Notícias
ACORDO DE LENIÊNCIA
Cade investiga cartel em licitações de edificações especiais da Petrobras no âmbito da Operação Lava Jato
A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – SG/Cade instaurou, nesta sexta-feira (02/12), o Inquérito Administrativo 08700.007777/2016-95 para investigar suposto cartel em concorrências públicas realizadas pela Petrobras para contratação de serviços de engenharia e construção civil predial de “Edificações de Grande Porte com Características Especiais” para a construção do Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello (Novo Cenpes), do Centro Integrado de Processamento de Dados da Tecnologia da Informação (CIPD), ambos localizados no Rio de Janeiro, e da Sede da Petrobras de Vitória (Sede de Vitória), no Espírito Santo. O inquérito, mais um desdobramento da “Operação Lava Jato”, foi subsidiado pela celebração de acordo de leniência firmado com a Carioca Christiani-Nielsen Engenharia S/A e com executivos e ex-executivos da empresa.
Por meio da leniência, assinada pelo Cade em conjunto com o Ministério Público Federal do Paraná – MPF/PR (“Força-Tarefa da Operação Lava Jato”), as empresas e pessoas físicas signatárias confessam sua participação, fornecem informações e apresentam documentos probatórios a fim de colaborar com as investigações do alegado cartel. Trata-se do sexto acordo de leniência publicado pelo Cade no âmbito da “Operação Lava Jato” e do primeiro firmado com a Carioca Engenharia.
Além de o MPF/PR negociar a colaboração premiada com executivos e ex-executivos da Carioca Engenharia no âmbito da ação penal em curso na Justiça Federal em Curitiba, o Cade negociou o presente acordo de leniência durante oito meses. O documento foi firmado nos termos dos artigos 86 e 87 da Lei 12.529/2011 (Lei de Defesa da Concorrência) e é relacionado exclusivamente à prática de cartel, para a qual o Cade possui competência de apuração.
As empresas apontadas como participantes da suposta conduta anticompetitiva, além da Carioca Engenharia, são: Andrade Gutierrez Engenharia S/A, Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A, Hochtief do Brasil S/A, Construtora OAS S/A, Construtora Norberto Odebrecht S/A, Construtora Queiroz Galvão S/A, Construbase Engenharia Ltda., Construcap CCPS Engenharia S/A, Mendes Júnior Trading Engenharia S/A, Schahin Engenharia S/A, WTorre Engenharia e Construção S/A e, possivelmente, Racional Engenharia Ltda., além de, pelo menos, quatorze executivos e ex-executivos dessas empresas.
As violações à ordem econômica consistiram em acordos de fixação de preços, condições, vantagens e abstenções de participação; divisão de mercado entre concorrentes, por meio da formação de consórcios, supressão de propostas e apresentação de propostas de cobertura; e troca de informações concorrencialmente sensíveis, a fim de frustrar o caráter competitivo das mencionadas licitações públicas.
Os contatos entre os concorrentes se iniciaram em 2006, com a formação de um grupo composto por sete empresas: Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Carioca Engenharia, Hochtief, OAS, Odebrecht e Queiroz Galvão. Neste primeiro momento, foram discutidas as intenções preliminares de cada uma delas com relação às obras, sendo que Andrade Gutierrez, Odebrecht e OAS teriam sido definidas como “cabeças de chave”, ou seja, líderes dos futuros consórcios.
A Odebrecht teria declarado interesse na obra da Sede de Vitória, formando consórcio com a Hochtief e a Camargo Corrêa. A OAS, por sua vez, teria demonstrado interesse em vencer a obra do Novo Cenpes, sugerindo que a Carioca Engenharia compusesse seu consórcio, em razão de experiências comerciais conjuntas anteriores. Por fim, a Andrade Gutierrez teria apontado interesse pela obra do CIPD, a última a ser licitada. Queiroz Galvão também teria optado por essa licitação.
Em agosto de 2006, porém, o arranjo anticompetitivo teria sido ampliado para abarcar outras empresas convidadas pela Petrobras para participar do certame. Assim, os líderes dos futuros consórcios vencedores (Andrade Gutierrez, Odebrecht e OAS) tiveram que contatar representantes das outras empresas convidadas para integrá-las à divisão pré-estabelecida de vencedores dos certames. As quatro empresas que passaram a fazer parte dos contatos anticoncorrenciais foram as seguintes: Construbase, Construcap, Mendes Júnior e Schahin. A partir desses contatos, foram definidos os consórcios vencedores, quem apresentaria propostas de cobertura e quem suprimiria propostas, a fim de viabilizar os acordos do suposto cartel nas três licitações. Os contatos anticompetitivos duraram até, pelo menos, 2008.
