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PRÊMIO CAPES DE TESE
Cientista investigou fármacos para tratar disfunção da bexiga
Vencedora do Prêmio CAPES de Tese 2024 na área Ciências Biológicas II, com o trabalho ‘Efeito do metilglioxal na função miccional em camundongos: estudo funcional e molecular’, Ákila Lara de Oliveira investigou os efeitos de um composto produzido no organismo, que se eleva em situações de hiperglicemia, como no caso do diabetes dos tipos 1 e 2. Esse composto é chamado de metilglioxal e é responsável pela formação de produtos de glicação avançada que causam doenças associadas ao diabetes como, por exemplo, a disfunção da bexiga. A pesquisa marca o início da investigação de fármacos que poderão ser utilizados, no futuro, para tratar desse problema.
Fale da sua trajetória acadêmica, da graduação ao doutorado.
Minha trajetória na pesquisa teve início em 2013, durante meu segundo ano de graduação em Medicina-Veterinária. Nesse período, descobri minha verdadeira vocação para a pesquisa e para a ciência. Como fazia parte da primeira turma do curso, a participação dos professores no programa de iniciação científica ainda não havia sido estabelecida. Com a orientação da Professora Dra. Regina Blatti, iniciamos um projeto de pesquisa que avaliava a ação de probióticos em fêmeas suínas gestantes e a resposta imune nos neonatos. Essa experiência foi meu primeiro contato com a pesquisa e com a orientação acadêmica.
No ano seguinte, ao introduzir a toxicologia na grade curricular, conheci a Professora Dra. Yoko Oshima Franco, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba (Uniso). Ela já estava no programa de pós-graduação stricto sensu na universidade e participava do programa de iniciação científica, o que me possibilitou concorrer a uma bolsa do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PIBIC/CNPq), a qual fui aprovada. Assim, comecei minha iniciação científica, estudando o efeito protetor de uma planta do cerrado contra o veneno da serpente Bothrops jararacuçu. Esse trabalho recebeu dois prêmios na área de ciências biológicas: melhor trabalho de iniciação científica e melhor trabalho PIBIC.
Ao concluir minha graduação no ano de 2016, decidi ingressar no mestrado em Ciências Farmacêuticas, sendo aprovada na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sob a orientação da Dra. Ana Lúcia Tasca Gois Ruiz. Enfrentei tempos desafiadores, com cortes e reduções de bolsas. O mestrado foi um verdadeiro teste de resistência, mas mesmo em tantas dificuldades, fui a primeira defesa do programa de pós-graduação em Ciências Farmacêuticas (que foi a primeira turma). Devido à impossibilidade de realizar a parte prática da pesquisa, tive que mudar meu foco para um estudo de revisão sistemática. Apesar das dificuldades, essa fase me ensinou muito sobre a pesquisa, sobre resiliência, sobre como a pesquisa pode sofrer com questões externas, e que importante é sempre estar aberto para aproveitar novas ideias de pesquisa.
Determinada a continuar na pós-graduação, participei do processo seletivo do programa de Farmacologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM-Unicamp), onde fui orientada pelo Professor Dr. Edson Antunes. Até então, eu sempre escolhi a linha de pesquisa em que queria atuar, mas no doutorado, a linha de pesquisa me escolheu. Comecei a investigar a disfunção da bexiga diabética. O doutorado foi crucial para minha formação, pois integrei um grande grupo de pesquisa com um projeto temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) aprovado, que possibilitou uma vivência cientifica de alta produtividade.
Assim, o doutorado foi extremamente produtivo e resultou em um bom número de publicações, além de abrir várias questões de pesquisa. A partir dessas questões, surgiu meu projeto de pós-doutoramento, que foi aprovado e está em andamento neste momento.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique de forma mais detalhada o conteúdo da sua tese.
