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Waldir Pires: CGU cumpriu seu dever em São Francisco do Conde
A manifestação feita ontem, em Salvador, por moradores de São Francisco do Conde, exigindo providências do Ministério Público Estadual contra o prefeito do município deixou feliz o ministro do Controle e da Transparência, Waldir Pires. “É a sociedade civil se mobilizando para exigir que o dinheiro público seja aplicado em benefício da população, e essa exigência deve atingir a todos: Executivo, Judiciário, Legislativo e Ministério Público”, disse o ministro, sustentando que a iniciativa da população fortalece a democracia.
Waldir Pires disse ainda que a Controladoria-Geral da União cumpriu seu dever, fiscalizando a aplicação de recursos públicos federais em São Francisco do Conde e encaminhando aos Ministérios Públicos Estadual e da União o relatório da fiscalização com os indícios de irregularidade constatados. “A capacidade de julgar e punir, nas democracias, é do Judiciário, e a iniciativa do processo é do Ministério Público”, esclareceu.
O subcontrolador-geral da União, Jorge Hage, acrescentou que a CGU tem mantido, inclusive, contatos freqüentes com o Ministério Público Estadual da Bahia e com o Ministério Público da União (seja com o Procurador-Chefe da República na Bahia, Cláudio Gusmão, seja com o Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles), para saber se alguma ação foi ou está sendo ajuizada contra os gestores envolvidos com os indícios de irregularidades constatados em São Francisco do Conde.
Em dezembro do ano passado, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, determinou, por unanimidade, o afastamento do cargo e a indisponibilidade de bens do prefeito de Porto Seguro, José Ubaldino Alves Pinto Júnior, acatando medida cautelar requerida pelo Ministério Público Federal e que teve como base o relatório da auditoria feita no município por uma força-tarefa coordenada pela Controladoria-Geral da União.
Constatações
São Francisco do Conde foi contemplado na sexta edição do Programa de Fiscalização a partir de Sorteios Públicos, no final do ano passado, e acabou figurando como um dos municípios com graves indícios de irregularidade. Os fiscais tiveram dificuldades em analisar a aplicação dos recursos oriundos do recebimento de royalties, pois a prefeitura os movimenta, irregularmente, de forma conjunta com recursos provenientes de outras fontes de receita, sem fornecer elementos que permitam dissociar os valores. São inúmeros e de grande monta os indícios de irregularidade constatados pela fiscalização com o uso desses recursos.
Na gestão anterior à atual, por exemplo, a administração municipal celebrou contrato com a empresa Cobrate, vencedora de licitação feita para a construção e recuperação de estradas, recuperação de ruas na sede municipal, infra-estrutura urbana em distritos, construção de centro de saúde e de hospital pediátrico, entre outras obras. O contrato, que previa gastos da ordem de R$ 45 milhões, foi interrompido em setembro de 2000, após ter sido executada quase a totalidade do montante contratado.
Em janeiro de 2001, já sob a administração atual, o município sub-rogou o contrato às empresas Mazda e TCI, prevendo a execução de um remanescente de obras no valor de R$ 8 milhões. Esse procedimento não encontra amparo legal, visto que a prefeitura deveria ter convocado a empresa classificada em segundo lugar na licitação, para a realização das obras remanescentes que não tinham sido executadas. Com sucessivos termos aditivos ao contrato inicial, encomendas de novas obras e serviços, feitos sempre sem licitação, a Mazda e a TCI já receberam recursos municipais da ordem de R$ 50 milhões, aí incluídos recursos provenientes dos royalties, segundo registram os fiscais da CGU em seu relatório.
Ferrolho
As mesmas empresas (Mazda e TCI) foram contratadas por R$ 9 milhões e R$ 3 milhões, respectivamente, para realizar obras de pavimentação de ruas em paralelepípedos. As planilhas apresentadas não permitem caracterizar a efetiva realização das obras, que não foram executadas pelas duas empresas. Em parte, as obras foram sub-contratadas a pequenas empreiteiras, sem nenhum controle por parte da administração municipal.
Novamente sem licitação, a Mazda foi contratada para construir um trecho da Estrada do Ferrolho, de aproximadamente nove quilômetros de extensão. Dados levantados junto ao Departamento de Estradas e Rodagens da Bahia (Derba) autorizam afirmar que a estrada deveria ter sido orçada em valor aproximado a R$ 1 milhão. No entanto, as notas fiscais apresentadas pela Mazda comprovam desembolso da ordem de R$ 5 milhões, mesmo a prefeitura não tendo apresentado documentos que justifiquem dispêndio de tal monta.
Os fiscais da Controladoria apuraram que, não tendo tradição na construção de rodovias, a Mazda sub-contratou a CTE – Construtora Terrana e Estudos Ltda. para executar as obras, pagando-lhe, aproximadamente, R$ 1,8 milhão. A Mazda obteve, portanto, um lucro líquido superior a R$ 3 milhões com a Estrada do Ferrolho.
Com base em denúncias, os fiscais da CGU constataram que a Mazda cedeu um apartamento de alto padrão em bairro nobre de Salvador, avaliado em R$ 600 mil, para uso do prefeito e de sua família. O imóvel foi adquirido pela empresa em abril do ano passado e sua utilização pelo prefeito e família foi comprovada através de entrevistas com moradores do prédio.
Indícios de fraudes
Na área da educação, os fiscais constataram fraudes em licitações no montante de R$ 2 milhões, com recursos do Fundef, do Programa de Atendimento à Criança em Creche, do Programa Recomeço e do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Trinta dos 37 processos de licitação analisados apresentaram fraudes. As graves irregularidades incluem a participação de empresas pertencentes a sócios comuns; empresas fora do ramo do objeto licitado; empresas concorrentes com o mesmo endereço ou empresas que não existem no endereço indicado e superfaturamento de produtos em até 2.000% em relação ao preço de mercado.
Os fiscais encontraram na sala da Comissão de Licitação convites de certames em branco, mas já assinados e tidos como recebidos, como é o caso da Padaria Irmãos. Segundo a responsável pela padaria, a empresa assinava os convites preparados pela prefeitura mesmo que não fosse participar dos certames.
Notas fiscais frias também aparecem no rol das fraudes. Os fiscais constataram R$ 109 mil em notas fiscais emitidas, em 2003, pela empresa Carisma, que vendeu material didático para as escolas municipais, apesar de atuar no ramo de confecções de mochilas. No site da Secretaria Estadual da Fazenda não consta a autorização para a emissão das notas fiscais usadas pela empresa para comprovar a venda. O número indicado nas notas é fraudulento. Também é fraudulenta a indicação da gráfica que teria confeccionado tais notas. A gráfica afirmou aos fiscais que jamais confeccionou notas fiscais para a empresa Carisma.
Elásticos
Para uma estranha aquisição de 4,3 milhões de unidades de elásticos (cinco toneladas) para dinheiro, a Prefeitura realizou uma Tomada de Preços no valor de R$ 629 mil, vencida pela empresa Di Paula. A compra dos elásticos foi um dos 105 itens da Tomada de Preços. Os fiscais constataram que a compra foi superdimensionada e que os elásticos nunca foram entregues. O superdimensionamento de materiais também foi constatado em outros produtos. Em dez meses, a Prefeitura comprou 36 mil pincéis atômicos, no valor total de R$ 17,3 mil. Segundo dados dos fiscais, o consumo de pincéis por todos os alunos da rede municipal de ensino, pelo período de um ano, é de no máximo 1.200 unidades. No depósito da Prefeitura só foram encontrados 2.200 pincéis.