Auditoria e Fiscalização
Sorteios
Empresa de "laranjas" serve a prefeituras no Rio Grande do Norte
A empresa Juacema Construções Ltda., registrada em nome de dois "laranjas", vem contratando serviços com prefeituras do Estado do Rio Grande do Norte, segundo constatou a Controladoria-Geral da União durante a décima edição do Programa de Fiscalização por Sorteios Públicos. Identificada na fiscalização do sorteio anterior como contratada pelo município de Santa Cruz (RN), a Juacema volta a aparecer agora, durante a fiscalização do décimo sorteio, na condição de contratada pelo município de Lagoa Nova, no mesmo Estado.
Confira as sínteses dos relatórios de fiscalização
Os fiscais da CGU apuraram que a Juacema pertence, oficialmente, a uma empregada doméstica que vive com a filha e a mãe de criação (mantenedora da família com sua aposentadoria de um salário mínimo), e um agricultor com baixíssimo grau de instrução, que mora com a mulher e três filhos e sobrevive com o trabalho na roça. Os dois declararam desconhecer as atividades da empresa, afirmando nunca terem recebido qualquer quantia oriunda dos contratos.
Enquanto em Santa Cruz a Juacema foi contratada, sem licitação, para fazer obras de pavimentação e drenagem de ruas, no valor de R$ 2,3 milhões, em Lagoa Nova, a empresa venceu uma licitação no valor de R$ 424 mil para fazer obras de melhorias sanitárias.
Lagoa Nova é apenas um dos vários municípios onde a CGU constatou indícios de irregularidades graves durante as fiscalizações do 10º sorteio. Entre os 50 municípios cujos resultados estão sendo divulgados hoje, 39 apresentaram problemas considerados graves e 11 apenas problemas administrativos. O resultado dos outros 10 municípios integrantes desse sorteio foi divulgado no dia 27/09/04. O volume total de recursos fiscalizados nesses 50 municípios chegou a cerca de R$ 242,4 milhões.
No município de Itabela, na Bahia, a empresa PS Construções e Saneamento Ltda., contratada para construir módulos sanitários, não foi localizada em nenhum dos endereços fornecidos pela prefeitura como sendo da sede da empresa. A prefeitura também não apresentou a documentação referente à licitação vencida pela PS Construções.
Coincidência de endereços
Os fiscais da CGU constataram ainda que as empresas FW Construtora e Pavimentadora Ltda.; KSA Construtora, Pavimentações e Urbanização Ltda.; Empreendimentos Pingo de Ouro Ltda. e JN Indústria e Comércio de Mármores e Granitos, Mecânica e Transporte Ltda., todas contratadas pela prefeitura para a execução de serviços, têm como contador o secretário de finanças da prefeitura de Itabela, o que caracteriza situação de conflito de interesses entre as partes, posto que o secretário é o responsável pelos empenhos e pagamentos da prefeitura. A FW Construtora tem como sede (de acordo com as bases da Receita Federal) o endereço do escritório do secretário de finanças.
Já em Contendas do Sincorá, também na Bahia, foram encontrados indícios de simulação de licitações, no valor de R$ 182,5 mil, e de desvio, no valor de R$ 155 mil, em recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef). Enquanto isso, o pagamento dos salários dos professores sofreu atrasos de até quatro meses e não foi efetuado o pagamento da parcela constitucional referente ao 1/3 de férias.
Em relação às licitações, a prefeitura de Contendas não comprovou a realização de procedimentos licitatórios para a aplicação dos recursos do Fundef nos exercícios de 2002 e 2004. Foram apresentados quatro processos referentes a 2003, todos com indícios de fraude. Na tomada de preços nº 06/2003, por exemplo, estavam previstos serviços de reforma e manutenção de escolas da rede de ensino fundamental. As propostas das três licitantes eram exatamente iguais na disposição das informações, no conteúdo e no tipo de impressão. Elas não possuíam a identificação do proponente nem o carimbo da empresa. A empresa vencedora do certame, Sincorá Construções Ltda., foi contratada por R$ 90 mil.
Em visita às escolas e em entrevistas com membros da comunidade, os fiscais constataram que, em alguns estabelecimentos, apenas pequenas obras foram feitas, como pintura de paredes e troca de telhados. Não foi apresentado nenhum documento aos fiscais que comprovasse a localização e o custo dos serviços executados.
