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Lei que estrutura o sistema de persecução privada concorrencial é promulgada
Nesta quarta-feira (16/11), foi promulgada a Lei nº 14.470/2022, que prevê novas disposições aplicáveis à repressão de infrações à ordem econômica. A lei, que altera os dispositivos da Lei de Defesa da Concorrência (LDC), já está em vigência, a partir de hoje (17/11), com a publicação no Diário Oficial da União (DOU).
Após dez anos da entrada em vigor da Lei nº 12.529/2011, também conhecida como Lei de Defesa da Concorrência (LDC), algumas mudanças importantes foram trazidas com publicação da Lei nº 14.470/2022, incentivando e facilitando a propositura de ações pelos sujeitos prejudicados pela prática anticompetitiva.
A promulgação da Lei nº 14.470/2022 suscita uma nova era para o sistema de persecução privada concorrencial e detalha temas importantes para o seu desenvolvimento, como o prazo prescricional aplicável e o termo inicial que deve ser utilizado na sua contagem. Além disso, trata da distribuição do ônus probatório e da previsão da indenização em dobro por perdas e danos, gerando maior segurança jurídica e incentivos adequados.
Em relação às mudanças específicas, a nova lei modifica a LDC introduzindo quatro parágrafos ao artigo 47, além de inserir os novos artigos 46-A e 47-A.
O parágrafo segundo do novo artigo 46-A define como marco para o início da contagem da prescrição a ciência inequívoca do ilícito, sendo compreendida como a publicação do julgamento final do processo administrativo pelo Cade. Esse já era o entendimento predominante nos tribunais, uma vez que é de fato neste momento que as vítimas passam a tomar ciência da existência do ilícito e, portanto, também da possibilidade de procurar o respectivo ressarcimento na seara judicial.
Ademais, em sintonia e tendo como base o sistema do private enforcement norte-americano (jurisdição líder mundial no uso da persecução privada concorrencial), que institui o ressarcimento em triplo do valor dos danos cometidos por cartelistas, a lei institui com o novo parágrafo primeiro do art. 47 da LDC o double damages, ou seja, o ressarcimento em dobro pelos prejuízos sofridos por terceiros em função de infrações contra a ordem econômica. Nessa linha, para se aumentar o incentivo à realização de acordos com o Cade, os parágrafos segundo e terceiro excetuam o instituto do double damages para aqueles que tenham assinado com o Cade Acordo de Leniência ou Termo de Compromisso de Cessação da Prática.
Outro ponto importante diz respeito à inversão do ônus probatório com relação à tese de defesa usualmente apresentada pelos infratores, de que a vantagem auferida a partir da prática da infração haveria sido repassada na cadeia produtiva, de modo que supostamente a vítima direta não teria tido prejuízo. Esta tese de repasse, globalmente conhecida como “pass-on defense”, impõe aos prejudicados o ônus de provar que o repasse não foi realizado, a despeito da gigante assimetria informacional.
Por fim, a lei promulgada ontem aumenta o caráter dissuasório da persecução concorrencial, integrando melhor a complementariedade entre o direito sancionador, de caráter público, e o da responsabilidade civil, de caráter privado. Isto porque, além de impor o ressarcimento em dobro, também torna a decisão do Cade apta a fundamentar a concessão de tutela da evidência, permitindo ao juiz decidir liminarmente nas ações de indenização em defesa de interesses individuais ou individuais homogêneos, confirmando a deferência do judiciário às decisões da Autarquia, que é um órgão especializado.
O superintendente-geral do Cade, Alexandre Barreto, afirma que “ a Lei 14.470/2022 é o ápice de um esforço do Cade, junto ao Congresso Nacional, e representa uma nova era para a persecução concorrencial privada no Brasil, em alinhamento com as melhores práticas internacionais”.
Alexandre Cordeiro, presidente da autarquia declara que ”a promulgação da Lei nº 14.470/2022, como parte da evolução do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, o torna mais efetivo, tanto no combate aos ilícitos, quanto na garantia dos direitos de terceiros lesados.”. Cordeiro ressalta ainda que a autarquia mantém uma postura de rigor com a investigação, mas, também, uma preocupação com a higidez do programa de acordos, destacando que até o momento em 2022, o Cade já atingiu a marca de 35 acordos homologados, superando R$ 636 milhões em contribuições pecuniárias.
Dada essa preocupação, o Cade se manifestou favorável ao veto do § 16 do art. 85 da lei concorrencial, que determinava a obrigatoriedade, firmada em Termo de Compromisso de Cessação (TCC), da submissão a juízo arbitral de eventuais controvérsias acerca de reparação de danos quando for do interesse da parte prejudicada. Cordeiro destaca a relevância da arbitragem para o país, como instrumento de resolução de conflitos, mas entende que uma obrigatoriedade legal impede que o Cade analise, no caso concreto, a conveniência dessa cláusula. “A nova lei é muito positiva à defesa da concorrência e aos interesses do país”, acrescenta o presidente do Cade.