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Discurso do ministro Waldir Pires, chefe da Controladoria-Geral da União, no sorteio dos 26 municípios que serão fiscalizados quanto à aplicação de recursos públicos federais
Presidente Lula, Presidente da República do Brasil;
D. Marisa Letícia Lula da Silva, nossa primeira dama;
Senhor Presidente em exercício da Caixa Econômica Federal;
Minhas senhoras e meus senhores.
Nós hoje vamos fazer a segunda etapa dessa experiência de controle de recursos públicos, com a grata satisfação da presença do Presidente Lula. Na primeira experiência nós tivemos a satisfação da presença de D. Marisa e do Vice-presidente José Alencar. Hoje nós vamos consolidar uma experiência que anteriormente nunca se realizou neste País, nunca na República.
A construção da democracia precisa de participação. Essa é uma base essencial do pensamento e da luta do Presidente Lula. Participação para que ela resulte na transformação da vida do nosso povo, nas mudanças, na capacidade de nós assegurarmos a toda nossa população – a todas as brasileiras e a todos os brasileiros - a esperança de poderem ser felizes. Portanto, é essencialmente o comportamento do Estado democrático – o Estado democrático preocupado com a maneira como se arrecadam os tributos, para a aplicação em benefício das necessidades da nossa população e do desenvolvimento nacional; o Estado democrático preocupado com o controle, com a transparência, para que esses recursos venham da população e possam ser efetivamente destinados, por seu interesse, a reduzir seus sofrimentos e assegurar uma caminhada de transformação e de afirmação nacional do Brasil.
No primeiro sorteio nós fizemos o teste inicial. Selecionamos cinco municípios, representantes das cinco regiões geográficas do Brasil – Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-oeste. Fizemos a escolha e já estamos com os resultados iniciais, num mecanismo que é o de fechar esse ciclo em um mês. Essa é uma prática também nova no comportamento dos trabalhos de controle. E o controle é a base da tarefa que o Presidente da República me outorgou. Duas tarefas essenciais: controle da aplicação do dinheiro público e defesa do patrimônio público, para que nós tenhamos a convicção de que estamos vivendo um período novo no Brasil, uma retomada das suas esperanças e um propósito de construção de uma sociedade de todos.
De modo que hoje nós vamos fazer a segunda etapa. Nós vamos hoje para um universo de municípios de até 100 mil habitantes. Não são os municípios, eu insisto em caracterizar: são as áreas municipais. Porque é nessas áreas municipais, em seus territórios, que moram todas as brasileiras e todos os brasileiros, e é aí onde são gastos os recursos públicos federais. Nossa competência é exclusivamente em relação à aplicação dos recursos federais.
Quando nós selecionamos uma área territorial municipal, aí nós iremos cumprir o dever de fiscalizar todos os recursos federais que são da nossa competência, que se apliquem por intermédio de gestores federais dos nossos ministérios, que se apliquem por intermédio dos gestores estaduais, através dos convênios ou de acordos, ou que se apliquem através de gestores municipais, também por acordos, convênios e outras delegações.
Hoje nós faremos a seleção de 26 áreas municipais, uma para cada Estado. Todos os Estados, desta vez, terão um município escolhido. Nós, portanto, trabalharemos com um universo de 5.328 municípios. Isso corresponde a 96% do total de municípios do Brasil. Ficam de fora apenas 231 municípios. Nós teremos esta semana, a partir de amanhã, para fazermos o levantamento, nos nossos setores de planejamento, de todos os recursos federais, de todos os ministérios da União transferidos para cada uma dessas áreas municipais. Finalizaremos esse trabalho até o fim desta semana. Na próxima segunda-feira, estarão em campo as forças cumpridoras desse dever de cidadania e de fiscalização em todos esses municípios sorteados e lá diretamente vão verificar como estão sendo feitas essas aplicações.
É claro que nos interessam os documentos, as notas fiscais etc., mas a essência da fiscalização é a obra em si, a política pública de governo em si mesma; é verificar se essa política pública está sendo realizada e se a obra efetivamente foi realizada. Na terceira semana, nós já estaremos com o trabalho de campo todo concluído. Isso mobilizará mais de 200 técnicos, auditores, analistas, todos funcionários de carreira e concursados, com larga experiência. Eles estarão consolidando toda essa investigação, toda essa fiscalização. Na quarta semana, nós já daremos a informação à opinião pública do Brasil, em vez do sistema em que nós teríamos um prazo que por vezes se alonga por anos e anos, e tantas vezes acaba terminando na própria prescrição.
A luta pela impunidade, a luta pela transparência, a tentativa de vencer, como haveremos de vencer a corrupção, nós estamos aqui fazendo o cumprimento de um compromisso de campanha do Presidente Lula e da sua vida, que é o de que o dinheiro do povo deve estar dedicado essencialmente a reduzir as enormes desigualdades da nossa população e a construir a caminhada difícil, mas segura, do desenvolvimento nacional.
