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Cemaden analisa as chuvas extremas de 2021, ocorridas no norte de MG e sul da BA, com abordagem no monitoramento e alertas
Um estudo científico realizado por pesquisadores de diversas áreas do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) – unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) - avalia as condições meteorológicas em novembro-dezembro de 2021, em especial de 22 a 29 de dezembro, ocorridas na região do sul da Bahia e norte de Minas Gerais, quando choveu até 300 mm acima da média. Analisando as inundações agravadas por eventos extremos de chuvas, o estudo discute o monitoramento e emissão de alertas de risco desses desastres pelos órgãos governamentais, que ajudaram a reduzir fatalidades e minimizar danos e perda de propriedade.
O estudo aponta que as chuvas extremas recordes aumentaram em todo mundo na última década, algumas provavelmente são consequência das mudanças climáticas. Porém, as vulnerabilidades a desastres naturais - como inundações e deslizamentos – aumentaram devido ao aglomerado da população em áreas suscetíveis a inundações, além do uso insustentável da terra em áreas urbanas e rurais.
O artigo científico foi divulgado, no dia 20 janeiro deste ano (2023), na publicação internacional da Natural Hazards da Springer Nature - com o título “ Heavy rainfall associated with floods in southeastern Brazil in November–December 2021” ( Fortes chuvas associadas a enchentes no sudeste do Brasil em novembro-dezembro de 2021). Os estudos coordenados pelo climatologista José Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden, tiveram a participação dos pesquisadores de variadas áreas do Cemaden, de pesquisadora do INMET-Instituto Nacional de Meteorologia e de pesquisador da Universidade Estadual de Maringá-UEM.
ZCAS
A Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) - um dos principais sistemas meteorológicos causadores de chuvas na região Centro-Oeste e Sudeste do Brasil (corredor de nuvens desde o sul da Região Amazônica até o Oceano Atlântico) – foi anormal no período mais chuvoso, entre os dias 22 e 29 de dezembro de 2021.
Houve uma convecção intensa (transferência de calor), em movimento vertical ascendente e convergência de umidade. Com essa convergência de umidade ocorreu o “choque” de ventos vindos de direções opostas nos baixos níveis da atmosfera. A convergência de ventos normalmente está associada a uma convergência de umidade e movimentos ascendentes do ar, que formam as nuvens e as chuvas.
A ZCAS em uma atmosfera úmida com extensa precipitação e solo saturado, atuando por vários dias, produziu anomalias significativas de umidade aliadas a constantes movimentos verticais e grandes áreas de convergência de baixo nível. Com várias outras associações de fenômenos climáticos ocorreu a precipitação anômala.
Impactos e o monitoramento das chuvas extremas de 2021
Em 28 de dezembro de 2021, o governo da Bahia informou que 471.009 pessoas foram afetadas pelas fortes e persistentes chuvas nos últimos 30 dias daquele período. Cerca de 62.796 pessoas foram deslocados de suas casas. As fortes chuvas desencadearam inundações extremas, levaram ao colapso de duas barragens, além de causar enormes perdas econômicas.
Um total de 92 alertas hidrológicos foram emitidos pelo Cemaden para as regiões do sul da Bahia e norte de Minas Gerais , entre os dias de 22 até 29 de dezembro. Nessas mesmas regiões, foram registradas 45 ocorrências de enchentes durante esse período, concentrando o alto risco de inundação nos dias 24 e 25 de dezembro.
O monitoramento do Cemaden melhorou a previsão do quadro da situação meteorológica e hidrológica, tendo identificadas e monitoradas as chuvas muito fortes. Como resultado, o alto risco de inundação foi melhor previsto e a população foi avisada. Desse modo, diminuiu-se, consideravelmente, os impactos e perdas de vidas, comparada ao evento de 2011, no Rio de Janeiro.
O Cemaden, com o auxílio de outros órgãos federais - como o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e o Serviço Geológico Brasileiro (CPRM) - identificou riscos hidrológicos altos e muito altos de enchentes na região. Nesse momento, boletins diários de risco hidrológico do Cemaden foram enviados ao Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), que comunicou essa previsão às polícias civil, municipal e estadual e serviços de emergência.
Os Boletins diários de Previsão de Risco, elaborados pelo Cemaden, indicaram risco moderado para as localidades do sul da Bahia até o dia 22 de dezembro. Até o dia 23 de dezembro, a área com alerta de risco se estendeu ao norte de Minas Gerais e ao Espírito Santo.