Minha tese investigou os efeitos de um composto produzido no organismo, que se eleva em situações de hiperglicemia, como no caso do diabetes (tipos 1 e 2). Esse composto é chamado de metilglioxal. O metilglioxal (MGO) é responsável pela formação de produtos de glicação avançada, conhecidos como AGEs (Advanced Glycation End Products). Esses AGEs se formam quando o metilglioxal se liga a proteínas, resultando na perda de função dessas proteínas. E o MGO e os AGEs estão envolvidos em diversas complicações do diabetes, o que torna minha tese e as publicações dela, inovadoras, é que demonstramos, pela primeira vez, que o metilglioxal também está relacionado à disfunção da bexiga. Essa descoberta é inédita e não havia sido demonstrada por nenhum grupo de pesquisa anteriormente. Nossa pesquisa marca o início da investigação de fármacos sequestradores de metilglioxal ou quebradores dos AGEs. Esses compostos poderão ser utilizados no futuro para tratar a disfunção da bexiga em pacientes diabéticos. A abordagem específica para o tratamento da disfunção da bexiga diabética ainda requer uma avaliação mais aprofundada. Existem várias áreas de pesquisa a serem exploradas nessa desordem, e o metilglioxal, juntamente com seus AGEs, emerge como um alvo de grande relevância.
O que vale destacar de mais relevante na sua pesquisa?
A disfunção da bexiga diabética é uma complicação multifatorial comumente observada no diabetes. Entretanto, até o momento, nenhuma investigação tinha avaliado o papel do eixo metilglioxal, seus AGEs e seu receptor nesta disfunção. Nosso objetivo foi identificar as alterações causadas pelo MGO e seus AGEs na bexiga, independentes das alterações associadas à hiperglicemia, uma vez que no modelo que utilizamos não há alterações na glicemia, uma fonte importante de geração de MGO. Nossos estudos evidenciaram alterações significativas causadas pelo MGO, como hipercontratilidade detrusora, aumentos da capacidade vesical, do volume residual e das contrações involuntárias, e, por fim, diminuição da eficiência de micção. Esses efeitos podem estar relacionados à maior produção de colágeno, espécies reativas de oxigênio e à expressão de AGEr (receptor dos AGEs) na bexiga. Essas alterações forneceram a base para o entendimento de que o MGO causa disfunção na bexiga. Com base nesses resultados, demonstramos que a eliminação do excesso de MGO poderia reverter tais efeitos, tornando-se um alvo terapêutico.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
A disfunção da bexiga diabética tem uma variedade de sintomas que implicam em um fenótipo bastante heterogêneo, com uma ampla prevalência dos sintomas urinários dependendo do tipo de diabetes. No entanto, os estudos de prevalência têm limitações, pois são retrospectivos e não se concentram nos mecanismos subjacentes à doença, nem realizam acompanhamentos a longo prazo dos pacientes. Sendo assim, é crucial destacar que os modelos animais de DM1 e DM2 têm sido fundamentais para compreender os mecanismos subjacentes a esta disfunção. Eles nos ajudam a entender as alterações da doença e o curso temporal dessas alterações, que são limitadas pelos estudos observacionais, e a partir disso, encontrar novos alvos terapêuticos.
Qual a importância para você de sua tese ter sido escolhida como a melhor na área?
Desde que estava na iniciação científica e participava do programa de capacitação, fiquei sabendo do Prêmio CAPES de Tese, isso no ano de 2015. Naquele momento, disse para mim mesma que iria ganhar quando estivesse no doutorado. Sonhava com esse prêmio, pois é um reconhecimento de toda a trajetória de pesquisa, que no meu caso foi cheia de percalços. Para mim, é mais que um sonho realizado; é saber que estou trilhando o caminho certo e que minha pesquisa está sendo reconhecida.
Foi bolsista da CAPES? Se sim, de que forma a bolsa contribui para sua formação?
Sim, fui bolsista da CAPES. A bolsa foi importante para me manter durante o doutorado. Em pesquisa pré-clínica, é exigida dedicação total à pesquisa; portanto, sem a bolsa, dificilmente conseguiria executar a pesquisa.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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