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Proteger as florestas secundárias no Brasil é crucial para a redução de emissões de gases de efeito estufa, apontam cientistas
Os cientistas mapearam as florestas brasileiras que cresceram, em três décadas, a partir de áreas anteriormente desmatadas (denominadas florestas secundárias), responsáveis pela remoção de mais de 784 milhões de toneladas de carbono da atmosfera. Essas florestas em crescimento compensariam, em parte, a emissão de gases devido aos desmatamentos, com importância para o ciclo da água e a biodiversidade. Mas, outros estudos apontam que, desde 2011, as florestas secundárias sofrem o desmatamento, em média, 40% a mais do que as florestas maduras.
C ientistas do Brasil, Reino Unido e Estados Unidos mapearam, pela primeira vez, as florestas secundárias em todos os seis biomas do Brasil (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal), no período entre 1986 e 2018, estimando que, aproximadamente, 26 milhões de hectares de florestas secundárias cresceram em áreas anteriormente exploradas (desmatadas) pelo homem. Em 30 anos (de 1988 a 2018), estimaram, também, que cerca de 784 milhões de toneladas de carbono teriam sido removidos da atmosfera. Isso equivale à 12% das emissões de carbono por desmatamento (6,7 bilhões de toneladas) para o mesmo período na Amazônia Brasileira.
Para essa estimativa, a equipe de pesquisadores utilizou os mapas do uso e cobertura da superfície terrestre gerados pelo Projeto MapBiomas ( https://mapbiomas.org )
Os estudos foram publicados, neste mês (agosto/2020), pela Revista Scientific Data da editora Nature , com o título “ Benchmark maps of 33 years of secondary forest age for Brazil ” (Mapas de referência de 33 anos de idade florestal secundária para o Brasil – https://rdcu.be/b6iK1 ).
Nessa pesquisa, os cientistas estimaram que o bioma Amazônia tinha, em 2018, aproximadamente, 15 milhões de hectares de florestas secundárias (mais da metade de todas as florestas secundárias do País) que cresceram entre 1986 e 2018 em áreas anteriormente desmatadas. O estudo também estima a idade dessas florestas, descobrindo que, em 2018, o bioma Mata Atlântica possuía as florestas secundárias mais antigas do Brasil.
A pesquisadora Liana Anderson, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden)- unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) é co-autora da pesquisa e orientadora do líder deste trabalho, o pesquisador doutorando Celso Silva Junior, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
“As florestas secundárias são florestas crescendo em áreas que já foram desmatadas, em geral para uso agrícola. Depois são abandonadas, muitas vezes com o intuito de descansar e recuperar o solo para posteriormente, entrar em um novo ciclo de produção.”, informa a pesquisadora do Cemaden. Explica que, como esta dinâmica é dependente das ações de corte e queima desta floresta, a identificação destas áreas e o entendimento do ciclo do uso da terra – nas diferentes regiões do País – auxilia os pesquisadores a identificar onde e quando haverá maior probabilidade do uso do fogo.
“Quando há queima de uma vegetação mais densa, há maior emissão de material particulado para atmosfera, o que impacta diretamente a saúde das pessoas, atingindo o sistema respiratório”, enfatiza Anderson. “Além disso, o fogo pode se espalhar e entrar nas florestas adjacentes, trazendo impactos não só para a biodiversidade e o estoque de biomassa da vegetação florestal, mas também contribuindo para aumento das emissões de gases de efeito estufa”, comenta a pesquisadora do Cemaden.
Desmatamento das florestas secundárias é 40% superior ao das florestas maduras
À medida que as florestas crescem e envelhecem, absorvem da atmosfera o CO 2 , principal responsável pelo efeito estufa, e estocam este carbono nas árvores. As florestas secundárias não são legalmente protegidas no Brasil e suas taxas de desmatamento são superiores às das florestas maduras.
Um estudo recente na Amazônia,(“ Unmasking secondary vegetation dynamics in the Brazilian Amazon”- Desmascarando dinâmicas secundárias de vegetação na Amazônia brasileira) (( https://iopscience.iop.org/article/10.1088/1748-9326/ab76db ), mostrou que desde 2011, o desmatamento das florestas secundárias é em média 40% maior que o das florestas maduras. O mesmo estudo estimou que 62% (aproximadamente 20 milhões de hectares) de todas as florestas secundárias que cresceram entre 1986 e 2017 na região da Amazônia brasileira foram desmatadas.
O pesquisador doutorando do INPE/MCTI, Celso Silva Junior, afirma que “por não serem legalmente protegidas e não possuírem um monitoramento sistemático dos seus ganhos e perdas, o futuro das florestas secundárias no Brasil se mantém incerto”. Explica que o potencial de contribuição dessas florestas para a remoção de CO 2 atmosférico ainda é subutilizado no País. São elevadas as taxas de remoção das florestas secundárias, que em muitos casos fazem parte do ciclo de uso da terra, por agricultores, inviabiliza seu uso como sumidouros naturais de carbono.
O pesquisador explica que, além de sua importância no combate à atual crise climática, absorvendo o dióxido de carbônico (CO 2 ) da atmosfera, as florestas secundárias são importantes para a recuperação da biodiversidade, a garantia do suprimento de água e a polinização, promovendo assim, o bem-estar da população. “Esse fato é preocupante, visto que todas as florestas secundárias – que cresceram no Brasil entre 1988 a 2018 – compensariam apenas um décimo de todas as emissões por desmatamento da Amazônia para o mesmo período”, complementa Silva Junior.
Década da Restauração do Ecossistema
Os estudos sobre florestas estão em evidência, desde que a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) proclamou a década de 2021-2030 como a Década da Restauração do Ecossistema, uma das principais soluções baseadas na natureza ( Nature Based Solutions ) para atender a um amplo conjunto de metas para o desenvolvimento sustentável global. “Além de permitir aplicações científicas, o conjunto de dados que geramos pode subsidiar leis para a proteção das florestas secundárias. Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC)”, comenta Silva Junior.
O coordenador do grupo de pesquisa TREES (Laboratório de Ecossistemas Tropicais e Ciências Ambientais) , Luiz Aragão, pesquisador titular do INPE, co-autor da pesquisa, afirma que o Brasil tem todos os elementos para construir um plano estratégico, visando o desenvolvimento sustentável do País e liderança mundial para atingir este desafio. “A ciência brasileira tem a capacidade de prover auxílio técnico e produtos para a tomada de decisão, como também validam as afirmações de muitos cientistas de que o Brasil pode ser o líder mundial no combate as mudanças climáticas.”, enfatiza Aragão.
A apresentação do artigo “ Benchmark maps of 33 years of secondary forest age for Brazil ” é iniciada indicando que a restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares de florestas até 2030 estão entre as principais estratégias de mitigação para reduzir as emissões de carbono, dentro das metas nacionais assumidas no Acordo de Paris. O estudo e a base de dados produzida podem ser acessados gratuitamente nos endereços https://rdcu.be/b6gj3
Fonte: Ascom/Cemaden