Presidente, no último sorteio que nós fizemos, nós tivemos a presença de D. Marisa, do Vice José Alencar e de outros companheiros. Nós constatamos coisas que evidentemente vão ser já nesta semana devidamente apreciadas e encaminhadas para as autoridades civis, administrativas e criminais. Por exemplo, nós encontramos coisas ainda lamentáveis, senhor Presidente. Eu sei que o senhor deseja, como eu, num determinado instante mais adiante, que nós tenhamos aqui aplausos para dar prêmios aos gestores que executam a aplicação do dinheiro público com absoluta isenção, com absoluta idoneidade. É isso que nós desejamos. Mas isso só será possível com participação popular, direta, só com a população se organizando para criar uma cultura de defesa da cidadania.
Então, por exemplo, Presidente, no município de Colônia do Piauí, nós constatamos que faltou distribuição de merenda escolar por mais de dez meses em 2002; que não houve licitação para a aquisição de alimentos e que faltou a distribuição por mais de 20 dias em 2003.
Constatamos, ainda, que no Programa Recomeço, escola de jovens e adultos, de R$ 34.425,00 recebidos, foram comprovados apenas R$ 11.217,00; não há notícia de R$ 23.207,00.
Na aplicação, por exemplo, com o Ministério da Integração Nacional e o Banco do Nordeste, dos financiamentos do Pronaf (Programa Nacional de Apoio à Agricultura Familiar), foram 24 financiamentos examinados. Todos se encontram inadimplentes. Todos. Apenas em um deles constatou-se a presença da vigilância e da fiscalização prévia da análise de risco. Nos outros todos não houve a visita dos técnicos do Banco do Nordeste, que deveriam, previamente, avaliar as condições do financiamento. Então, todos estão inadimplentes.
São casos simbólicos. No caso do município de Rio Preto da Eva, no Amazonas, a força de trabalho da Controladoria constatou o superfaturamento de R$ 57 mil em obras de drenagem em áreas suscetíveis de malária; desvio em programa habitacional com recursos do FGTS. Recebida a importância de R$ 12.762,00, esses recursos não foram empregados para casas populares. Foram empregados, senhor Presidente, para a construção de uma pousada.
Projeto Morar Melhor, do Ministério da Agricultura. Quinze casas contratadas. Foram construídas apenas três; e nas três construídas, os nossos fiscais constataram, estavam prepostos do empreiteiro da obra. Nenhuma casa destinada ao povo que precisa morar. Do sistema de abastecimento de água, que é um projeto razoavelmente grande, porque é um projeto de R$ 2.800.000,00, foram construídos oito pontos de captação de água em 15 bairros da cidade; o sistema de tratamento não funciona em nenhum deles; e há água parada em dois pontos propícios à propagação da dengue.
Nós fizemos aqui apenas uma alusão aos casos mais sintomáticos. Em Castelândia, em Goiás, no convênio com o Ministério da Agricultura para a construção de um centro de geração de renda com trabalhos de confecções houve um desvio dos objetivos; não houve a contrapartida do município, e o centro está cumprindo uma outra finalidade, sendo destinado ao programa de erradicação do trabalho infantil. Transformou-se simplesmente numa casa e não está executando as tarefas de centro de geração de renda, de geração de empregos.
No Balneário Arroio do Silva, nós constatamos que uma verba destinada à Apae, pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, não chegou à Apae. Desejamos saber o destino efetivo dela. Em Ribeirão Corrente, nós tivemos problemas de natureza formal. Os recursos foram destinados ao programa PAB, que é o programa de piso de atenção básica da saúde, e foram encontrados os recibos de realização das despesas, mas esses não eram comportados dentro das obrigações do programa. Isto é, recursos que foram utilizados em combustível para ambulância, pagamento do próprio pessoal da saúde. São, portanto, questões de orientação e treinamento, de informação.
De modo que esse é o quadro que nós estamos constatando. A idéia é que um dia nós cheguemos aqui e tenhamos a possibilidade de prêmios, ao fim de algum tempo, de alguns meses, de alguns anos, ao excelente gestor em que terá se transformado cada um dos gestores nos planos municipal, estadual e federal.
Portanto, nós precisamos organizar em nosso País e consolidar essa cultura de participação, do que é o destino do dinheiro público, o que é oriundo do processo democrático, para serem votadas as verbas e as dotações, que a sociedade local e em toda a parte seja capaz de se organizar nos seus conselhos. Nos conselhos, invariavelmente, as informações não são boas, são péssimas, porque na maioria dos casos os conselhos estão comprometidos com o agrupamento local, em torno do exercício do poder local, que é um velho problema da dimensão cultural brasileira, do clientelismo, do personalismo, do coronelismo, da visão patrimonialista que ainda domina grande parte do País, uma organização de privilégios do setor público em benefício exclusivamente de elites dominantes da sociedade local ou regional.
Senhor Presidente, nós hoje vamos continuar os sorteios e vamos abrir com 26 Estados. Vossa Excelência vai assistir os primeiros deles e depois vai cumprir suas tarefas como dirigente do Brasil em outras missões que estão marcadas. De qualquer forma, temos muita alegria em estar aqui com o senhor; muita alegria para o pessoal da Controladoria, que é organizada para isso, defender o patrimônio público, portanto, patrimônio do povo brasileiro, terá suas funções exercidas por instrução de Vossa Excelência e pela natureza mesma de nossos deveres como democratas neste País.
Obrigado, Presidente.