Na licitação da Sede de Vitória, o acordo anticompetitivo foi implementado sem quaisquer entraves, tendo Odebrecht, Hochtief e Camargo Corrêa vencido o certame.
Já na licitação do Novo Cenpes, os ajustes foram temporariamente desestabilizados pela participação da WTorre na licitação, que venceu de modo isolado e não alinhado o certame. Ao final da fase de negociação com a Petrobras, porém, após contatos dos concorrentes, a WTorre teria deixado de baixar o preço de sua proposta vencedora, possibilitando a vitória do consórcio formado por OAS, Carioca, Construcap, Construbase e Schahin em troca de uma compensação financeira.
Por fim, na licitação do CIPD o acordo anticompetitivo também foi implementado sem percalços, tendo Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Mendes Júnior vencido a licitação.
Os signatários relatam que a Racional Engenharia Ltda., apesar de não ter feito parte dos contatos anticompetitivos diretamente, pode ter tido conhecimento ou alguma participação subsidiária nos ajustes, na medida em que apresentou propostas conjuntamente com Andrade Gutierrez e Construbase, propostas estas sabidamente de cobertura.
Histórico da conduta e inquérito administrativo
Acompanha o acordo de leniência um “Histórico da Conduta", no qual a SG/Cade descreve de maneira detalhada a prática anticompetitiva, conforme relatada pelos signatários e subsidiada pelos documentos probatórios apresentados. Em comum acordo, Cade, MPF/PR e os signatários dispensaram a sua confidencialidade.
Ao final do inquérito administrativo, cabe à SG/Cade decidir pela eventual instauração de processo administrativo, no qual são apontados os indícios de infração à ordem econômica colhidos e as pessoas físicas e jurídicas acusadas. Nessa fase, os representados no processo serão notificados para apresentar defesa. Ao final da instrução, a Superintendência emite parecer opinativo pela condenação ou pelo arquivamento do caso em relação a cada acusado. As conclusões são encaminhadas ao Tribunal do Cade, responsável pela decisão final.
O julgamento final na esfera administrativa cabe ao Tribunal do Cade, que pode aplicar às empresas eventualmente condenadas multas de até 20% de seu faturamento. As pessoas físicas, caso identificadas e condenadas, sujeitam-se a multas de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões. O Tribunal também pode adotar outras medidas que entenda necessárias para a dissuasão da conduta.
Acordos de leniência no Cade
Este é o sexto acordo de leniência firmado com o Cade no âmbito da “Operação Lava Jato”. Os anteriores foram celebrados com a empresa Setal/SOG e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para investigação de cartel em licitações para obras de montagem industrial onshore da Petrobras ; com a empresa Camargo Corrêa e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para investigação de cartel em licitação para obras de montagem eletronuclear na usina Angra 3 da Eletronuclear; com a empresa Camargo Corrêa e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para investigação de cartel em licitações da Valec para implantação da Ferrovia Norte-Sul e da Ferrovia Integração Oeste-Leste; e os últimos dois com a empresa Andrade Gutierrez e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, respetivamente, para a investigação de cartel em licitação na Usina Hidrelétrica de Belo Monte, e para a investigação de cartel em licitações para urbanização das favelas do Alemão, Manguinhos e Rocinha, no Rio de Janeiro.
Nos termos da Lei 12.529/2011, o acordo de leniência tem por objetivo obter informações e documentos que comprovem um cartel, bem como identificar os demais participantes na conduta. O acordo pode ser celebrado nos casos em que, na ocasião da sua propositura, o Cade ainda não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação dos envolvidos.
A leniência é assinada apenas com a primeira empresa proponente (ou seu grupo econômico), que deve cessar seu envolvimento na conduta, confessar o ilícito e cooperar plena e permanentemente com as investigações, identificando os demais envolvidos e apresentando provas e informações relevantes. A leniência beneficia os signatários com a extinção ou a redução de um a dois terços da punição no âmbito do Cade. O acordo é assinado em conjunto com o Ministério Público e beneficia o signatário com a imunidade penal total ou parcial.
O acordo de leniência é um instrumento utilizado por autoridades da concorrência em diversos países para desvendar cartéis. Desde 2003, já foram celebrados aproximadamente 60 Acordos de Leniência no âmbito do Cade.