Um estudo recentemente publicado na prestigiada revista Frontiers in Earth Science , intitulado “ Fire Responses to the 2010 and 2015/2016 Amazonian Droughts ” (Respostas do Fogo às Secas Amazônicas de 2010 e 2015/2016), estimou que durante as secas amazônicas de 2010 e 2015/2016 foram queimados cerca de 14.277 km 2 de floresta, o equivalente a 68% da somatória total das áreas desmatadas em 2010, 2015 e 2016 ( http://www.obt.inpe.br/prodes/dashboard/prodes-rates.html ).
O estudo apontou que, durante as secas extremas de 2010 e 2015, estava atuante o El Niño, nome dado ao fenômeno atmosférico-oceânico, que leva ao aquecimento das águas do Oceano Pacífico. No entanto, durante a seca extrema de 2016, foi observado, principalmente, o aquecimento das águas do Oceano Atlântico Norte. O fenômeno de aquecimento das águas dos oceanos desencadeia uma forte redução das chuvas na região amazônica. Essa redução provoca, além de impactos na produção agropecuária, o estresse hídrico nas florestas, tornando mais fácil a ocorrência e propagação do fogo.
Estudos anteriores relacionaram o aumento da ocorrência de queimadas na região amazônica à redução significativa de chuva durante as secas extremas de 1998, 2005, 2010 e 2015.
“No entanto, em nosso estudo, investigamos a seca de 2016, além das secas de 2010 e 2015. Pela primeira vez, realizamos uma análise dessas três secas na escala mensal, trimestral e anual.”, comenta o engenheiro ambiental Celso Silva Junior, estudante do Doutorado em Sensoriamento Remoto do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que liderou o estudo. O pesquisador informou que, também, foi investigado o comportamento da temperatura nesses anos, não realizada em estudos anteriores.
A pesquisa apontou que, nos anos de 2010 e 2015, as queimadas aumentaram, consideravelmente, quando houve uma redução de chuva, simultânea a um aumento de temperatura na escala mensal, trimestral e anual. Por outro lado, em 2016, a temperatura foi a maior contribuição para o aumento de queimadas na região. “Para nós foi uma surpresa ao descobrirmos que, em 2016, o aumento da temperatura foi o principal responsável pelo aumento do número de queimadas na região amazônica. Nesse mesmo ano, observamos um aumento expressivo de queimadas no início da estação úmida na região, quando é esperado uma redução acentuada da ocorrência de fogo na região”, afirma Silva Junior.
Os pesquisadores descobriram, ainda, que durante a seca de 2015/2016 o aumento da ocorrência de fogo foi resultado principalmente de incêndios florestais. Na seca de 2010, no entanto, esse aumento foi pela contribuição simultânea dos incêndios em florestas, em vegetação natural não florestais (Cerrado) e em áreas produtivas (Agricultura e Pasto).
“O desenvolvimento de um sistema de monitoramento de ocorrência de queimadas e incêndios florestais, voltados a identificar os atores que estão utilizando o fogo – no modelo em que o Cemaden está implementando na Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Acre – é uma primeira ferramenta para atribuir responsabilidades e ter maior controle sobre o uso do fogo”, destaca a pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Liana Anderson, participante do estudo. Ela explica que essa ação ajudará a minimizar o risco de queimadas se tornarem incêndios. No entanto, a pesquisadora reforça: “Este sistema não é suficiente para tratar a problemática dos incêndios florestais no País. Precisamos estruturar uma coordenação para a gestão do risco de incêndios florestais integrada nas escalas federais, estaduais e municipais, garantindo mecanismos de comunicação entre todas as partes interessadas.”, complementa a pesquisadora do Cemaden.
As duas secas analisadas pelos pesquisadores emitiram para a atmosfera, no total, o equivalente a 470 milhões de toneladas de Dióxido de Carbono, um gás do efeito estufa. O pesquisador do INPE e coautor do estudo, Luiz Aragão, explica que a quantidade de Dióxido de Carbono – emitido por consequência das queimadas na Amazônia Brasileira nos anos de 2010, 2015 e 2016 – foi o equivalente a 142% da meta brasileira para redução das emissões por desmatamento desse gás para o mesmo período. O Plano Nacional sobre Mudança do Clima, instituído pelo Decreto Federal Nº 6.263, de 21 de novembro de 2007, estabeleceu que as emissões de Dióxido de Carbono por desmatamento no Brasil, deveriam ser reduzidas em 110 milhões de toneladas de Dióxido de Carbono ao ano, entre 2006 e 2017.
Os autores do estudo sugerem que as emissões de Dióxido de Carbono por incêndios florestais, em anos de secas extremas na Amazônia, sejam incluídas nas políticas brasileiras de redução das emissões de gases do efeito estufa, assim como, as regulamentações sobre o uso de fogo, evitando a sua propagação de áreas produtivas para as florestas adjacentes.
Fonte: Ascom/Cemaden
Figura 1. Mapa da distribuição espacial das áreas com aumento e redução de chuva, temperatura e queimadas nos anos de 2010, 2015 e 2016. A primeira linha mostra em azul as áreas com aumento de chuva em relação à média (2006-2016), enquanto as áreas em vermelho a redução. A segunda e terceira linha mostram em vermelho as áreas com aumento de temperatura e queimadas, respectivamente em relação à média (2006-2016), enquanto as áreas em azul a redução. Fonte: Silva Junior et al. (2019).
Figura 2. Cicatrizes de incêndios florestais (em vermelho escuro) nas Terras Indígenas Alto Rio Guamá e Alto do Turiaçu, na divisa entre os estados do Pará e Maranhão. Em verde escuro são as áreas de floresta madura, em magenta as áreas de solo exposto, em verde claro as áreas de floresta secundária e em verde amarelado as áreas de pasto ou agricultura. (Fonte: Imagens Landsat-8, cortesia do Serviço Geológico dos Estados Unidos – USGS).