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CGU aponta irregularidade na liberação de recursos do FINOR para a empresa METASA
Em relatório entregue ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, segunda-feira à noite, a Corregedora-Geral da União, Ministra Anadyr de Mendonça Rodrigues, confirmou a existência de indícios de irregularidades na liberação de recursos do Fundo de Investimento do Nordeste – FINOR repassado à empresa Metais Seridó S/A, da qual foi sócio majoritário o Senador Fernando Bezerra.
A Corregedoria-Geral da União, através de investigações e pedidos de informações dirigidos especialmente à Secretaria Federal de Controle Interno, do Ministério da Fazenda, recebeu a confirmação da possível existência de uma Nota Fiscal irregular, de n° 000185, datada de 28 de agosto de 1997, emitida pela empresa Usimec – Serviços Mecânicos e Comércio Ltda., de Parnamirim, região Metropolitana de Natal, no valor de R$ 559 mil 686, a qual teria sido apresentada pela Metasa à Sudene, como comprovante de despesas efetuadas no projeto. A CGU, neste caso, irá imprimir maior celeridade às medidas administrativas que serão adotadas, "para a completa elucidação dos fatos e identificação dos envolvidos", afirma o relatório apresentado ao Presidente da República.
Cancelamento do projeto
A primeira providência recomendada pela CGU ao Ministério da Integração Nacional é o imediato cancelamento do projeto Metasa, com a instauração de processo administrativo disciplinar "para averiguar a responsabilidade de todos os servidores e demais agentes públicos ou políticos envolvidos, por serem "veementes os indícios de improbidade". O relatório da CGU afirma, ainda, que será solicitado, à Advocacia-Geral da União, o exame da viabilidade do ajuizamento de medida cautelar de decretação de indisponibilidade dos bens dos envolvidos.
Além disso, a Consultoria Jurídica do Ministério da Integração Nacional será instada a rever parecer emitido a respeito da participação acionária de Senadores e Deputados em projetos incentivados por Fundos de investimentos instituídos pelo Poder Público, promovendo a necessária audiência da AGU, para competente manifestação com força normativa para toda a Administração Federal. Foi recomendado, também, que o Ministério da Integração Nacional proceda à completa fiscalização dos projetos incentivados com recursos do FINOR e FINAM, com vistas a apurar os desvios de aplicações, paralisação ou suspensão de obras ou serviços de implantação do empreendimento, descumprimento do cronograma por falta de aporte de recursos do grupo empreendedor; alteração ou troca do controle acionário sem prévia anuência e outras irregularidades que possam exigir a promoção dos procedimentos tendentes ao cancelamento do projeto.
Por fim, recomendou-se completo levantamento de todos os recursos liberados pelo FINOR e FINAM, elaborando-se inventário completo dos projetos existentes, por meio de comissões especialmente designadas para inventariar cada Fundo, com o objetivo de apresentar, em data a ser aprazada, a situação de todo o acervo existente, os projetos em curso, eventuais irregularidades e os meios para apuração.
Com relação aos prejuízos causados aos cofres públicos, além de ser solicitado à AGU o exame da conveniência de ser requerida em Juízo a indisponibilidade de bens dos envolvidos, será dado conhecimento ao Ministério Público Federal e ao Tribunal de Contas da União (TCU) da instauração do processo, para apuração dos indícios da prática de ato de improbidade, por parte de servidores públicos, a fim de que esses órgãos possam designar representantes para acompanhar o procedimento administrativo. Cópias dos documentos indicativos de cometimento de crimes contra a ordem tributária, como notas fiscais inautênticas, serão encaminhadas ao Ministério Público Federal para que possa, se for o caso, promover o ajuizamento de ações penais.
Financiamento
Antes de relacionar as medidas sugeridas para imediata adoção, com vistas ao ressarcimento aos cofres públicos e possíveis penalidades aos agentes envolvidos, o relatório da Corregedoria-Geral da União elaborou um histórico sobre os procedimentos do FINOR, criado em 1974, administrado pela SUDENE e tendo como banco operador o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), e que teve, como objetivo principal, promover a diminuição dos acentuados desníveis sócio-econômicos entre a região nordeste e as diferentes regiões do País.
