Auditoria e Fiscalização
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Licitações fraudadas lideram os problemas em áreas fiscalizadas pela CGU
Taperoá, na Bahia, Flexeiras, em Alagoas, e Oiapoque, no Amapá, são alguns dos municípios brasileiros onde se constataram os maiores indícios de irregularidade na aplicação de recursos públicos federais, de acordo com os relatórios elaborados pelos fiscais da Controladoria-Geral da União, após fiscalização nas 50 áreas municipais contempladas, no final de junho último, pelo Programa de Fiscalização a Partir de Sorteios Públicos. Os recursos fiscalizados nos 50 municípios sorteados, com população de até 300 mil habitantes, passam de R$ 412 milhões. Os relatórios sintetizados estão disponíveis no site da CGU.
Clique aqui para ler a síntese dos relatórios de fiscalização
Enquanto em Taperoá se descobriram indícios da existência de uma verdadeira central de produção de documentos falsos para fraudar licitações (leia matéria anexa), em Oiapoque a Prefeitura já pagou, integral ou quase integralmente, cerca de R$ 422 mil por quatro obras não concluídas. Uma delas, um sistema de abastecimento de água na aldeia Kumarumã, está abandonada com apenas os alicerces implantados, mas a empresa contratada, a O. M. Engenharia, recebeu R$ 96,4 mil, correspondentes a 68% do valor total previsto para a obra, R$ 141,2 mil.
Outra obra também abandonada sem ter sido concluída, no município, foi a construção de um novo posto de saúde. Sem que tenham sido feitas medições que comprovassem a realização dos serviços, a empresa responsável, I. M. C. Souza-ME, recebeu R$ 69,6 mil reais, mais da metade dos R$ 129,2 mil que deveria custar a construção do novo posto. Em todos os casos, os fiscais recomendaram a abertura de Tomadas de Contas Especiais, para a apuração das responsabilidades.
Mas há também o que comemorar: em meio a inúmeros indícios de desvios, fraudes e má gestão, as equipes da CGU encontraram cinco municípios (Cravinhos, Monte de Mor e Ipuaçu, em São Paulo; Tapejara, no Paraná; e Cachoeira de Minas, em Minas Gerais), onde as pequenas falhas constatadas são de natureza formal, sem indícios de dolo, e sanáveis com orientação aos gestores.
Rodovia esburacada
Já em Flexeiras (Alagoas) uma licitação no valor de R$ 12,9 mil, destinada à aquisição de material de consumo para escolas apresentou, entre outras irregularidades, ausência de pesquisa de preços; ausência dos envelopes com as propostas; propostas com assinaturas que não permitem identificar os representantes das empresas e ata da Comissão de Licitação sem rubrica dos participantes.
O número de participantes também estava abaixo do exigido pela legislação, já que duas das três empresas participantes (Lins e Jatobá Ltda. e Eny Costa & Cia. Ltda.) tinham como sócio a mesma pessoa: Heleny Lins Costa. A mãe de Heleny (Eny de Almeida Lins Costa), também é sócia da empresa Eny Costa & Cia. Ltda., vencedora da licitação, fato enquadrado como irregularidade pela Lei 8.666/93.
Em Tanguá, no Rio de Janeiro, constatou-se a falta de conservação e manutenção de trechos da rodovia BR-101, entre os quilômetros 144 e 296, causando prejuízos dos recursos já investidos e colocando em risco os usuários da estrada. Nesse trecho, foram realizadas obras orçadas em pouco mais de R$ 1 milhão, mediante contrato entre o Departamento Nacional de Infra-estrutura da Transportes (DNIT) do Ministério dos Transportes e a empresa Notemper Empreendimentos, durante o ano de 2002. Recomendou-se ao Ministério dos Transportes que faça um outro contrato para manutenção, tendo em vista a deterioração da rodovia.
Obras inacabadas
A Prefeitura de Vila Rica, no Mato Grosso, recebeu do Ministério dos Esportes R$ 121,5 mil para a construção de uma quadra esportiva, mas a obra está inacabada e abandonada pela empresa responsável. A previsão para a realização da obra era de 120 dias, a contar de dezembro de 2001, mas até hoje apenas 50% da obra foi realizada.
No mesmo município, e ainda em dezembro de 2001, um novo convênio, no valor de R$ 330 mil, foi firmado entre a Caixa Econômica Federal e a Prefeitura, para a construção de um ginásio. A obra também está atrasada e andando a passos de tartaruga. Para os fiscais da CGU, a Prefeitura não vem cumprindo seu papel gerenciador junto às empresas contratadas.
Em Baixa Grande, na Bahia, a Prefeitura utilizou R$ 19,6 mil do Fundef para restaurar o prédio da Secretaria Municipal de Educação, o que é vetado por lei. A recomendação feita pelos fiscais foi no sentido de que a Prefeitura efetue o ressarcimento de todos os gastos indevidos à conta do Fundef e de que se encaminhem os dados ao Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia, para que subsidiem a avaliação das contas do Fundo.
