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Pesquisa usa cera de ouvido na detecção do câncer
Aumentar a cura e a expectativa de vida dos pacientes. É o que acredita João Marcos Barbosa, bolsista da CAPES e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Federal de Goiás (UFG). Ele estuda o uso da cera de ouvido (cerume) na detecção do câncer. O trabalho ganhou repercussão internacional e foi publicado na revista Scientific Reports Nature.
Fale um pouco sobre a sua formação.
Ingressei na UFG em 2013, no curso de Química, com habilitação Industrial. Desde então, tenho procurado projetos de iniciação científica. Foi onde tive contato com a vida acadêmica. Fui bolsista de iniciação científica na graduação por dois anos. Me apaixonei pela vida de pesquisador e decidi seguir nesta carreira. Ingressei no mestrado em 2017 e faço o doutorado desde 2019.
Que tipo de pesquisa você realizou na sua carreira?
Durante a graduação, trabalhei com produtos naturais. Tive contato com instrumentação analítica, muito aplicada para o bioma do cerrado. Me apaixonei bastante pelo potencial biológico do cerrado. No mestrado, quis então procurar fazer a análise biológica em humanos. Então troquei de projeto: sai de produtos naturais e fui para área de ciências ômicas, com o que trabalho desde o mestrado, na análise e detecção de compostos que são marcadores para doenças em materiais biológicos.
Qual a sua linha pesquisa?
Consiste no desenvolvimento de diagnóstico que são práticos e facilmente replicáveis. Trabalho com biomatrizes alternativas. Hoje, para se fazer um diagnóstico, se utiliza principalmente o sangue, que é um procedimento invasivo, com um preço mais elevado. Então, durante o mestrado e doutorado, comecei a procurar alternativas para os diagnósticos. Pesquisei quais são os compostos que são interessantes para marcadores de doença que estão presentes em outras biomatrizes. E uma delas, que vi que tinha pouca referência na literatura científica, era o cerume. Então comecei a trabalhar na detecção de doenças por meio da análise dos voláteis presentes na secreção do ouvido. Com isso, a partir da ajuda da nossa equipe de pesquisadores, que já havia realizado diagnósticos para diabetes e intoxicações em animais, desenvolvi o de câncer.
Como foi o processo para chegar ao uso da cera de ouvido para a detecção do câncer?
Se explora muitos biofluídos do nosso corpo: urina, fezes, ar exalado, suor, lágrimas. No entanto, o cerume era uma biomatriz não utilizada. Verifiquei um potencial químico muito interessante nele. O cerume é formado por duas glândulas: sudorípara e sebácea. Isso faz com que ele concentre compostos polares e apolares, que são oriundos do metabolismo humano. Se ele está sendo alterado, o cerume vai concentrar valores dos dois compostos do organismo. E podem ser utilizados no diagnóstico.
Como o uso de cerume pode ganhar escalar e ser utilizado na prevenção e no tratamento?
Trabalho, em parceria com uma equipe multidisciplinar, no desenvolvimento de um diagnóstico simples e efetivo. Para isso, utilizamos uma técnica analítica bastante usual nos laboratórios de Química. Fizemos uma análise simples e rápida. De forma que, quando isso ganhar uma escala, poderá ser replicado a um custo muito mais baixo do que os exames convencionais que temos hoje, oferecendo a mesma sensibilidade – e até mais, para alguns tipos de doença – mas com o preço abaixo de outras técnicas de diagnóstico no mercado.
E o resultado é mais rápido?
No caso do exame de câncer, ele sai entre três e cinco horas, abrangendo desde o tempo da coleta até a emissão do resultado.
Como foi o trabalho da equipe para elaborar o artigo publicado na
Scientific Reports Nature
?
Uma equipe multidisciplinar, com nove integrantes e liderada pelo professor Nelson Antoniosi, trabalha neste projeto do cerume desde 2016 e tem aprimorado a metodologia. Como vimos o potencial para a detecção de câncer, buscamos pacientes voluntários, e conseguimos ter alguns resultados que foram publicados na revista. Já sabíamos da qualidade do trabalho. Tivemos
feedback
de diferentes partes do mundo. O nosso trabalho ficou entre os 100 trabalhos mais baixados da revista. De 19 mil artigos publicados em 2019, o nosso foi de número 75 em acessos. Hoje, conta com mais 16 mil
downloads
.
Qual a importância desse estudo para a sociedade?
De acordo com os dados da Organização Mundial da Saúde, de cada três mortes de doenças não transmissíveis uma é devida ao câncer. Várias dessas mortes poderiam ser evitadas se o diagnóstico fosse realizado precocemente. E hoje, os diagnósticos não permitem que o câncer seja identificado de uma maneira tão precoce. E quando são diagnosticadas, já estão em estágio avançado. A importância que vejo nesse trabalho é a oportunidade que ele dá, a todas as pessoas, de realizar o diagnóstico e detectar a doença no seu estágio mais inicial possível. Assim, aumentar o percentual de sobrevivência. O custo do tratamento é altíssimo, e um diagnóstico desse pode ser colocado no Sistema de Saúde, diminuindo os gastos e aumentando o acesso para toda a população, elevando a expectativa de vida, principalmente para aquelas que têm menos acesso aos diagnósticos convencionais.
Quais são os próximos passos?
O trabalho está em processo de validação. Temos um estudo-piloto. Estamos aumentando o número de participantes e fazendo a análise de uma quantidade de pacientes muito maior agora, para validar a nossa metodologia, e deixá-la o mais confiável possível. Para isso buscamos parcerias nacionais e internacionais, para ter o mais rápido possível o estudo validado e disponível pra toda a população.
De que forma a bolsa da CAPES contribui para a sua formação?
Sem a bolsa da CAPES eu não faria o mestrado e muito menos o doutorado. Não daria continuidade à minha vida acadêmica, porque não teria condições financeiras de me manter aqui por conta própria. O mestrado e doutorado exigem uma dedicação árdua, diária. E para isso, é necessário ter um aporte financeiro garantindo uma segurança para poder produzir o trabalho. É fundamental. Sem a bolsa, a pesquisa brasileira não anda. Reduziria drasticamente o número de pessoas fazendo pós-graduação no Brasil.
Legenda das imagens:
Imagem 1:
O trabalho de João Marcos ganhou repercussão internacional
(Foto: Divulgação)
Imagem 2:
João Marcos Barbosa é bolsista da CAPES e doutorando do PPG em Química da UFG
(Foto: Divulgação)
Imagem 3:
João Marcos estuda o uso da cera de ouvido (cerume) na detecção do câncer (Foto: Divulgação)
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CCS/CAPES)
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