Documentos manipulados
Em Capitão Poço, no Pará, a equipe de fiscalização encontrou indícios de falsificação de documentos públicos, apresentados para comprovar as despesas com recursos do Fundef, da ordem de R$ 7,1 milhões, nos últimos três anos. Na ausência dos fiscais, que trabalharam por duas semanas no município, foram introduzidos documentos nas pastas que estavam sob responsabilidade da equipe da CGU, na sede da Secretaria de Educação. Foram incluídos documentos referentes a 2001 e 2002, como Balanço Fundef, Relatório Sintético de Despesas e Distribuição de Arrecadação Federal (DAF).
Os DAF, por exemplo, foram extraídos do site do Banco do Brasil na Internet, aparentemente de forma autêntica. No entanto, a data e a hora registradas nos documentos, indicam que a consulta foi realizada na noite do dia 20/06/2004 (domingo), fim de semana que intercalou os dias de trabalho da equipe da CGU no município. Os registros contábeis denominados Balanço Fundef visavam substituir os registros integrantes anteriormente das pastas, chamados Demonstrativos do Fundef. Em ambos estão registradas as receitas e as despesas do Fundo, mas há divergências grandes entre os valores lançados em cada um deles. Esse tipo de manipulação verificada pelos fiscais da CGU pode configurar fraude contábil e falsificação de documentos públicos, crime tipificado no artigo 297 do Código Penal Brasileiro.
Além disso, a equipe de fiscalização encontrou outra dificuldade em Capitão Poço: a falta de apresentação de documentos referentes às licitações, conciliação bancária, cheques e o livro caixa. Apesar disso, conseguiu-se detectar indícios de movimentação irregular de recursos financeiros, tendo em vista que os extratos bancários registram saques de altos valores, supostamente transferidos para o caixa da prefeitura, por meio de cheques avulsos. Não foram apresentados quaisquer controles que comprovassem a movimentação desses recursos.
Equipamentos desaparecidos
Outro problema verificado em vários municípios foi a não-localização de equipamentos e materiais adquiridos com recursos de programas federais. Em Colatina, Espírito Santo, quatro computadores com estabilizadores, quatro mesas e cinco cadeiras, que deveriam estar num dos quatro centros de inclusão digital do município, não foram localizados. Os equipamentos foram comprados com recursos do programa de inclusão digital, que destinou R$ 100 mil para essa finalidade.
Em São João do Meriti, Rio de Janeiro, os fiscais não conseguiram localizar alguns dos equipamentos comprados para aparelhar dez creches municipais, no valor total de R$ 199,3 mil. Em cinco escolas visitadas, foi constatada a ausência de bebedouro, fogão industrial, balança industrial mecânica, filmadoras, máquinas fotocopiadoras portáteis, além de mesas e cadeiras. Além disso, os aparelhos de ar condicionado adquiridos são de 18.000 BTUs, mas foram licitados os aparelhos de 20.000 BTUs.
Problemas na Saúde
Na área da saúde também foram constatadas várias irregularidades, desde falta de medicamentos básicos até desvios ou utilização indevida dos recursos. Em Goiatins, Tocantins, verificou-se que os serviços para a construção de 57 módulos sanitários ainda não haviam começado, mas o saldo da conta do convênio apresentava R$ 46,3 mil a menos do que o valor já repassado ao município pelo Ministério da Saúde. Dos R$ 81,2 mil repassados, restavam na conta R$ 34,9 mil. A prefeitura não apresentou documentos de despesas para comprovar os saques com cheques efetuados na conta e também não aplicou os recursos no mercado financeiro.
No município de Esmeraldas, Minas Gerais, a prefeitura paga curso de pós-graduação para servidora com recursos do Programa de Atenção Básica (PAB-Fixo). Durante cinco meses, o curso de pós-graduação da servidora Andreia Cássia de Souza Belo, no valor total de R$ 1.450,00, foi pago pela prefeitura. Em Canápolis, Bahia, a prefeitura utilizou notas fiscais frias, clonadas ou vencidas para comprovar gastos com medicamentos, no valor total de R$ 12 mil. Além disso, ainda em Canápolis as equipes do programa Saúde da Família não funcionaram no ano de 2003, mesmo com o recebimento de R$ R$ 103,6 mil, enviados pelo Ministério da Saúde.