Notícias
PRÊMIO CAPES DE TESE
Pesquisador vencedor estudou o povo Nadëb
Com a tese Nomes da Transformação: os Nadëb e os outros no alto Uneiuxi o pesquisador Nian Pissolati Lopes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), venceu o Prêmio CAPES de Tese na área de Antropologia/Arqueologia. A tese registrou aspectos sociais, culturais, territoriais e históricos singulares de um povo cuja população atual é de cerca de 800 pessoas.
Fale da sua trajetória acadêmica, da graduação ao doutorado.
Sou doutor em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional/UFRJ, em 2023. Possuo mestrado em Antropologia pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concluído em 2013, e sou bacharel em Comunicação Social pela UFMG, nas habilitações de Jornalismo (2005) e Rádio e TV (2007). Além disso, tenho experiência no campo das artes, principalmente nas áreas de audiovisual e fotografia.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique de forma mais detalhada o conteúdo da sua tese.
Meu trabalho é a primeira etnografia derivada de uma pesquisa de campo de longa duração com o povo Nadëb, que habita o Noroeste Amazônico brasileiro, no interflúvio dos rios Negro e Japurá (este último, afluente do Solimões). Pelo seu ineditismo, a proposta do trabalho é abrangente, abarcando temas como organização social e parentesco, mitologia, xamanismo, arte verbal, territorialidade, relações dos indígenas com não indígenas, processos contemporâneos de autogestão e manejo territorial. A base histórica conjuga a análise de narrativas indígenas sobre o passado com a pesquisa em documentos primários e secundários sobre a colonização da Bacia do Japurá e do interflúvio Japurá-Negro. Outra proposta é a transcrição, tradução e análise, junto a cantores-xamãs Nadëb, de seu repertório de cantos e fórmulas xamânicas, abordagem que articula a perspectiva cosmoecológica indígena com teorias e autores da etnomusicologia e linguística. Finalmente, a tese procura refletir sobre o modo como os indígenas lidam com as ameaças socioambientais históricas na região, materializadas, no presente, na ação de invasores de Terras Indígenas e Unidades de Conservação, narcotraficantes, garimpeiros, piratas, dentre outros.
O que vale destacar de mais relevante na sua pesquisa?
O primeiro aspecto é que este é o primeiro trabalho aprofundado, de cunho etnológico, realizado junto aos Nadëb, povo caracterizado pela alta mobilidade espacial e que, até um passado recente, vivia em áreas de cabeceiras de igarapés no interior da mata, no Noroeste Amazônico, já próximo da fronteira entre o Brasil e a Colômbia. O segundo é a proposta de caracterizar a relevância política da região em foco, além de descrever as transformações socioespaciais decorrentes do contato histórico entre indígenas e não indígenas. Por fim, o destaque do trabalho se dá na dimensão política, ao descrever a territorialidade indígena no presente, num contexto de violência e graves ameaças exercidas por diferentes atores na região.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
O povo Nadëb, e a região que habitam, são pouco conhecidos, seja entre os especialistas no campo da etnologia indígena, seja entre um público mais amplo. O interflúvio Japurá-Negro está na transição entre as bacias do Solimões e Negro, principais formadores do rio Amazonas, e sua relevância política é histórica. Antes da invasão europeia, os povos dessa região estavam inseridos em redes de troca matrimoniais, rituais e econômicas que mobilizavam grupos distribuídos em uma extensão territorial de proporção continental. A partir da colonização amazônica, a região, por sua localização estratégica, passa a ser visada e disputada pelas coroas espanhola e portuguesa, o que gerou uma dinâmica de violência que vem se transformando ao longo do tempo, mas que nunca cessou. Atualmente, o município de Japurá é um dos mais violentos do Brasil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Assim, a pesquisa registra aspectos sociais, culturais, territoriais e históricos singulares de um povo cuja população atual é de cerca de 800 pessoas.
Qual a importância para você de sua tese ter sido escolhida a melhor na área?
Espero que a premiação permita que um público maior possa conhecer aspectos da realidade deste povo, a beleza e complexidade de sua cosmologia, bem como a complexidade sociopolítica desta região amazônica.
O reconhecimento da qualidade do trabalho também celebra a relevância do Museu Nacional/UFRJ enquanto instituição de formação e promoção da etnologia feita no Brasil. Carrego comigo a triste lembrança de ver o grande incêndio do Museu Nacional, em 2018, em uma pequena televisão no município de Japurá, em um dos períodos da minha pesquisa de campo. Gostaria que o prêmio fosse, a seu modo, um lembrete aos governantes e gestores brasileiros sobre a importância do investimento em instituições de ensino e pesquisa no país, e que tais instituições, por sua vez, se abram cada vez mais para a construção de um ambiente diverso, aberto, e que acolha as perspectivas e os pensamentos de povos e grupos que historicamente foram excluídos desse espaço.
Foi bolsista da CAPES? Se sim, de que forma a bolsa contribui para sua formação?
Recebi a bolsa CAPES nos cursos de mestrado e doutorado e, em ambos, o fomento concedido foi fundamental. A bolsa permitiu que eu me dedicasse às pesquisas de uma maneira que não seria possível sem o auxílio financeiro. A importância da CAPES enquanto agência de fomento e estímulo à pesquisa no Brasil é inegável.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura CGCOM/CAPES