Uma previsão de alto risco de inundações para o sul da Bahia e norte de Minas Gerais foi feita no dia 24 até 25 de dezembro. Esse alto risco se estendeu a grandes partes dessa região, permanecendo no sul da Bahia até 30 de dezembro. Esses boletins de Risco Geo-Hidrológicos estão disponíveis, diariamente no site do Cemaden, podendo ser acessados pelo link https://www.gov.br/cemaden/pt-br/assuntos/riscos-geo-hidrologicos
Panorama mundial das inundações entre 2000 e 2019
Globalmente, as inundações são o tipo mais comum de desastre. Representam 44% do total de eventos entre 2000 e 2019. As inundações afetaram mais pessoas do que qualquer outro tipo de desastre no século XXI.
Conforme dados do Escritório das Nações Unidas para Redução do Risco de Desastres (UNDRR), no geral, nas últimas duas décadas, uma média de quase 200 milhões de pessoas foram afetadas, todos os anos no mundo, por desastres relacionados ao clima. Em média, esses desastres causaram quase 60.000 mortes, anualmente, entre 2000 a 2019.
Eventos extremos no Brasil e na região Sudeste
No Brasil, o censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que 84% dos brasileiros vivem em cidades e aglomerados urbanos. A urbanização ocorreu em um ritmo caótico e não planejado e a frequência cada vez maior de eventos climáticos extremos pode piorar.
O aumento dos riscos meteorológicos, combinado com maior população vivendo em áreas de alto risco, desencadeia desastres como deslizamentos de terra e inundações.
O estudo do Cemaden aponta que mais de 5 milhões de pessoas, a maioria pobres e vulneráveis, vivem em áreas urbanas e rurais com alta densidade populacional, e centenas de milhares de famílias vivem precariamente em encostas instáveis .
Inundações e deslizamentos de terra representam 70% dos desastres naturais no Brasil, sendo que 90% estão na região Sudeste. Essa região inclui os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
Com sua alta população, o Sudeste também sofre as maiores taxas de mortalidade total pelos desastres naturais. As regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro são as maiores cidades do Brasil e o Sudeste da América do Sul têm visto um aumento na precipitação total anual e na frequência de eventos extremos de chuva.
Recomendações dos pesquisadores
Segundo a Organização Mundial de Meteorologia (OMM), a América do Sul está entre as regiões com maior necessidade documentada para fortalecer os sistemas de alerta. Os alertas de risco múltiplo, como os emitidos pelo Cemaden, são essenciais para uma adaptação efetiva em áreas em risco, vulneráveis ao clima, água e extremos climáticos.
Os pesquisadores do Cemaden destacam que, no Brasil, a redução do risco de desastres deve ser considerado um aspecto essencial das estratégias de governança de desastres.
Entre as recomendações feitas para a governança de desastres naturais estão o aprimoramento do planejamento estratégico, com foco em mitigação e adaptação; a manutenção expansão dos sistemas de monitoramento como os do Cemaden, além da inclusão de milhares de áreas de risco para o monitoramento, em regiões densamente povoadas.
Além disso, os pesquisadores recomendam a melhoria contínua dos modelos de computador (para o monitoramento), bem como o avanço das pesquisas de qualidade sobre riscos potenciais desencadeadores de desastres. Tudo isso, somado à cultura do entendimento entre a população e os governos locais sobre os riscos de desastres, provocados pelas fortes chuvas, principalmente, nas áreas suscetíveis à inundações, mitigando os impactos e fatalidades.
Coordenado pelo climatologista José Marengo, participaram dos estudos os pesquisadores do Cemaden : Marcelo Seluchi (coordenador-geral de Operação e Modelagem); Ana Paula Cunha; Luz Adriana Cuartas; Demerval Gonçalves; Vinícius Sperling, Andrea Ramos (do INMET-Instituto Nacional de Meteorologia);Giovanni Dolif; Sílvia Saito; Fabiani Bender; Tarcio Rocha Lopes (UEM-Universidade Estadual de Maringá); Regina Alvalá (coordenadora de Relações Institucionais) e Osvaldo Moraes (diretor do Cemaden).
A íntegra do artigo científico “ Heavy rainfall associated with floods in southeastern Brazil in November–December 2021” pode ser acessado no link abaixo.
Fonte Ascom/Cemaden