Ainda na Bahia, em Filadélfia, os fiscais constataram que a Prefeitura adquiriu, sem licitação, gêneros alimentícios para o Programa de Alimentação Escolar, nos valores de R$ 124,2 mil (em 2002) e R$ 38,5 mil (durante o primeiro semestre deste ano).
Utensílios de cozinha, brinquedos e material de construção, no valor aproximado de R$ 10 mil, foram comprados para o Centro de Educação Infantil Antenor Sprotte, administrado pela Prefeitura de Araquari, em Santa Catarina. Apesar de pagas, as compras nunca foram entregues, segundo constataram os fiscais da CGU.
Apropriação indébita
Já em Parintins, no Amazonas, foram desviados recursos de R$ 165 mil, R$ 150 mil dos quais liberados pelo Ministério da Agricultura para a Cooperativa dos produtores Rurais da Agrovila de Cabury Ltda (Cooprac), destinados à contratação de embarcações para o transporte da produção agrícola, no final do ano 2000. Uma comissão de sindicância instalada pelo MA já havia constatado que todo o trâmite do projeto junto à área técnica do Departamento de Cooperativismo Rural ocorreu sem qualquer contato com a direção da Cooprac. Todas as providências foram tomadas por Jucelino de Melo Manso, um assessor parlamentar que fazia a intermediação.
Há indícios apontados no relatório da comissão de sindicância de que Jucelino falsificou documentos, recibos e notas fiscais com o objetivo de liberar os recursos do convênio e poder comprovar a sua aplicação. O dinheiro nunca chegou à cooperativa, que além de não poder promover o escoamento de sua produção, ainda consta como inadimplente no Siafi, sem ter como devolver os valores que não recebeu.
A recomendação feita pelos fiscais da CGU é de que se instaure uma Tomada de Contas Especial sob responsabilidade do então presidente da cooperativa, João Júlio da Silva Souza. Recomendou-se também a comunicação de possível notícia crime de apropriação indébita de recursos públicos ao Ministério Público Federal.
Bolsa Escola
Em Apuiarés, no Ceará, constatou-se, entre muitas outras irregularidades na administração do Programa Bolsa Escola, que Maria Madalena Bezerra da Silva continua recebendo o benefício referente a seu filho Francinaldo, falecido desde janeiro de 2002. Em Cachoeira do Piriá, Pará, a professora Edna Maria Costa da Fonseca e a funcionária municipal Solange Bezerra dos Anjos recebem, cada uma, o pagamento do Bolsa Escola de dois beneficiários do programa.
Edna é também diretora de uma escola municipal e esposa do vereador Francisco Luiz da Fonseca. Solange é chefe de gabinete na Prefeitura. Um filho de outro vereador, Raimundo Nonato Machado, também é beneficiário do programa. Em todos os casos citados a renda familiar é incompatível, ultrapassando o teto estabelecido para o programa.
Lindalva Lopes da Costa, professora das redes municipal e estadual de ensino e representante da Secretaria Municipal de Educação de Taipu, Rio Grande do Norte, no Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Bolsa Escola no município, é também beneficiária do programa.
Acumulação
Em Guarantã do Norte, Mato Grosso, Elion Leopoldo da Anunciação, recebeu R$ 5,5 mil pelos serviços prestados como coordenador do projeto "Implantação de Viveiro para Fomento Florestal", entre julho de 2000 e maio de 2001. Ocorre que Elion é servidor público federal, lotado na unidade executora do Incra em Guarantã do Norte e colocado à disposição da Prefeitura do Município.
A dupla remuneração é vetada pela Instrução Normativa nº 1 da Secretaria do Tesouro Nacional, de 15/01/97. O servidor também foi presidente da Comissão Permanente de Licitação de 1997 a 2000, respondendo, portanto, solidariamente, pelos muitos indícios de fraude apontados em licitações decorrentes de convênios com vários ministérios.
Já em Caaporã, na Paraíba, os fiscais pediram cópias das portaria de nomeação dos cargos comissionados da Prefeitura e, após cruzarem informações, verificaram que a Secretária Municipal de Saúde, Ivanilda de Souza Soares, ocupante do cargo de secretária, com dedicação exclusiva, integra o quadro ativo permanente do Ministério da Saúde, lotada no SUS- Estadual da Paraíba.
A Prefeitura sustenta que a acumulação está respaldada pela Constituição Federal, mas os fiscais entendem diferentemente e recomendaram ao Ministério da Saúde apurar a responsabilidade pela acumulação ilícita e solicitar o recolhimento dos valores pagos à secretária como médica do SUS, no total de R$ 128 mil (de janeiro de 2001 a junho de 2003), além de regularizar a cessão da servidora, com ônus para a Prefeitura de Caaporã.