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Controlador lidera a prática de irregularidades em município baiano
Localizado na Chapada Diamantina, região central da Bahia, o pequeno município de Érico Cardoso tem cerca de 13 mil habitantes e conta com um controlador-geral, que deveria zelar pela boa aplicação dos recursos públicos. Mas justamente o ocupante desse cargo é apontado como responsável por grande parte dos indícios de irregularidade constatada no município pela Controladoria-Geral da União (CGU), durante a 25ª edição do Programa de Fiscalização por Sorteios. No total, a CGU fiscalizou a aplicação de R$ 5,6 milhões de recursos federais no município. (Veja a íntegra do relatório)
De acordo com o relatório da CGU, o controlador, Rubens do Carmo de Souza, e o coordenador de obras de Érico Cardoso, Antônio Carlos de Oliveira, são responsáveis por simulações de processos licitatórios para viabilizar pagamentos com recursos públicos a empresas a eles vinculadas. Muitas das licitações examinadas apresentavam claros indícios de simulação e montagem, com o conseqüente desvio de recursos, levando o Ministério Público Federal e a Polícia Federal a apreenderem, por solicitação da CGU, três computadores da prefeitura para aprofundar a análise dos fatos.
Na memória desses computadores, os fiscais da CGU encontraram muitos documentos que integram os processos de licitações, incluindo propostas supostamente apresentadas pelas empresas participantes, o que evidencia a prática de montagem fraudulenta das licitações na própria prefeitura.
As licitações tinham seus valores fracionados para serem realizadas na modalidade de convite, que tem menores exigências quanto à divulgação, e eram geralmente vencidas por empresas pertencentes a parentes do coordenador de obras ou à filha e à esposa do controlador, que é também o contador das empresas. Essa prática, fartamente utilizada em 2006 e 2007, se estende sobretudo a convênios nas áreas de educação (compra de merenda escolar, construção e reforma de escolas) e saúde (construção de hospital e unidades de saúde).
Testa-de-ferro
Os fiscais analisaram uma amostra de 15 licitações da área da educação, realizadas entre os anos de 2005 e 2007, totalizando aproximadamente R$ 460 mil. Quatro foram vencidas pela WL Prestação de Serviços Ltda., de uma filha do controlador-geral do município; uma foi ganha pela Associação dos Prestadores de Serviços Avulsos de Érico Cardoso (Apsaec), que tem como presidente uma empregada da filha do controlador e funciona no mesmo endereço da WL. Essa “presidente” é, segundo apuraram os fiscais da CGU, uma “testa-de-ferro”, já que não mantém a efetiva direção dos negócios. A filha do controlador é também a titular do conselho fiscal da Apsaec.
Na mesma sede dessas pessoas jurídicas, funciona ainda uma terceira empresa, a Somar Escritório Souza Marques Ltda., que tem como sócias a filha e a esposa do controlador, além da “presidente” da Apsaec.
Duas outras licitações foram integralmente montadas pela própria prefeitura, inclusive as propostas de preços das três supostas licitantes, e tiveram como "vencedora" a empresa Veritânia Construções Ltda., de propriedade da cunhada do coordenador de obras do município.
No caso das escolas, os pagamentos não discriminavam os serviços próprios de cada unidade, e os responsáveis por elas não sabiam identificar os materiais ou serviços recebidos. Tal fato dificulta a fiscalização da execução física, em seus aspectos quantitativos e qualitativos.
Simulações
As entrevistas realizadas e informações trazidas pela população local à equipe da CGU confirmam que é o coordenador de obras da prefeitura quem efetua os pagamentos aos pedreiros e serventes de diversos serviços realizados por essas empresas para a prefeitura. Segundo os fiscais da CGU, esse procedimento apenas busca dar aparência de legalidade aos atos administrativos, mas todas as evidências demonstram que não passam de mera simulação.
Com efeito, na maioria dos casos, os processos licitatórios não têm suas páginas autuadas, numeradas e rubricadas. Em muitos casos, as propostas dos supostos participantes apresentam a mesma configuração gráfica, com formatação e tipologia idênticas e até os mesmo erros de digitação e ortografia, evidenciando a prática de montagem das licitações.
Nas justificativas apresentadas à equipe da CGU, a prefeitura de Érico Cardoso sustenta que “inexiste vedação legal” para a participação da empresa da filha do controlador em processos licitatórios e que o controlador não exerce influência na indicação das empresas.
A equipe da CGU constatou irregularidades também no pagamento de despesas com recursos do programa de transporte escolar. Os indícios são de que não houve a efetiva prestação de serviços e/ou entrega de materiais, contratados a uma outra empresa de uma filha do controlador-geral do município, a Motocar Peças e Serviços Ltda., sem a realização de processo licitatório.
A empresa recebeu, em 2007, mais de R$ 20 mil por serviços de lavagem de ônibus e kombis da prefeitura usados no transporte escolar e pelo fornecimento de pneus e peças para esses veículos, mas há evidências de que esses serviços não foram prestados e nem o material foi fornecido.
Garagem
Entre outros problemas, verificou-se uma quantidade excessiva de notas fiscais da Motocar para serviços de lavagem de veículos e revisão de suspensão e freios. Além disso, entre as diversas compras de pneus realizadas junto à empresa, verificou-se, no que se refere à Nota Fiscal 552, que os pneus não estavam nas Kombis às quais estariam destinados, e o funcionário responsável não soube informar a localização dos mesmos. Os pneus encontrados em uso nesses veículos estavam bem gastos, e as especificações (175x80x14) não batiam com as dos pneus adquiridos (185x70x14).
Em visita à Motocar, os fiscais observaram que a empresa executa atividade de manutenção em motos, funciona em uma pequena garagem e, aparentemente, não possui estrutura para manutenção em ônibus.
Falsificação
Houve indícios de simulação e montagem, além do uso de empresas de “laranjas”, também em três outros convênios firmados com o Ministério da Saúde entre os anos de 2001 e 2004 (administração municipal anterior à atual), no valor total de R$ 695 mil, para a construção do hospital na sede do município e de duas unidades de saúde nos distritos de Barra e Brejo.
Entre inúmeras irregularidades verificadas na execução dos três convênios, dirigentes de empresas que teriam participado das obras negaram essa participação aos fiscais da CGU e forneceram provas de falsificação documental por parte da administração municipal.
Outras empresas supostamente participantes das licitações não foram localizadas nos endereços constantes nos documentos que integram os processos licitatórios. Também nesses casos houve denúncias de moradores segundo as quais os serviços teriam sido executados com equipamentos da prefeitura e por pedreiros contratados e pagos pela administração municipal.
Em Érico Cardoso, os fiscais da CGU constataram ainda compra de medicamentos e de combustíveis sem licitação; irregularidades no programa do transporte escolar, como motoristas com habilitação vencida e uso de caminhões com carroceria aberta; médicos e enfermeiros descumprindo a jornada prevista no Programa Saúde da Família e muitas irregularidades na movimentação financeiras de recursos de convênios.
Assessoria de Comunicação Social