Auditoria e Fiscalização
Sorteios
Sudene financiou R$ 17 milhões a indústria que nunca funcionou
O sumiço de um trator no município de Água Branca, em Alagoas; a utilização de notas fiscais falsas pela Prefeitura de Confresa, em Mato Grosso, para tentar comprovar gastos de R$ 139 mil; o financiamento de R$ 17,7 milhões para uma empresa que nunca funcionou, em Horizonte, Ceará; e a simulação de folhas de pagamento para tentar comprovar a aplicação de recursos do Fundef, em Porto de Moz, no Pará, são algumas das irregularidades constatadas pela Controladoria-Geral da União nos 50 municípios fiscalizados em agosto, como parte da 4ª edição do Programa de Fiscalização a partir de Sorteios Públicos.
Clique aqui para ler a síntese dos relatórios de fiscalização
Dos 50 municípios fiscalizados pela CGU nesta edição do programa, 33 apresentaram irregularidades de diferentes graus de gravidade; em 15 foram constatadas falhas consideradas formais e em dois municípios (Espigão do Alto Iguaçu, no Paraná, e Iepê, em São Paulo) não foram encontrados quaisquer problemas com a aplicação de recursos da União pela administração municipal. O total de recursos fiscalizados neste sorteio chegou a R$ 303 milhões, tendo a operação envolvido cerca de 600 fiscais e auditores.
Os resultados da fiscalização foram divulgados hoje (17/10), pelo Ministro do Controle e da Transparência, Waldir Pires, que destacou os números já alcançados, até aqui, pelo programa: 181 áreas municipais já foram fiscalizadas, totalizando a análise sobre a aplicação da ordem de R$ 1 bilhão. Nessas áreas, mais de 10 mil ações de fiscalização já foram realizadas, resultando em 2.525 relatórios encaminhados, para as ações corretivas, a diferentes órgãos públicos como os Ministérios ordenadores das despesas, o Tribunal de Contas da União, o Ministério Público Federal e a Advocacia-Geral da União.
"O programa vem se consolidando e cumprindo cada vez mais o seu papel de atrair a participação da sociedade para o exercício do controle sobre a aplicação dos recursos públicos", comenta o ministro. Licitações fraudulentas, financiamentos sem controle e acompanhamento, documentos falsificados, materiais pagos e não recebidos, obras inacabadas e abandonadas e falta de atuação dos conselhos são os problemas mais comumente encontrados pelos fiscais da CGU nas áreas fiscalizadas.
Trator desaparecido
Em Água Branca, Alagoas, um trator comprado por R$ 47 mil, com recursos do Ministério do Desenvolvimento Agrário para ser utilizado no desenvolvimento da agricultura familiar no município, não foi localizado. O prefeito informou que o trator fora roubado, o que foi comprovado pela certidão do 2º Distrito Policial de Água Branca.
Contudo, os fiscais foram informados pelo Conselho de Desenvolvimento Rural do Município de Água Branca que o trator tinha sido transferido para uma propriedade particular da família do prefeito sem autorização. Apesar de a Prefeitura ter registrado ocorrência policial e comunicado o fato a alguns órgãos governamentais, não foi instaurada nenhuma sindicância administrativa para apurar responsabilidade pelo desaparecimento da máquina.
No município de Horizonte, no Ceará, a Marambaia Têxtil S/A recebeu do Fundo de Investimento do Nordeste (Finor/Sudene) R$ 17,7 milhões para investimentos na empresa, que nunca funcionou. As transferências para a empresa foram efetuadas entre os anos de 1993 a 1999 e chegaram a 99,88% do montante de financiamento previsto para o funcionamento do empreendimento. Apesar disso, a empresa nunca chegou a funcionar e nem gerou emprego na região. É bom lembrar que esse problema específico não tem vinculação com a administração municipal.
Situação parecida aconteceu em Castanhal, no Pará, onde a extinta Sudam liberou R$ 800 mil para dois projetos na área da indústria moveleira e da avicultura, para as empresas Indústria de Móveis Tupi S/A (R$ 714 mil) e R. J. Avícola S/A (R$ 86 mil). As duas empresas não funcionam e os poucos equipamentos que ainda restam do empreendimento estão deteriorados.
Em Novo Gama, Goiás, a Prefeitura recebeu R$ 315 mil para equipar um hospital da cidade, o Hospital Municipal de Novo Gama. Acontece que os fiscais não localizaram o hospital, cujo registro consta dos documentos da Secretaria Municipal de Saúde. Os fiscais encontraram alguns equipamentos empilhados em um depósito e sem uso pela população.
Em União de Minas, Minas Gerais, a fiscalização da CGU constatou informações falsas a respeito de uma obra parcialmente realizada, que custou R$ 550 mil aos cofres da União, para drenagem de águas pluviais na cidade. A Prefeitura informa que concluiu a obra, mas um parecer da Secretaria Nacional de Defesa Civil sustenta o contrário, o que foi confirmado pela visita dos fiscais ao local da obra.
