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Pesquisa aponta que etnoconservação preserva solo
Marcondes Coelho Junior é formado em Engenharia Florestal pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), mestre e doutor em Ciências Ambientais e Florestais pela mesma instituição. Bolsista da CAPES no mestrado e nos dois primeiros anos do doutorado, trabalha em pesquisas e projetos relacionados à sustentabilidade do uso da terra, com destaque para a etnoconservação, proposta que defende a ação de preservação indissociável entre populações tradicionais e ecossistemas.
Sobre o que é a sua pesquisa?
Minha pesquisa de doutorado se propôs a avaliar o uso da terra e a etnoconservação do solo em duas comunidades quilombolas da Mata Atlântica, no sul do Estado do Rio de Janeiro. Foram usadas metodologias de estudos participativos e coprodução de conhecimento, além de indicadores físicos, químicos e biológicos de qualidade e saúde do solo.
Já temos algum resultado?
Os resultados encontrados revelam que o manejo do solo pelos quilombolas pode tanto preservar o solo e favorecer elementos naturais que estão acima quanto manter um suprimento de solo saudável para proporcionar múltiplos benefícios, incluindo o bem-estar humano e a salvaguarda dos valores históricos e culturais das comunidades afro-brasileiras.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
O estudo participativo e que integra os conhecimentos local e científico aos métodos de análises físicas, químicas e biológicas, é uma oportunidade ímpar para avançar no entendimento do solo, que é um recurso natural compartilhado e avaliado sob diferentes visões e perspectivas de importância. Assim, a principal contribuição é avançar na compreensão da interação entre práticas locais de uso da terra pelos quilombolas e a conservação do solo na Mata Atlântica. Ou seja, a pesquisa possibilita olhar para as práticas locais de manejo do solo sob a lente da conservação baseada em comunidades e justiça ambiental. Isso se justifica porque dados da ONU revelam que a degradação do solo já afeta metade da humanidade. Mas, dar visibilidade aos grupos sociais que se empenham tanto pela própria existência quanto pela relação diferenciada com a natureza é importante para não colocar o mesmo peso da responsabilidade em relação aos principais agentes da degradação.
O estudo participativo de solo em comunidades quilombolas pode apoiar o desenvolvimento de estratégias para manutenção do solo saudável no Brasil, partindo de um contexto local, mas com impactos amplos. Esse é um desafio para garantir não somente a segurança alimentar e nutricional da população, dada a produção de alimentos, mas, também a estabilidade climática pela reserva de carbono no solo, regulação da água potável disponível para abastecimento, controle de erosão, proteção da biodiversidade, controle de patógenos, infraestrutura para atividades humanas e até mesmo manter um acervo histórico e cultural, entre outros. Assim, nossos resultados fornecem insumos técnico-científicos tanto para apoiar as práticas tradicionais desenvolvidas pelos quilombolas quanto para promover os esforços dos formuladores de políticas envolvidos com políticas de terra e conservação no Brasil.
O que vale destacar da sua pesquisa?
Na Mata Atlântica, os territórios quilombolas são um legado para a conservação, pois, as comunidades quilombolas construíram autonomia territorial que evidencia a vanguarda dos quilombolas pela conservação do bioma mais devastado do Brasil. Com base nos nossos resultados, reiteramos que o manejo tradicional quilombola sempre foi fonte de alimento, água, moradia, identidade, memória e todo o conjunto de possibilidades para resistir no Brasil após a abolição. Contudo, devido ao processo de marginalização histórica da população negra e o racismo que nega direitos fundamentais, a soberania das comunidades quilombolas é ameaçada constantemente. Apesar das evidências trazidas pela literatura e dos resultados apresentados em nosso trabalho, sobre o papel do manejo quilombola para conservação do solo, as comunidades quilombolas enfrentam retrocessos nas políticas de direitos territoriais e sociais e, durante a pandemia da COVID-19, lutaram contra a negligência do Estado brasileiro. Institucionalmente, o governo brasileiro tornou os quilombolas mais vulneráveis ao coronavírus e deixaram os territórios ainda mais ameaçados. Por isso, durante a pesquisa, denunciamos essa situação em um artigo publicado em revista internacional, que serviu de referência para incidência política em favor dos quilombolas. Na tese, reiteramos a defesa de que os quilombolas são protagonistas nas soluções para crises socioambientais, mesmo após séculos de luta contra a marginalização na sociedade brasileira. A titulação de territórios quilombolas pode fazer do Brasil um país melhor adaptado às mudanças do clima, além de salvaguardar não apenas a vida dessas pessoas, mas também sua conexão com a terra e a história cultural do País.
Qual a importância da bolsa da CAPES na sua trajetória?
A bolsa CAPES providenciou as condições de manutenção na minha vida pessoal e acadêmica, me permitindo realizar as pesquisas de mestrado e doutorado com resultados satisfatórios e com impactos positivos na interface ciência e política. Enquanto jovem negro, acredito que a bolsa também cumpre seu papel como um instrumento de redução desigualdade racial, uma vez que a maioria das pessoas com título de doutorado são brancas, embora a maioria da população brasileira seja negra. A sociedade brasileira, a opinião pública e os atores políticos precisam entender de uma vez por todas que é a partir da bolsa que descobertas desde as humanidades, às diversas tecnologias, à produção de vacinas e cura de doenças crônicas ou às soluções para um planeta aquecido, podem se tornar realidades, já que os estudantes de pós-graduação estão sempre envolvidos nas diferentes etapas das pesquisas.
Legenda das imagens:
Banner e imagem 1
: Marcondes Coelho Junior, mestre e doutor em Ciências Ambientais e Florestais
pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)
(Foto: Arquivo pessoal)
Imagem 2
:
Workshop participativo sobre etnoconservação do solo nas áreas de coleta com os agricultores quilombolas do Quilombo do Campinho da Independência, Paraty – RJ
(Foto: Arquivo pessoal)
Imagem 3
:
R
ealização de análise laboratorial das amostras de solo no Laboratório de Gênese e Classificação de Solo da UFRRJ
(Foto: Arquivo pessoal)
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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