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BOLSISTA EM DESTAQUE
Marcela Peres Rodrigues Madureira é graduada em Nutrição pelo Centro Universitário Rio Preto (Unirp) e mestranda em Concentração em Alimentos e Nutrição pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Bolsista da CAPES, sua pesquisa foca na Epidermólise Bolhosa, uma doença genética e hereditária que provoca bolhas na pele. No estudo, Marcela analisou a qualidade de vida, a imagem corporal, o apetite e a percepção sensorial em pessoas com a doença. Em 2024, Marcela venceu o Prêmio “Dra. Eliete Salomon Tudisco”, concedido pela campanha Nutrição Sem Estereótipos (NSE) do Conselho Regional de Nutrição (CRN-3).
Fale da sua trajetória acadêmica, da graduação ao doutorado.
Minha trajetória acadêmica começou na infância, quando minha sobrinha Jéssica foi diagnosticada com Epidermólise Bolhosa (EB). Cresci presenciando as dificuldades enfrentadas por ela e ouvindo minha família falar sobre a escassez de pesquisas sobre a doença. Esse contato precoce despertou meu interesse pela ciência, inicialmente voltado para a enfermagem. No entanto, após algumas pausas e desafios, concretizei meu sonho de ingressar na graduação em Nutrição em 2018, por meio de uma bolsa integral no Centro Universitário Rio Preto (Unirp).
Direcionei meu aprendizado para a EB, mesmo diante dos desafios impostos pela pandemia. Meu Trabalho de Conclusão de Curso foi um dos primeiros passos nesse percurso, que se consolidou quando, após um aprimoramento em nutrição clínica e ambulatorial, decidi seguir a carreira acadêmica. O desejo de contribuir para o avanço científico me levou ao mestrado, onde foquei em qualidade de vida, imagem corporal, apetite e percepção sensorial em pessoas com EB. Pesquisar doenças raras exige superar obstáculos únicos. Além das dificuldades financeiras, muitos participantes vivem em situação de vulnerabilidade, com limitações físicas que dificultam o deslocamento.
A logística da pesquisa exigiu estratégias para reduzir vieses metodológicos e garantir a participação de um número expressivo de indivíduos. Apesar dos desafios, conseguimos desenvolver um dos maiores estudos experimentais sobre EB no Brasil sem depender exclusivamente de prontuários médicos, trazendo uma abordagem inovadora e centrada nos pacientes.
A escassez de investimentos em doenças raras também se revelou um entrave. Frequentemente, o impacto dessas pesquisas é subestimado, como se o número reduzido de indivíduos justificasse menor atenção. Já me perguntaram: "Por que pesquisar sobre essa doença se eles morrem cedo?". Minha resposta é sempre a mesma: não basta apenas prolongar a vida, é preciso garantir que essas pessoas vivam com qualidade.
Os resultados da minha pesquisa trouxeram achados inéditos, especialmente sobre a percepção do paladar na EB, desafiando conceitos antes aceitos. Esse avanço abre novas perspectivas para o manejo nutricional da doença e reforça o quanto ainda há a se explorar na área.
Nos próximos dias, defenderei minha dissertação na Universidade Estadual Paulista (Unesp) e, na semana seguinte, iniciarei o doutorado, dando continuidade ao meu compromisso com a pesquisa em Epidermólise Bolhosa. Mais do que um avanço acadêmico, essa trajetória representa a concretização do propósito que me motivou desde o início: contribuir para que pacientes com EB tenham uma vida melhor e mais digna.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique de forma mais detalhada o conteúdo do trabalho.
Minha pesquisa de mestrado investigou a qualidade de vida, a imagem corporal, o apetite e a percepção sensorial em pessoas com EB. O estudo contou com uma fase observacional, realizada com 111 adultos brasileiros, e uma fase experimental com 37 participantes, tornando-se um dos maiores já conduzidos no Brasil sobre a doença.
Na fase observacional, utilizamos instrumentos adaptados ao nosso idioma e cultura para avaliar como a doença afeta a vida dos pacientes. Os resultados mostraram que a dor crônica e as limitações na mobilidade impactam profundamente sua qualidade de vida, com o sofrimento emocional sendo ainda mais significativo do que as dificuldades físicas. Além disso, observamos uma autoimagem fragilizada e desafios alimentares marcados por dor e apetite reduzido.
Na fase experimental, investigamos a percepção sensorial dos gostos doce e salgado. Os dados contrariam a ideia de que a forma distrófica da doença causaria uma redução na percepção gustativa devido às lesões na mucosa oral. Descobrimos que os limiares de detecção de gosto foram mais elevados do que na população geral, indicando uma redução na sensibilidade gustativa em todos os participantes, independentemente do subtipo. Esse achado inédito sugere que as alterações sensoriais podem ser mais complexas do que se pensava.