Notas fiscais falsas
A Prefeitura de Confresa, em Mato Grosso, apresentou notas fiscais falsas para comprovar despesas no valor de R$ 139 mil, parte de um repasse de R$ 420 mil recebido do Ministério do Desenvolvimento Agrário para ser aplicado em infra-estrutura de assentamentos rurais. As empresas apontadas nas notas apresentadas negam a venda de qualquer produto à Prefeitura.
Três das empresas que tiveram notas fiscais falsificadas, no valor total aproximado de R$ 72 mil, já haviam sofrido com o mesmo problema, conforme registros da Delegacia Estadual de Crimes Contra a Fazenda Pública e Economia Popular do Tocantins. Outra empresa, que teria emitido uma nota fiscal no valor de R$ 5,9 mil, está cancelada desde 1996.
Fraude no Fundef
Como já havia sido constatado em todas as fiscalizações anteriores, os desvios de recursos do Fundef também se repetiram desta vez em muitos municípios fiscalizados. Em Porto de Moz, no Pará, a Prefeitura simulou folhas de pagamento, visando comprovar a aplicação mínima dos recursos do Fundef para pagamento dos servidores do Ensino Fundamental. A diferença entre o que foi realmente pago e o que foi comprovado na prestação de contas chega a mais de R$ 250 mil. Além disso, o Censo Escolar foi superestimado em quase mil alunos. Por ter realizado gastos com despesas não previstas pelo Fundef, o gestor municipal foi instado a restituir à conta do Fundo quase R$ 60 mil.
Em Massapê do Piauí, no Piauí, o Secretário de Educação e cinco professores são remunerados com recursos do Fundef, apesar de exercerem cargos na Secretaria Municipal de Educação. Nesse mesmo município, os fiscais também constataram que um terceiro assinou a folha de pagamento e recebeu por dois professores que não moram no município e nem sequer lecionam. Em Santa Filomena, Piauí, a história se repete. A Secretária Municipal de Educação e seis professores do ensino infantil recebem os salários com recursos do Fundef. Além disso, houve gasto de R$ 18 mil com despesas não previstas no programa, como aquisição de alimentos e materiais de escritório.
Cursos inexistentes
Os fiscais constataram em Rio Formoso, Pernambuco, a realização de cursos fantasmas com recursos do Ministério do Trabalho e Emprego. Os alunos desconheciam a existência dos cursos, apesar de seus nomes constarem na listas de participação. O Centro de Desenvolvimento Comunitário de Monsenhor José Keher informa que realizou o curso de Capacitação e Alfabetização, mas as pessoas indicadas na lista de inscritos negam a participação e até mesmo conhecimento do curso.
Em Iepê, São Paulo, a Força Sindical informou que foram realizados dois cursos, para 58 pessoas, pela Associação de Promoção do Desenvolvimento Local e pelo Instituto Paulista de Ensino e Cultura. Mas os fiscais constataram que foi realizado apenas um evento organizado pela Força Sindical para divulgação de um programa.
Falta merenda
Os desvios de recursos e não comprovação de despesas são irregularidades constantes cometidas pelas prefeituras. Em Urandi, Bahia, a Prefeitura adquiriu mais de 13 toneladas de alimentos para abastecer as escolas do município. Apesar da grande quantidade de alimentos, que supostamente havia no estoque, os fiscais constataram que faltou merenda nas escolas da rede municipal.
Não foram distribuídas 911 quilos de açúcar, 548 quilos de arroz, 776 quilos de biscoito e 9.900 litros de leite in natura. Em Água Branca, R$ 18 mil foram desviados do Programa de Atenção Básica à Saúde para aquisição de pneus e peças para veículos e pagamentos de incentivos a médicos, enfermeiros e auxiliares, gastos não autorizados pelo programa.
Carro e moto
Em Rodolfo Fernandes, Rio Grande do Norte, a servidora municipal Maria Bezerra, declarou ao Programa Bolsa Escola renda mensal de R$ 15,00 e conseguiu ser beneficiária do programa, mas, na verdade, sua renda familiar é de R$ 600,00 (salário próprio mais a pensão da mãe).
Já Maria Alzenir é proprietária de um carro, uma moto e uma loja no centro da cidade, mas está cadastrada como beneficiária do Bolsa Escola e do Vale Gás. Alzenir informou ao Programa que tem renda mensal de R$ 30,00. A auxiliar de enfermagem Francisca Vasconcelos, também terá que devolver recursos ao Programa, pois recebe um salário de R$ 427,00 e está como beneficiária do Bolsa Escola. Pelas normas do programa, a família do beneficiário deve ter uma renda per capita de, no máximo, R$ 90,00.
Leia mais: