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Archivo Vermelho: o sangrento Rio dos anos 1920
Archivo Vermelho - Revista Quinzenal (RJ)
Sabe aquele jornal especializado no cotidiano criminal da sua cidade? Aquele que, no jargão popular, “se espremer, sai sangue?” Pois há cerca de 100 anos, no Rio de Janeiro, época em que o jornalismo policial não tinha pudores em mostrar imagens de forte teor violento, uma revista hoje pouco lembrada tentava ser assim: sangrenta até no título.
Dirigida inicialmente por Silva Paranhos, seu primeiro proprietário, a revista Archivo Vermelho foi lançada na capital carioca no final de janeiro de 1918. De início, foi uma revista policial ilustrada, popular e sensacionalista. Dava conta da curiosidade mórbida de seu público leitor ao explorar tanto o cotidiano criminal quanto acidentes e tragédias diversas na capital, nos demais estados brasileiros e no exterior, através de crônicas, notícias curtas, reportagens, fotos – sem deixar de lado recapitulação de crimes históricos, boletins de estatísticas criminais, narrativas de visitas a antros de “miséria moral” no Rio de Janeiro e folhetins policiais. Algumas de suas ilustrações eram feitas por mestres gráficos como Calixto Cordeiro, Julião Machado, Raul Pederneiras, Joaquim Guerreiro, Luiz Peixoto, Amaro Amaral e Fritz.
A revista foi um sucesso absoluto, quando lançada: segundo o editorial da 2ª edição, o público “em dois dias esgotou a edição (inaugural), apezar de ter sido augmentada à última hora, em virtude de pedidos, que recebemos do interior, onde havíamos feito larga propaganda do seu apparecimento”. Com escritório inicial no nº 110 da Avenida Rio Branco, mudando-se depois para o nº 60 da Rua do Lavradio, o periódico bateu, no início de 1919, tiragem quinzenal de 15 mil exemplares.
Com o desenvolvimento da linha editorial de Archivo Vermelho, ao longo de 1918 Silva Paranhos deixou de ser o único nome no experiente da revista: Evaristo de Moraes logo passou a figurar como redator-chefe da revista, com Heitor Telles como redator- secretário. Contando já um ano de publicação, o periódico tinha, além dos ilustradores já citados, o trabalho textual de Jorge Chediac (que em 1918 manteve na revista uma curiosa coluna voltada aos interesses de imigrantes sírios e judeus no Brasil), Bento de Faria, Astolpho de Rezende, Nicanor do Nascimento, Gregório Garcia Seabra Júnior, Pinto Lima, Augusto Goldschmidt, Elyseu César, Edmundo Azurem Furtado, Abel de Assumpção, Xavier Pinheiro, Henrique Magalhães, Fernando Mendes de Almeida Júnior, Mário Lessa, Francisco Guimarães, Rubem Teixeira, Henrique Tamborim, entre outros.
Apesar de seu sucesso, aparentemente, o Archivo Vermelho circulou apenas até sua 81ª edição, de 31 de agosto de 1921 – momento em que, já pertencendo a outro dono, Clodoveu de Oliveira, teve linha editorial totalmente diferente da de seus primeiros momentos: política, de oposição ao governo.
Quando Clodoveu assumiu, em algum momento entre maio de 1919 e novembro de 1920, o Archivo Vermelho passou a direção editorial a cargo de Dias da Cruz e Carvalho Neto. Essa segunda fase começou forte, com tiragens por volta de 20 mil exemplares por edição. Foi então que, aos poucos, a revista passou, aos poucos, a diferir da publicação “sangrenta” de tempos atrás. Mais elitizada, crítica e voltada a questões sociais (com preferência por questões trabalhistas), vinha então com o subtítulo “Revista policial, criminal e forense”, para depois mudar para “Revista de combate”, quando passou a deixar os crimes sensacionais de lado para exercer linha editorial que dava mais destaque a assuntos políticos, em perspectiva opositora não só à candidatura de Arthur Bernardes à presidência da República, mas à política oligárquica da República Velha, em geral. Eram publicados textos de Lopes Trovão, Manoel do Paraizo, Coelho Neto, Albino Sá Filho, Albino Bastos, Guitelsan, Pereira do Rio, entre outros, alguns colaboradores, outros redatores, provavelmente. Havia, em suas páginas, então, inclusive uma seção literária, intitulada “Livros e autores”, que trazia versos, crítica literária, etc. Do ponto de vista da vendagem, um verdadeiro tiro no pé.
(Bruno Brasil)