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Lançamento | Entre o belo e o útil
Servindo-se de desenhos originais, e sobretudo de manuais de época, a Editora da Unicamp publicou em maio de 2021 o livro ENTRE O BELO E O ÚTIL, manuais e práticas do ensino do desenho no Brasil: livro que consegue, sem pretender uma visão totalizadora do tema, e focalizando alguns documentos singulares, encontrados em diferentes acervos e coleções brasileiras, compor, ainda assim, um panorama que em muito pode interessar a um público variado, indo de estudantes de arte a artistas, de historiadores da arte e da educação a professores e interessados na questão do livro e da leitura no país.
Ressaltando os aspectos sociais e culturais do ensino do desenho, que não é, como o próprio livro demonstra, um ensinamento neutro nem fora da história, a obra trata do que chama de ‘publicações do desenho’ - livros e álbuns especialmente dedicados a esse ensino - mas apresenta também imagens pouco vistas pelo público, como alguns dos desenhos realizados pelo imperador Pedro II ainda menino e, também, por suas irmãs, princesas imperiais do Brasil (desenhos conservados no Museu Imperial de Petrópolis) – além de desenhos realizados por personagens desconhecidos. Desse modo, entramos em contato não apenas com as teorias e métodos que se queriam impor nesta área, mas também vislumbramos as efetivas práticas do desenho que se deram nesse contexto.
Tratando também dos antecedentes lusitanos dessa trajetória, o autor pesquisou, entre outros acervos, o da Biblioteca Guita e José Mindlin, ainda quando ela se encontrava na residência de seus proprietários (hoje, a referida biblioteca se encontra no campus da Universidade de São Paulo). Biblioteca na qual encontrou exemplares de manuais de ensino do desenho produzidos pela conhecida e muito atuante oficina tipográfica do ‘Arco do Cego’, em Lisboa, na passagem entre os séculos XVIII e XIX.
Iniciado com uma pesquisa de doutorado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), o trabalho continuou, a partir de 2005, com uma bolsa do Programa Nacional de Apoio a Pesquisa da própria Fundação Biblioteca Nacional, sendo os acervos iconográficos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro uma das principais fontes documentais utilizadas na obra.
Seu autor, tornando-se professor efetivo do Instituto de Artes da Universidade Federal de Uberlândia (IARTE-UFU) em 2006, dedicou-se então, com sua mudança para o interior mineiro, a outros temas de pesquisa. Entre 2019 e 2020, contudo, através de um pós-doutorado realizado no Programa de Pós-Graduação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), sob coordenação da historiadora da arte Maria Berbara, pode retornar exclusivamente ao tema, dedicando-se a revisão sistemática dos documentos de que já dispunha, buscando novas imagens na Seção de Iconografia da Biblioteca Nacional e, sobretudo, realizando uma minuciosa revisão de seu texto, buscando atingir, com ele, um público amplo e variado. O resultado é um livro de fácil leitura, apesar da enormidade de informações e dados que apresenta, e que, como já dito, pode ser aproveitado em diferentes campos de estudo.
Tratando-se de uma primeira edição, já está prevista pelo autor uma possível ampliação de seu escopo, em uma nova edição revista e ampliada. A Editora da Unicamp, por sua vez (atualmente sob direção da pesquisadora Márcia de Azevedo Abreu, muito atuante na questão do livro e da leitura no Brasil), e que também em 2021 publicou FRANÇA ANTÁRTICA, ensaios interdisciplinares (organizado por Maria Berbara, Renato Menezes e Sheila Hue), vem trazendo à luz obras de grande qualidade editorial e relevância para a história cultural brasileira.
Abordando questões pertinentes ao universo do ensino artístico não apenas do Rio de Janeiro e São Paulo, mas também de Recife e Belém do Pará, entre outras cidades, ENTRE O BELO E O ÚTIL, manuais e práticas do ensino do desenho no Brasil, nos mostra como este ensino se relacionava com questões variadas, que iam deste o problema do racismo à questão do desenvolvimento tecnológico nacional, passando pela presença do desenho na educação dispensada às mulheres e nas diferenças existentes (que se queriam ‘naturais’) no ensino oferecido às crianças das elites imperiais (e mesmo republicanas) e aquele oferecido às então chamadas de “crianças-operárias”. Por esses e outros motivos o livro em questão já surge como uma leitura essencial para as áreas em que transita, abrindo uma senda de análise muito rica para os campos da história da arte e da educação, e também para a história dos livros e da leitura no país.