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CETENE de olho no futuro da energia renovável com pesquisa sobre células solares de perovskita
A equeipe de pesquisadores buscam soluções para viabilizar o desenvolvimento de módulos fotovoltaicos mais eficientes, menos nocivos e com menor custo de produção.
Quando descobriu a perovskita nos montes Urais, na Rússia, em 1839, o alemão Gustav Rose certamente não imaginava que 184 anos depois esse tipo de mineral seria uma das grandes apostas para o futuro da energia renovável no mundo. A substância – cujo nome é uma homenagem ao mineralogista russo Lev A. Perovski – tem sido estudado com o objetivo de viabilizar a substituição de elementos por outros menos danosos e de manejo mais barato para a produção de células fotovoltaicas, capazes de transformar a energia do sol em elétrica. “Sendo o Nordeste uma das regiões com maior incidência solar, perdendo apenas para a Cordilheira dos Andes, atuar em energias renováveis que utilizem a energia do sol para gerar energia elétrica é de extrema importância”, defende a pesquisadora titular Giovana Machado, que no Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste (CETENE) lidera o projeto de produção de células de perovskita.
Giovana e sua equipe pesquisam otimizações nessa tecnologia emergente para criar células solares mais eficientes para o consumidor final e para o meio ambiente. A adição de soluções sustentáveis, inclusive, é um compromisso previsto no Plano de Desenvolvimento da Unidade até 2030. “Esse sempre foi um propósito quando eu entrei aqui no CETENE: que a tecnologia possa ser transferida e atender às demandas da sociedade”, reforça Giovanna. A perovskita engloba uma grande classe de minerais possuidores de uma estrutura molecular fixa, que pode ser modificada alterando determinadas propriedades. “Desde o início o nosso trabalho é com perovskitas inorgânicas, mas a gente pretende também trabalhar com perovskitas orgânicas a partir de agora, porque chegaram os equipamentos que vão propiciar a gente lidar com esses materiais”, explica o pesquisador Cícero Inácio, um dos integrantes da equipe de Giovanna como bolsista do Programa de Capacitação Institucional (PCI) do CETENE, referindo-se à recente renovação do parque tecnológico do centro de pesquisa.
Cada pesquisador PCI da equipe está envolvido em uma área específica e complementar na constituição de uma célula fotovoltaica: enquanto Cícero atua no aumento da estabilidade do mineral, Calink Santos estuda o uso de solventes com responsabilidade socioambiental e Taisa Dantas busca melhoramentos na interação energética de interfaces. Contribui ainda Tiago Soares com estudos sobre grafeno, um componente que aumenta a eficiência dos módulos.
OPORTUNIDADE DE CRESCIMENTO - Um dos desafios enfrentados pelos pesquisadores do CETENE no estudo da perovskita é como aumentar sua estabilidade: atualmente, a vida útil fica na faixa de 3 a 4 anos. Uma placa solar de silício, por exemplo, dura em torno de 25 anos. Cícero encara a circunstância não como obstáculo, mas como oportunidade e mantém o otimismo. “Eu diria que daqui a 10 ou 20 anos teremos dispositivos de perovskita”, completa o pesquisador. Pesquisadora mais recente a integrar o grupo de pesquisa, Taisa Dantas é responsável por promover melhorias nas interfaces metálicas das células solares.
Para isso, ela estuda maneiras de reduzir as chamadas band gaps, que são as distâncias entre as bandas de valência e de condução dos elétrons. Quanto menor essa distância, melhor será o transporte de carga energética entre as interfaces, resultando em células solares mais eficientes. Para isso, a escolha dos elementos é fundamental. Como eu optei por trabalhar com materiais sólidos, eu tenho que fazer sínteses. Os elementos que escolhi são óxidos de níquel, molibdênio e cobre, pois na literatura é dito que eles são bons semicondutores, explica Taisa.
Outro ponto de atenção nos estudos sobre perovskita é a presença do chumbo na estrutura molecular desse tipo de mineral. Embora tenha papel importante na composição, o chumbo é nocivo e exige cuidados no manuseio. “Umas dos objetivos do projeto é trocar o chumbo por materiais como estanho e bismuto, tentando manter as propriedades da composição”, explica a pesquisadora Calink Santos. A especialista também busca alternativas para a substituição de solventes – os usados atualmente podem causar câncer a médio e longo prazo.
De acordo com ela, encontrar substitutos adequados impacta inclusive na prática diária da pesquisa, que com frequência conta com procedimentos de segurança muito rígidos. “Normalmente a gente precisa das gloveboxes para ficar isolado em relação aos materiais nocivos. Você tem que trabalhar em um ambiente controlado, o próprio manuseio é dificultado para fazer, então isso também é um limitante dentro da tecnologia”, revela Calink.
Segundo ela, a solução passa por viabilizar o trabalho em atmosfera ambiente, fazendo uso de elementos que não prejudiquem a saúde de quem manuseia e que também não tenham seu desempenho impactado pela umidade, por exemplo. Nesse sentido, a pesquisadora tem investido na substituição de camadas de filmes normalmente usadas na composição de células solares por uma integração através de nanocristais e uso de água no lugar dos atuais solventes. “A gente está fazendo dispositivos em temperatura ambiente e conseguimos quase 8% de conversão [de energia].
É algo que não se compara em relação às placas de silício, que são comerciais, mas para escalas menores já seriam utilizados para, por exemplo, a Internet das Coisas”, explica Calink. Em mais um avanço no trabalho, ela observa também que o uso de nanocristais e água tem permitido uma solubilização mais uniforme na região do substrato em relação à sobreposição de camadas de filme com solventes.
ALTERNATIVA PARA O FUTURO - De modo geral, chama atenção a velocidade com que as pesquisas sobre perovskitas avançam em todo o mundo, revelando seu potencial. “As placas de silício dominam o mercado, porém as perovskitas, que são materiais emergentes, adquiriram eficiência em pouco tempo de estudo. O silício levou de 50 a 60 anos para chegar à tecnologia atual, enquanto a perovskita, na margem de 15 anos, já alcançou uma eficiência de conversão de luz maior do que o silício”, pontua Cícero Inácio.
Assim como sua equipe de pesquisadores, Giovanna Machado também olha para o fator tempo com entusiasmo. “Dez anos para uma transferência de tecnologia é um curto prazo. Isso vai depender muito dos investimentos do governo”, destacou a diretora, reforçando ainda que, enquanto centro de pesquisa, o foco do CETENE é a transferência de tecnologia. “Nós não vamos produzir em larga escala células de perovskita. Nós vamos desenvolver a tecnologia para que ela seja aplicável em larga escala”, complementa. Para tanto, o CETENE tem investido pesado em qualificação.
O centro de pesquisa tem renovado seu parque tecnológico, ampliando a oferta de serviços tanto para o público interno quanto para o público externo de pesquisadores e empresas parceiras. Além disso, em apenas dois anos conseguiu subir de 1 para 6 o seu Technology Readiness Level (TRL), o que atesta capacidade de apresentar protótipos finalizados de uma determinada tecnologia e testá-los em campo ou em ambientes reais. Graças a esse esforço, em 2023 o CETENE se tornou a unidade EMBRAPII de pesquisa e inovação.
Para saber mais sobre essa pesquisa, confira a reportagem completa em nosso canal do Spotify e aproveite para seguir o CETENE nas redes.
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