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Bolsista Costa Marfinense fala sobre experiência em doutorado pleno no Brasil
Desde março de 2015, o Costa Marfinense Yéo N’gana realiza, com bolsa concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), doutorado na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Yéo foi um dos contemplados pelo edital 2014 do Programa Estudantes-Convênio de Pós-Graduação ( PEC-PG ), que concede bolsas de doutorado pleno, em instituições de ensino superior (IES) brasileiras, a professores, pesquisadores e graduados do ensino superior de países em desenvolvimento com os quais o Brasil mantém acordo de cooperação.
Graduado em Letras Português e mestre em Literatura da África Lusófona pela Université Félix Houphouët Boigny (UFHB– Abidjan), Yéo explica que seu doutorado trata da história da tradução, abordando as relações de poder no processo de retextualização, literaturas pós-coloniais africanas, interculturalidade e representatividade. “Minha pesquisa é uma tradução comentada de La carte d’identité , do escritor marfinense Jean-Marie Adiaffi Adé, do francês para o português brasileiro. Procuro neste trabalho, além de traduzir, refletir sobre o processo de tradução, sobretudo em uma perspectiva sul-sul. Trata-se, portanto, de uma abordagem ao mesmo tempo histórica (diálogo ex-colônia com outra ex-colônia), social (reflexão sobre as estratificações sociais e linguísticas, conforme aparecem na obra traduzida), antropológica (como a tradução, e, por meio dela, a literatura vêm ajudando a entender o homem, o seu pensamento e a formar a sua visão sobre o mundo) e cultural (como tanto o Brasil quanto a Costa do Marfim vem construindo, a partir do contato com o outro, uma cultura nacional, um ideal coletivo, esse multiculturalismo que presenciamos nos dois países)”.
Segundo Yéo, em sua pesquisa, ele reflete sobre a possibilidade de uma tradução dialógica no âmbito de dar continuidade à visão e ao projeto de Adiaffi, no qual os nomes e expressões em anhi (sua língua) representam marcadores culturais essenciais. “Traduzir é, então, revelar essa diversidade. Enquanto tal, exige, por parte do leitor, um esforço de compreensão ao qual estamos todos convidados. Neste espaço ainda mais escorregadio, espaço de construção social e identitária, faz-se necessário e urgente refletirmos sobre as escolhas tradutórias que fazemos e as teorias que nos servem de guarida conceitual se quisermos evitar genocídios linguísticos, culturais e humanos como aqueles que vivenciamos durante a colonização e no caso do conflito Rwandês”, explicou.
Experiência
Segundo o doutorando, o PEC-PG é um programa de extrema relevância, pois propicia benefícios ao Brasil e aos países pertencentes ao convênio. “O PEC-PG abre janelas para outros mundos. Se por um lado ele torna possível a carreira acadêmica a pesquisadores estrangeiros que, por conta do custo não teriam condições de arcar com seus estudos, por outro ele robustece a presença do Brasil no mundo político, socioeconômico e cultural favorecendo, acima de tudo, a convergência do mundo em direção ao Brasil”, explica.
Para o bolsista, o retorno ao país de origem faz dos pesquisadores embaixadores brasileiros em suas regiões. “Com este programa é possível descontruir estereótipos de um Brasil exótico, composto apenas de carnaval, samba e futebol e mostrar um Brasil onde a cultura e a alegria não impedem o conhecimento. Ao término de nossas pesquisas, somos como embaixadores brasileiros com a função de apresentar um Brasil de inovação, acolhedor e uma futura potência que tem muito a contribuir para um mundo melhor”, disse.
A adaptação ao ambiente de pesquisa é apontada por Yéo como um dos maiores desafios de um pesquisador em sua atuação, razão pela qual ele qualifica sua experiência até o momento como excepcional. “Estou na universidade onde foi criada a primeira pós-graduação na área dos Estudos de Tradução na América do Sul e uma das mais importantes da área do mundo. Além de multidisciplinar e aberto para novas abordagens, o Programa de Pós-Graduação em Estudos de Tradução (PGET) dá aos alunos uma voz que nem sempre existe na academia, por meio da representação discente junto ao colegiado, debates e incentivos às publicações. Na mesma perspectiva, o programa possui um número extraordinário de eventos nacionais e internacionais com editores, tradutores, escritores/poetas e pesquisadores sobre a tradução que permite ao aluno juntar teoria e prática”
Sugestões
A partir de sua experiência no PEC-PG, o bolsista sugere a inserção de um fluxo bilateral no programa, de modo que pesquisadores brasileiros possam fazer suas pesquisas nos países membros do convênio. “Assim como os alunos e/ou pesquisadores vêm estudar no Brasil, outros estudantes brasileiros poderiam ir nesses países de intercâmbio. É importante destacar que tanto o Brasil quanto os países membros do convênio têm algo para oferecer em termos de conhecimento. As potencialidades que ficam nesses países são enormes e os alunos brasileiros poderiam aprender muito e reproduzi-las no retorno às suas comunidades acadêmicas”.
O doutorando comenta ainda a importância da criação de uma rede de acompanhamento de egressos do programa. “Pelo investimento nessas pesquisas serem de suma importância, seria interessante poder acompanhar a pós-formação, o resultado do investimento. O governo brasileiro poderia renegociar os acordos com as universidades ou assinar novas parcerias engajando as universidades dos países membros do convênio para facilitar a inserção dos alunos bolsistas quando voltarem para seus países de origem. Essa rede de alumni teria uma representação tanto a nível das embaixadas do Brasil no exterior e quanto em suas universidades. Os alunos participariam da preparação dos futuros bolsistas pela troca de experiência e, especialmente, na busca por uma universidade e por um orientador do projeto de dissertação ou de tese”, sugeriu.
PEC-PG
O
programa
é fruto de parceria entre a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o Ministério das Relações Exteriores (MRE) por intermédio da Divisão de Temas Educacionais (DCE), e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e tem o objetivo de conceder bolsas de doutorado pleno em IES brasileiras a professores universitários, pesquisadores, profissionais e graduados do ensino superior dos países em desenvolvimento com os quais o Brasil mantém Acordo de Cooperação Educacional, Cultural ou de Ciência e Tecnologia visando o aumento de qualificação necessária para que o estudante possa contribuir para o desenvolvimento de seu país.
(Gisele Novais)