Além disso, identificamos um padrão alimentar inadequado, com ingestão calórica e de fibras abaixo do recomendado, enquanto o consumo de sódio se mostrou excessivo, especialmente entre aqueles com a forma distrófica. Esses dados reforçam a necessidade de um planejamento nutricional mais individualizado, considerando não apenas as demandas energéticas aumentadas, mas também as dificuldades alimentares específicas dessa população.
Ao integrar essas descobertas, a pesquisa evidencia a importância de um atendimento multiprofissional e humanizado, que vá além do controle das lesões cutâneas e contemple o bem-estar geral dos pacientes. Esses resultados podem influenciar diretamente a conduta de nutricionistas, médicos e outros profissionais da saúde, ajudando a personalizar estratégias de cuidado e promover uma melhor qualidade de vida.
O que vale destacar de mais relevante na sua pesquisa?
A pesquisa preenche lacunas importantes ao explorar a relação entre diferentes aspectos da vida das pessoas com EB, algo que nunca havia sido feito dessa forma. Conseguimos reunir presencialmente um número expressivo de participantes, tornando este um dos maiores estudos já realizados no Brasil sobre a doença sem depender exclusivamente de prontuários médicos. Isso permitiu uma abordagem mais centrada no paciente e uma compreensão mais profunda dos desafios que enfrentam no dia a dia.
A parte experimental trouxe um achado inédito: os resultados desafiaram a ideia de que a forma distrófica da doença prejudicaria a percepção gustativa devido às lesões na mucosa oral. Descobrimos que a sensibilidade ao gosto estava reduzida de maneira geral, independentemente do tipo, o que abre novas perspectivas para entender como a doença afeta a alimentação e as preferências alimentares.
Além disso, o estudo mostrou como as limitações físicas e emocionais estão interligadas e impactam diretamente a qualidade de vida e a imagem corporal dos pacientes. Esses dados oferecem uma base sólida para que nutricionistas, médicos e psicólogos possam desenvolver estratégias de cuidado mais eficazes e personalizadas.
Mais do que uma contribuição científica, essa pesquisa propõe uma nova forma de olhar para a doença, trazendo reflexões que podem transformar a prática clínica e melhorar a qualidade de vida desses pacientes.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
Contribui para uma compreensão mais ampla da EB, indo além do enfoque nas lesões cutâneas e destacando o impacto da doença na qualidade de vida, na imagem corporal, no apetite e na percepção sensorial. Muitas vezes, esses pacientes são vistos apenas pela condição que possuem, e não como indivíduos com necessidades físicas, emocionais e sociais complexas. Ao abordar esses aspectos de forma interligada, o estudo reforça a importância de um atendimento multiprofissional mais humanizado e personalizado.
Os achados também podem influenciar diretamente a prática clínica de profissionais da saúde, auxiliando nutricionistas, médicos e psicólogos a desenvolverem estratégias mais eficazes para melhorar a alimentação, o bem-estar e a autoestima dessas pessoas. Além disso, os dados gerados podem embasar novas diretrizes para o cuidado nutricional e sensibilizar gestores sobre a necessidade de políticas públicas voltadas para doenças raras.
Outro impacto importante da pesquisa é a visibilidade que ela traz para a EB. Doenças raras costumam receber menos investimentos e atenção, mas estudos como este ajudam a evidenciar suas complexidades e a necessidade de mais pesquisas na área. Ao ampliar o conhecimento sobre a condição, espero que mais iniciativas sejam estimuladas, promovendo avanços tanto na ciência quanto na qualidade de vida dos pacientes.
De que forma a bolsa da CAPES contribui para sua formação?
A bolsa da CAPES foi fundamental para minha formação, pois possibilitou que eu me dedicasse integralmente ao desenvolvimento da minha pesquisa, garantindo a profundidade e a qualidade que ela exigia. Sem esse apoio financeiro, conciliar as demandas do mestrado com as responsabilidades cotidianas teria sido extremamente desafiador. Além disso, a bolsa me forneceu recursos essenciais, como materiais de pesquisa e a oportunidade de participar de eventos acadêmicos, o que facilitou a troca de experiências com outros pesquisadores.
Graças a essa bolsa, pude continuar o trabalho voluntário com pessoas que têm Epidermólise Bolhosa, uma causa que sempre foi uma motivação pessoal e um complemento essencial à minha pesquisa. Essa experiência prática me permitiu entender ainda mais as necessidades dessas pessoas e integrar as descobertas científicas à realidade do atendimento.
Além disso, a bolsa me proporcionou acesso a uma rede valiosa de contatos e experiências que enriqueceram meu desenvolvimento profissional, ampliando minha visão e consolidando minha trajetória como pesquisadora.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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