Nesse sentido, a norma legal facultou às pessoas jurídicas a destinação de parte do imposto de renda devido para aplicação em empreendimentos localizados na região nordeste, mediante o qual o optante pelo FINOR destinaria até 24% do imposto de renda devido ao Fundo e receberia Certificado de Investimento, correspondente àquele valor, negociável em Bolsas ou leilões especiais promovidos pelo BNB e supervisionada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), nos quais poderiam ser trocadas por ações ou debêntures das empresas incentivadas com recursos do FINOR.
Para se beneficiar da colaboração financeira do FINOR os interessados apresentavam à SUDENE carta-consulta contendo informações e elementos indicando a empresa e seus acionistas, comprovantes de capacidade econômica e financeira e da idoneidade cadastral de todos os componentes do capital votante, produção prevista, quantidade física e valor, investimento previsto, incorporação estimada dos recursos. Uma vez aprovado o projeto por resolução do Conselho Deliberativo da SUDENE, a empresa dispunha de 9 a 12 meses, dependendo do tipo do empreendimento, para iniciar a implantação do projeto, considerado iniciado quando realizasse um mínimo de 20% dos gastos fixos previstos para o período, passando, então, a SUDENE a autorizar liberações de recursos do FINOR.
A liberação de cada parcela deveria coincidir com a implantação das etapas previstas no cronograma físico-financeiro, sendo que, para cada liberação, corresponderia uma contrapartida do grupo empreendedor. Quaisquer modificações, como recomposição do quadro acionário, ingresso de novos acionistas no capital votante, relocação do empreendimento, incorporação, fusão, cisão ou transferência do acervo da empresa titular, deveria ter a prévia anuência da SUDENE.
A fiscalização dos projetos era executada pela SUDENE e, a partir dos resultados dessas fiscalizações, é que novos recursos do FINOR seriam liberados ou, em se verificando desvios de aplicações, seria determinada a paralisação ou suspensão das obras ou serviços de implantação do empreendimento.
Projeto Metasa
O projeto Metasa foi aprovado pelo Conselho Deliberativo da extinta SUDENE por meio da Resolução nº 9.721, de 31 de março de 1986, que considerou sua implantação como de interesse para o desenvolvimento do Nordeste e, consequentemente, merecedor da colaboração financeira do FINOR. O projeto tinha por objeto a implantação de uma unidade industrial no município de Currais Novos, RN, destinada à produção de 200 toneladas de ferro tungstênio e 200 toneladas de carboneto de tungstênio por ano, visando proporcionar vantagens sócio-econômicas para a região, geração de mão-de-obra, com a criação de 145 novas oportunidades de empregos diretos e estáveis e entrada de divisas com as exportações programadas, sendo o investimento total do projeto estimado em R$ 11 milhões 634 mil, em valores atualizados.
Classificado na faixa "A" de prioridade, o limite máximo de participação do FINOR foi fixado em 60%, cabendo à empresa METASA entrar com 40% do restante. À época da aprovação do projeto, a Empresa ainda não contava com a participação acionária de Fernando Bezerra, que em 1989 adquiriu da Construtora Odebrechet (detentora de 60% das ações da METASA), 30% das ações com direito a voto, através da ECOCIL – Empresa de Construção Civil Ltda., assumindo os cargos de Presidente do Conselho de Administração e de Diretor-Presidente da METASA, sendo que os outros 30% foram adquiridos pela POLISINTER – Indústria e Comércio Ltda.
Embora a METASA devesse iniciar a implantação do empreendimento em 12 meses, ele somente foi iniciado 54 meses depois, embora a primeira liberação do FINOR tenha ocorrido em fevereiro de1991. E, dezembro de 1994, dias antes de ser investido no mandato de senador, Fernando Bezerra renunciou aos cargos que exercia na empresa, entrando em seu lugar o filho, Hênio de Araújo Bezerra’, sendo que o outro filho, Sílvio de Araújo Bezerra passou a ser Diretor-Comercial, e sua mulher, Cândida Maria de Araújo Bezerra, membro do Conselho de Administração.
