acesso à informação e do aperfeiçoamento dos tipos penais. “Quanto mais evoluída a democracia, maior deve ser a transparência pública e o acesso à tomada de decisão das políticas”, afirmou.
O deputado federal Maurício Rands (PT/PE), que participou do painel “Controle da atividade de lobby: instrumentos e sanções aplicáveis”, também defendeu a previsão legal de sanções específicas. “Não é fácil regulamentar uma atividade como a do lobby. É preciso entender que um texto legal sobre esse assunto só será eficaz se ele ajudar a produzir mudanças comportamentais.” Segundo Rands, “é preciso melhorar o processo decisório no País.”
Limites
No painel que discutiu a legitimidade e os limites éticos do lobby e dos instrumentos de pressão utilizados, Sepúlveda Pertence, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e atual presidente da Comissão de Ética Pública, disse que é preciso vencer a resistência à própria palavra, freqüentemente vinculada, segundo ele, a métodos ilícitos de aliciamento. Pertence se mostrou cético quanto à possibilidade de que a regulamentação discipline o que chamou de “lobby do mal”. “Eu entendo que, mais dia menos dia, teremos que ter algum tipo de regulamentação, mas ela não eliminará o lobista desonesto.”
O professor de Ciência Política da Universidade do Alaska, Clive Thomas, um dos maiores especialistas no tema da intermediação de interesses, apresentou quatro caminhos possíveis para se alcançar a regulamentação da atividade, mas defendeu como ideal o caminho da auto-regulamentação. “É quando os lobistas regulam a si mesmos”, explicou, apresentando ainda o Canadá e a Austrália como exemplos de países que ilustram bem essa realidade.
Em meio à argumentação quase unânime de que a regulamentação da atividade de mediação de interesses poderá conceder transparência às relações com o poder público, alguns debatedores defenderam que é preciso regular a atividade, mas não a profissão. Hoje, no Brasil, não há instituição de ensino que ofereça formação específica para esse exercício, diferentemente, por exemplo, do que acontece nos Estados Unidos. Os norte-americanos podem aprender a trabalhar como lobistas em cursos de graduação ou de pós-graduação.
Os debatedores presentes à mesa do painel no qual se discutiram os conceitos inerentes à atividade de intermediação de interesses destacaram a importância da transparência em um sistema político representativo. Ante a constatação da existência de patrimonialismo e de civismo incipiente no Brasil, defenderam a regulamentação adequada à realidade brasileira, por conta especialmente do pluralismo social do País. O pluralismo presente na sociedade nacional também mereceu atenção por conta de nem todos os grupos, classes ou instituições exercerem o lobby. “A busca é apenas por transparência ou também por igualdade de oportunidade?”, indagou a professora Andréa Cristina Gozetto, da Universidade Nove de Julho, de São Paulo.
Com argumentos favoráveis à regulamentação da atividade de intermediação de interesses, vários debatedores defenderam a maior transparência no relacionamento dos representantes dos Poderes Executivos, Legislativo e Judiciário com os grupos sociais organizados e instituições diversas. A senadora Ideli Salvatti (PT/SC), por exemplo, ressaltou a importância de se criar regras que garantam mais transparência e maior controle sobre esse tipo de atividade, que, segundo ela, existe nos três poderes. Para a senadora, a atuação legítima do lobby é indispensável ao processo de conhecimento de informações por parte dos parlamentares para a tomada de decisões. “Os limites dessa atuação é que precisam ser estabelecidos”, defendeu.
Já o deputado federal Carlos Zarattini (PT/SP), autor de um projeto de lei sobre o assunto em tramitação no Congresso Nacional, defendeu a exigência de registro para o exercício do lobby. “ Eu acho que é importante ter a regra, estabelecer os limites, o registro. Isso tudo eu acho que é fundamental para que haja transparência nessa relação entre o setor privado e o setor público”, disse o deputado.
Para Luiz Alberto dos Santos, subchefe de Análise e Acompanhamento de Políticas Públicas Governamentais da Casa Civil da Presidência da República, autor de tese de doutorado sobre o assunto na Universidade de Brasília, o lobby é mais nítido no Poder Legislativo, onde a imprensa, segundo ele, tem uma atuação mais evidente na tomada de decisões. Na opinião de Luiz Alberto, é possível a criação de uma lei que abarque a regulamentação do lobby em todos os Poderes.
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Assessoria de Comunicação Social