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Publicações | Entrevista com a autora de obra sobre o setor de conservação e preservação da BN
Thais Helena de Almeida
Thais Helena de Almeida, Doutora em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e Conservadora-Restauradora da Fundação Biblioteca Nacional, é autora do livro "Conservadores, restauradores e cientistas na preservação do acervo da Biblioteca Nacional de 1880 a 1980", publicado pela Coordenação de Editoração da Biblioteca Nacional.
A obra será lançada via LIVE pelo canal da Fundação Biblioteca Nacional no YouTube, no dia 29 de outubro, às 17h. O lançamento fará parte do Dia do Livro e do Aniversário da Biblioteca Nacional, que completará seus 211 anos.
A seguir a entrevista com a autora a respeito de seu novo livro, realizada pelo editor da obra, Daniel Fernandes (Gabinete, FBN).
1) Thais, este novo livro, em última análise, chegou a assumir um valor existencial, na medida em que você mesma compartilha das experiências, impressões e lembranças dos outros, mesmo que imaginativas, conquistadas a partir de sua pesquisa?
Acredito que sim, visto que, falar dos profissionais que atuaram na conservação e restauração do acervo da Biblioteca Nacional, mesmo em se tratando de uma pesquisa que remonta aos séculos XIX e XX, é falar, de certa forma, de nós mesmos. A identificação é imediata. Nos reconhecemos nas angústias de tentar frear o tempo que avança sobre os objetos; na alegria de vencer desafios técnicos; nas lutas políticas pelo reconhecimento do patrimônio cultural como um bem inegociável em relação a sua importância na formação e identidade da nossa sociedade e sobretudo, perceber que nossos atos definem e formam o profissional que somos, buscando contribuir para a preservação deste monumental acervo.
2) Por que você vê a preservação do patrimônio bibliográfico e documental como um ato ético e político?
Toda a atuação do conservador-restaurador deve ser orientada pelo absoluto respeito ao valor e significado artístico, histórico, documental, estético, científico, espiritual ou religioso. Este entendimento passa pela ética da profissão. O cuidado com os bens culturais que a sociedade lhe confia e espera que atente para a sua integridade física é prioridade nesta profissão. Ao definirmos ações, criarmos dispositivos legais e escolhermos técnicas e perfis profissionais, traçamos o destino do patrimônio cultural. Isso passa pela política institucional.
É neste sentido, que a preservação é um ato ético e político e nos ajuda a refletir, na pesquisa, sobre a memória e o esquecimento. Pensar a memória como um instrumento de poder, implica admitir que não há poder sem memória, e que ela passa pelas recordações e esquecimentos, narrativas e atos, silêncios e gestos, onde há um jogo de saberes, de forças e de emoções. O que escolhemos para preservar passa pela nossa percepção ética e política, e este é o grande desafio que enfrentamos hoje: o respeito a todo bem cultural.
3) Em que sentido teu livro é uma reflexão sobre a memória e o esquecimento?
Me concentrei em buscar reconstruir as memórias dos profissionais conservadores, restauradores e cientistas e suas ações para a preservação do acervo da Biblioteca Nacional. Contudo, sem perder a compreensão de que esses binômios - lembrar e esquecer, registrar e apagar, são escolhas que fazemos intencionalmente ou não. Assim, ao revelar pessoas, revelo os conflitos, as disputas, os interesses e os anseios que moldaram e reforçaram as lembranças e os apagamentos institucionais. Isso nos dá pistas para uma reflexão sobre a força da memória e a responsabilidade que temos neste contexto.
4) Por que preservar e restaurar tem algo a ver com o futuro dos livros do passado?
Eu diria que preservar e restaurar tem algo a ver com o futuro dos livros do passado e os do presente. Na maioria das vezes quando se fala que um livro, ou qualquer outro objeto do patrimônio cultural foi restaurado, imediatamente se pensa na sua antiguidade, na sua condição, que o teria levado ao restauro. Mas, voltamos ao livro. Algumas vezes, um livro contemporâneo necessita de intervenção de restauro, seja por uma solução equivocada para sua encadernação, seja por um sinistro ou mesmo por um ato de vandalismo. O futuro dos livros, de qualquer tempo, depende da importância que lhe atribuímos, de seu reconhecimento como produto da produção de conhecimento e das experiências de uma sociedade ou mesmo de suas paixões. A preservação está ligada diretamente a esta compreensão. Não há futuro sem compreender o que se quer preservar.
5) Numa perspectiva de investigação de rara qualidade, você conduz o leitor ao encontro com uma “gente especial”, trazendo à superfície "memórias subterrâneas" de agentes da conservação e do restauro. Era esse mesmo o seu objetivo?
A ideia era pensar a preservação dentro de uma memória institucional, administrativa. Quais os caminhos percorridos pela instituição, suas escolhas técnicas para a preservação de seu acervo. No entanto, ao descobrir um documento, datado de 1967, assinado pelo chefe do Laboratório de Bibliopatologia da instituição, Adalberto Barreto, minha perspectiva mudou. Sem saber da existência deste laboratório e sem ter conhecimento deste sujeito, ficou clara a necessidade de buscar as memórias das pessoas, neste universo preservacionista. Descobri que não só desconhecia Adalberto Barreto, mas tantos outros, como Antonio Luiz Pinto de Montenegro, Carlos Peixoto, ainda no século XIX, Álvaro Meirelles dos Passos e seus encadernadores, revelados e nomeados, um a um, assim como a equipe que trabalhou com Adalberto Barreto, composta pelo artista plástico Ivan Serpa, Maria Pinheiro dos Santos, Gilda Lefebvre, para citar alguns. Ao concluir a pesquisa tive a certeza de que tinha escolhido o caminho certo. Caminho que continuo a percorrer.
Saiba mais sobre o livro: https://www.bn.gov.br/acontece/noticias/2021/08/lancamentos-bn-conservad...
O livro completo já está disponível para acesso online:
https://www.bn.gov.br/producao/publicacoes/conservadores-restauradores-c...
No dia 08 de junho deste ano, na 3ª rodada dos Seminários do CPE, Thaís Helena de Almeida, chegou a apresentar parte de sua pesquisa, agora publicada em livro, pela Fundação Biblioteca Nacional.
Confira: https://www.bn.gov.br/acontece/noticias/2021/06/seminarios-cpe-estabelec...