Embora tenha renunciado aos cargos de direção da empresa, o senador Fernando Bezerra continuou sendo o seu acionista controlador, em detrimento à vedação contida na Constituição Federal, em seu artigo 54, II, a, uma vez que, à época, além de possuir 24% das ações , possuía, ainda, 98% das ações da ECOCIL, detentora de 40% da composição acionária do projeto METASA. Em maio de 1998, o senador Fernando Bezerra se desfez das ações da METASA, assumindo, um ano mais tarde o cargo de Ministro da Integração Nacional.
A partir daí passa a ser o acionista majoritário da empresa, Luiz Carlos Araújo Teixeira de Carvalho com 40,2% das ações, acionista de outros projetos beneficiários de recursos do FINOR, nos quais foram identificados, também, vestígios de irregularidades, além de ser sócio da esposa do senador, Cândida Maria de Araújo Bezerra, no projeto Caprinos do Nordeste S/A.
Nos quase dez anos em que o empresário e o senador Fernando Bezerra permaneceu no controle acionário do projeto METASA, foram liberados pelo FINOR, em valores atualizados, mais de R$ 3 milhões, correspondente a 50% dos recursos previstos, sendo que R$ 939 mil foram liberados no período em que já havia sido empossado no cargo de senador. Depois disso a empresa foi beneficiada com outros R$ 3 milhões e 200 mil, totalizando um montante de mais de R$ 6 milhões, correspondente a 96% dos recursos previstos registrando-se, entretanto, a implantação de apenas 51% do projeto aprovado, com faturamento de 3,6% do previsto, gerando unicamente um emprego dos 145 esperados.
Fiscalização
Desde a primeira fiscalização realizada no projeto, em 1990, foi anotada a ausência da escritura definitiva do terreno, e, na segunda fiscalização, 6 meses depois, foi apresentada uma escritura com apenas 3,852 hectares, correspondente a 34% da área prevista, não havendo nos relatórios de fiscalização posteriores, nenhum registro da regularização das pendências.
A fiscalização, ao longo dos quinze anos de implantação do projeto, considerou seu ritmo insatisfatório, mas sempre manifestavam favoravelmente a novas liberações, por considerar que a "confiabilidade" e a "viabilidade" do projeto eram positivas. Relatórios posteriores, no período de 1996/1998, registraram a ocorrência de irregularidades que comprometiam a viabilidade do projeto, tais como: atividades paralisadas por dificuldade de obtenção de matéria prima e indefinição da estrutura organizacional e administrativa. Entretanto, nenhuma medida tendente a promover o cancelamento do projeto jamais foi suscitada.
A Corregedoria-Geral da União aponta como falhas, o acompanhamento e fiscalização da extinta SUDENE, a quem competia promover o cancelamento do projeto, assim como, a Consultoria Jurídica do Ministério da Integração Nacional, em razão do evidente desenvolvimento irregular do empreendimento. As obras de sua implantação foram executadas pela empresa ECOCIL, de propriedade do senador Fernando Bezerra, no período de 1990 a 1993, contrariando norma que não admite a contratação de empresas do mesmo grupo empresarial beneficiário, excepcionando o caso de reconhecida competência no ramo, desde que previamente aprovado pela SUDENE, o que efetivamente não ocorreu. A METASA contratou também a empresa CEL – Construções especializadas Comércio e Industria Ltda. Acionista do mesmo empreendimento, para execução de obras na Mina Bodó/RN e na unidade industrial da contratante, recebendo pagamento total da ordem R$ 3 milhões e 200 mil.
Outra irregularidade teria ocorrido durante a administração de Luiz Carlos Teixeira de Carvalho no controle da METASA, quando teriam sido emitidas notas fiscais supostamente "frias" pela empresa Floresta Máquinas e Motores Ltda., no valor de R$ 1 milhão 990 mil, em favor da METASA, as quais foram declaradas como falsas pela Diretoria de Administração Tributária da Secretaria de Finanças do Estado do Rio Grande do Norte, bem assim pela própria empresa Floresta, denotando, mais uma vez a utilização de documentação fiscal falsa para comprovar a realização de inversões.
A CGU conclui, diante das apurações feitas, que as irregularidades registradas indicam a necessidade da implementação de procedimentos previstos para o cancelamento do projeto, como as conseqüentes medidas administrativas e judiciais previstas na legislação específica, de responsabilidade do Ministério da Integração Nacional.