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Ômega 3 pode ser um agente protetor contra o vírus da zica
Graduada em Biotecnologia pela Universidade de Brasília (UnB), Heloisa Antoniella é atualmente mestranda pelo Programa de Patologia Molecular no Laboratório de Imunologia e Inflamação - LIMI, pela mesma instituição. Recentemente publicou na Revista Scientific Reports , do grupo Nature , sobre a capacidade neuroprotetora do ômega 3 em relação ao vírus da zica. Para falar mais sobre o assunto entrevistamos Heloisa:
Fale um pouco sobre o seu projeto de pesquisa.
Meu projeto de pesquisa está voltado para caracterizar o efeito neuroprotetor proveniente das moléculas de ômega 3, especificamente um dos ácidos graxos de ômega 3 – que se chama DHA – contra a infecção pelo vírus da zica. A primeira parte já foi caracterizada. Foi publicado um estudo com células cultivadas em laboratório, onde conseguimos mostrar que o ômega 3 tem esse potencial e pode proteger essas células neuronais. Agora, queremos mostrar também uma parte mais sistêmica, pesquisar se o ômega 3 protegeria outras vias que são afetas pelo vírus da zica, como por exemplo, durante a infertilidade masculina associada a infecção.
Como se deu o interesse em trabalhar com esse projeto?
Eu já trabalhava com o vírus da zica desde a iniciação científica. Tudo começou por que nós estávamos em um diálogo, discutindo sobre como o vírus da zica causa doenças neuronais e pensamos que era interessante não só mostrar como ele causa o dano, mas como conseguir proteger as pessoas, e o ômega 3 tem sido estudado em outros contextos de neuroproteção não relacionados ao vírus da zica. Com essa relação, o nosso foi o primeiro que saiu, mas já haviam vários relatos que ele poderia, sim, ser neuroprotetor e o que fizemos foi explorar se, nesse contexto de dano neuronal causado por uma infecção viral, o ômega 3 poderia ter alguma ação protetiva no microambiente neuronal. Então, o objetivo da minha pesquisa é conseguir mostrar que o ômega 3 tem um potencial terapêutico e pode ser usado como um adjuvante no tratamento da infecção contra o vírus da zica.
Onde pode ser encontrado o ômega 3?
Pode ser obtido através da dieta, principalmente pela ingestão do óleo de peixe. Peixe de águas frias e alguns alimentos, como brócolis, possuem percursores do ômega 3. Pode ser encontrado também em farmácias. Existem várias marcas que vendem ômega 3, o que vai variar é a pureza e a composição, porque existem várias moléculas que vão ser caracterizadas como um ácido graxo de ômega 3. Mas pode ser facilmente encontrado nessas cápsulas. Por ser super comum, é fácil de chegar até a população. Caso ele tenha o efeito esperado, seria muito benéfico para a sociedade.
Você teria dados da situação atual do vírus da zica no Brasil?
Atualmente a gente tem pouquíssimos casos. Eu fiz estágio muito tempo no LACEN – Laboratório Central de Saúde Pública do Distrito Federal. São eles que fazem esses diagnósticos e soltam os dados epidemiológicos de cada lugar-sede. Os casos estão muito baixos, quase nenhum nos anos de 2019 e agora nesse início de 2020, porém, ainda em alguns lugares da Ásia, existem casos com o vírus da zica. Tudo indica que irá voltar para o Brasil em cerca de três a quatro anos. As arboviroses têm como característica esse ciclo. Elas dão um surto muito grande, abaixam, zeram os casos e depois voltam em torno de cinco, às vezes até dez anos.
Qual a importância do seu trabalho para a realidade brasileira?
Como eu disse, o ômega 3 é de fácil acesso. Se a gente conseguir mostrar sistemicamente em um organismo vivo, que é o que a gente ainda não viu, implementar na sociedade seria muito fácil: não tem um custo muito alto para o governo e conseguiria proteger contra uma possível próxima epidemia. As arboviroses têm ciclos, provavelmente no próximo ciclo, se a gente conseguisse mostrar isso antes, conseguiríamos saber como ter mais um adjuvante protegendo a nossa população contra a infecção.
Isso tem algum impacto no âmbito internacional?
Com certeza. Os casos de microcefalia aconteceram muito aqui no Brasil, principalmente no Nordeste, mas o vírus pode sofrer uma mutação e causar um dano muito maior. Além disso, vários relatos de infertilidade masculina apareceram em diferentes lugares do mundo, tivemos relatos na Espanha, em alguns lugares da Ásia. Uma das vias que eu quero investigar é a infertilidade, ela tem uma relevância mundial. Se a gente tiver um novo surto, conseguiremos ter um adjuvante que vai proteger não só aqui no Brasil, mas em vários países do mundo. Considerando que ainda existem surtos do vírus da zica em alguns lugares, é muito importante continuar investigando e descobrir como combater esse vírus.
O que a sua pesquisa traz de diferente daquilo que já é visto?
Estudos trazendo o ômega 3 como um agente protetor contra doenças infecciosas existem pouquíssimos. Na época em que a gente estava estudando, encontramos três artigos e nada relacionado às arboviroses como o vírus da zica, Dengue, Chikungunya, nada relacionado a esse tipo de doença. O nosso é um dos primeiros artigos que caracterizam como ele consegue proteger contra uma doença viral, além disso, traz novas perspectivas. Como essa molécula é neuroprotetora, é importante nesse contexto, e pode ser explorada em outros vírus e outros contextos, protegendo contra essas infecções. Então, é muito relevante nesse sentido. Nós estamos conseguindo mostrar mais uma evidência de que ele é neuroprotetor e abrindo portas para que seja estudado como outras arboviroses, outros vírus, outras infecções, sendo agente protetor, anti-inflamatório ou em outros contextos.
Qual a importância do apoio da CAPES?
Especialmente por não ser de Brasília, eu dependo disso para morar aqui. A bolsa me permitiu realizar esse sonho de seguir a área acadêmica. Desde que eu entrei na universidade, eu quis a área acadêmica. Meu sonho era fazer um mestrado, fazer essa pós-graduação, continuar fazendo o doutorado e essa bolsa me permite ficar aqui, realizar esse sonho, trabalhar nesse laboratório e realizar essa pesquisa com a qual eu sou encantada. Eu lutei muito para conseguir e estou tentando valorizar esse dinheiro e fazer valer a pena lutando pela pesquisa brasileira.
(Brasília – Redação CCS/CAPES)
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